Quando analisei God of War (2018) no PC em 2022 senti-o como se fosse uma autêntica obra de arte digna de estar exposta num museu. Foi uma história violenta que me conquistou, que me fez ranger os dentes em alguns dos combates mais sangrentos que presenciei num videojogo e que me emocionou com momentos entre pai e filho extremamente dramáticos. Em God of War Ragnarok todos estes elementos prometem ser elevados ao máximo porque Kratos vai confrontar o seu inimigo mais poderoso, o seu destino, e todos os momentos da sua vida vão culminar numa verdadeira tragédia grega.

Mas poderá alguém que não é um veterano espartano desfrutar desta continuação sem conhecer os capítulos anteriores? Bem, desta vez julgo que sim, porque a história de God of War Ragnarok funciona por si mesma, e o jogo também inclui um breve resumo de tudo o que aconteceu antes no menu inicial, nem que seja para refrescarmos a memória. Claro, que se soubermos o que conduziu Kratos desde o épico da Grécia antiga até às superfícies geladas nórdicas tudo tem obviamente um outro sabor, mas como disse, julgo que não é necessário, sei que muitos vão discordar desta visão.

Brok continua o mesmo desbocado de sempre

Tal como em The Last of Us parte II, existem momentos que só adquirem outro significado se conhecermos bem as personagens e as suas relações. Se God of War (2018) retratou a viagem que levou Kratos a aceitar o seu destino, em God of War Ragnarok é Atreus que tem de aceitar o seu papel na ordem do universo. Uma parte fundamental da história desenrola-se à volta da revelação de quem é o “RAPAZ” e do papel que vai ter nos últimos dias da mitologia nórdica.

Novamente assistimos a momentos onde Kratos ainda está a aprender o que é ser pai, mas desta vez ao invés de um menino curioso, tem de lidar com um adolescente, que já se julga ser um adulto capaz para se desenvencilhar dos vários perigos que aguardam a dupla a cada esquina.

Mais uma vez, a tensão entre os dois é captada de uma forma soberba e somos seduzidos para participar em cada uma das suas conversas e descobrir mais sobre o elo entre os dois. Também voltamos a interagir com Mimir, a cabeça mais inteligente do mundo, e os divertidos anões Brock e Sindri que além de voltarem a oferecer os seus serviços para atualizar equipamento também têm um papel mais predominante na narrativa porque oferecem aos jogadores uma visão mais profunda e pessoal do conflito entre os Deuses. No entanto, nesta continuação este grupo também vai conhecer um novo grupo de personagens que incluem Tyr, a versão nórdica de Kratos, e Thor e Odin que deixaram de ser apenas nomes que inspiram medo nas histórias e fábulas de Mimir e passaram a ganhar forma, posso dizer-vos desde já que o contacto inicial entre todos é bastante caricato.

Para além desta história central, que adapta os mitos nórdicos de uma forma bastante coerente, encontramos um lore muito rico que possui bastantes paralelos com a célebre série Attack on Titan. As armas, os locais e as missões secundárias estão muitíssimo mais integradas na narrativa principal, muitas destas não só enriquecem o passado de Kratos e do “RAPAZ” como também Mimir, que revela não estar orgulhoso do seu passado.

SHIIIKAAAA! SHIIKAAA!!!!

God of War Ragnarok à vista desarmada pode dar a entender que é demasiado parecido com o seu antecessor. Contudo, quanto mais mergulhei na história e nos seus brutais combates depressa senti um afastamento gradual do jogo anterior porque expande todos os seus elementos. A grande mudança é que Kratos e Atreus desta vez vão visitar todos os Nove Reinos, ou seja, Midgard; Muspelheim; Helheim; Alfheim; Nilfheim; Jotunheim; Vanaheim; Svartalfheim e Asgard.

Cada um destes Reinos possui uma direção artística e dimensão muito própria, e os que visitámos no primeiro jogo foram transformados por Fimbulvetr, o inverno que precede o Ragnarok na poesia nórdica Edda. Para dar uma ideia do seu escopo, muitos dos ambientes são abertos e podem ser percorridos a pé ou através de trenós puxados por uma matilha de lobos.

Voltaremos a andar à caça dos Corvos do Pai de Todos

Estes mundos partilham o mesmo elemento “sandbox” que vimos do primeiro jogo, e como tal escondem uma enorme densidade de locais, combates e missões secundárias, conhecidas como “Favores”. À medida que as habilidades de Kratos e Atreus aumentam, os jogadores ganham acesso a novas áreas onde participam em confrontos ou resolvem alguns quebra cabeças simples, porém inteligentes, e significativos para o espetro do jogo porque tiram partido do arsenal de Kratos e das várias setas do “RAPAZ”, que quando são combinados contribuem para uma panóplia de mecânicas verticais e evolutivas dentro e fora dos combates.

Desta vez Kratos e Atreus vão enfrentar seres mais diversificados desde centauros, crocodilos a criaturas gigantescas! Em todos os momentos o jogador vai acompanhar as costas de Kratos (em algumas instâncias também Atreus) e como o Deus da Guerra está em posse das armas principais do jogo anterior, o combate é mais fluido e variado muitíssimo mais cedo. Desde o início da aventura, o espartano está munido com o seu gélido Machado Leviatã e as infernais Lâminas do Caos nos seus pulsos, que por si só possuem um leque de combos muito profundo. O esquema de controlo do jogo original acrescenta novas funções para o botão triângulo para gerarem ataques mais longos e dinâmicos.

A sensação que tive é que a produção quis testar o combate mais ofensivo e clássico da trilogia God of War com aspetos modernos tais como o “shield parrying” para lhe atribuir mais estratégia e verticalidade. Mais tarde Kratos vai obter uma terceira arma que também está ligada ao seu passado e contribuí para oferecer um elemento de novidade a esta continuação. Em posse de três armas Kratos também vai enfrentar adversários que só são vulneráveis aos seus efeitos, ou que sofrem mais danos com ataques de fogo ou de gelo, o resultado é um sistema de luta muito sólido que devido aos seus movimentos finais viscerais nunca se sentiu repetitivo.

Talvez o elemento mais controverso de God of War Ragnarok seja a sua narrativa. Enquanto a anterior aventura tentava afastar-se da trilogia inicial, nesta continuação parece que existe uma pressão constante para acalmar os ânimos dos fãs de quando Kratos era um espartano e batalhava na Grécia e por isso em diversos momentos senti um retalho de escrita por tentar ligar as duas realidades de jogos que são muitíssimo diferentes quer em ritmo como em narrativa.

Outro elemento bastante controverso é a sua componente técnica. God of War Ragnarok foi criado como um jogo de PlayStation 4, e embora tenha um aspeto ligeiramente mais polido, algumas texturas mostram a sua idade, tal como vimos anteriormente com o seu antecessor. Não me interpretem mal, os gráficos são fantásticos, tudo está bem trabalhado e as personagens e os ambientes estão repletos de pequenos pormenores. No entanto, se olharmos com mais atenção, torna-se evidente que os polígonos são oriundos da oitava geração e não estão à altura dos padrões atuais, o que não é surpreendente pois estamos a falar de um jogo de 2022 para PlayStation 4. Quanto ao som, é o habitual na série e neste tipo de jogos, com a música a agraciar os nossos ouvidos nos momentos mais marcantes, num misto de heroico e épico narrado por uma panóplia de atores de diversas nacionalidades, porque tal como a PlayStation no PC já nos habitou o jogo tem 10 idiomas totalmente localizados onde constam os talentos do nosso Ricardo Carriço que nos brindou com um Kratos com voz de bagaço e Francisco Fonseca que interpretou um Atreus com uma voz ligeiramente mais adulta. Também deixo um destaque para a interpretação de Virgílio Castelo que nos trouxe um Odin do mais “chill”.

Contudo, mesmo perante este requinte visual e auditivo parte de mim teria desejado que este jogo fosse um lançamento exclusivo PlayStation 5, porque assim as geometrias, e consequentemente o antialiasing, seriam mais melhorados nesta versão para PC. As texturas são de primeira qualidade, super nítidas e claras em todos os momentos. Apesar das capacidades de iluminação limitadas do motor, o Santa Monica Studio fez um excelente trabalho ao combinar luz, sombras e efeitos ambientais tais como nevoeiro e raios em alguns dos seus ambientes para colmatar estas falhas. As personagens estão altamente detalhadas, especialmente nas cutscenes onde podemos ver todos os pormenores nas roupas e nas personagens, mesmo os mais inóspitos, como cabelos brancos na barba de Kratos. Julgo que este jogo iria desfrutar imenso do suporte a ray tracing especialmente nas superfícies geladas e rios que são uma constante neste episódio.

Em alguns momentos as texturas mostram a sua herança

Ao contrário de muitos lançamentos recentes, especialmente os que utilizam o Unreal Engine 5, God of War Ragnarok não sofre de problemas de compilação de shaders ou de engasgos e a Jetpack Interactive está mesmo de parabéns com esta port. O jogo compila shaders no início, e é recomendado que acabe a operação, mesmo que os esteja a decompilar em segundo plano. Como estamos a falar de um jogo para PlayStation 4 os requisitos de hardware do jogo não são muito exigentes nesta altura. O jogo é executado sem problemas e atinge excelentes taxas de fotogramas sem grande esforço graças às tecnologias de supersampling modernas. Mesmo assim quem não desejar recorrer às tecnologias de upscalling apenas precisa de uma NVIDIA GeForce RTX 4060 para atingir 60 FPS numa resolução 1080p mesmo com o preset em ultra.

Algo que gostei de ver nesta port e que não acontece com regularidade foi o uso da VRAM. Mesmo em resoluções 4K o jogo não utilizou mais de 8 GB, uma ótima notícia para que tem placa gráficas NVIDIA Geforce RTX 3000 especialmente das gamas mais baixas porque estão munidas de muito pouca quantidade de VRAM. Por isso, se estão receosos das memory leaks que assombraram The Last of Us Parte I no seu lançamento no PC podem ficar descansados. Contudo, como não há bela sem senão, vão precisar de se registarem ou acederem à vossa conta PlayStation Network para desfrutar desta aventura, algo que a meu ver não é impeditivo, apenas demoram uns minutos e a cada sessão é automaticamente feito o login.

Na nossa build com todas as opções gráficas em Ultra e a recorrer às tecnologias NVIDIA DLSS 3 e NVIDIA Reflex pude desfrutar do jogo a 120 FPS fixos com literalmente nenhumas oscilações no desempenho, algo impensável se formos ter em conta muitos dos lançamentos anteriores. Contudo, quando passamos para os dispositivos portáteis é claro que tiveram de ser feitos sacrifícios e temos de despender algum tempo a tentar encontrar o melhor equilíbrio entre qualidade e desempenho. As melhores definições para God of War Ragnarok que consegui obter na Steam Deck (LCD) foram as seguintes:

  • Limite da taxa de FPS: 40 FPS
  • Tecnologia Supersampling: AMD FSR 3.1
  • Qualidade de Upsampling: Qualidade/Equilibrada
  • Texturas: Médio
  • Modelos: Baixo
  • Filtro anisotrópico: Médio
  • Iluminação: Baixa
  • Sombras: Baixa
  • Reflexos: Baixo
  • Atmosfera: Baixa
  • Oclusão de ambiente: Baixa
  • Tesselação: Baixa

Com estas definições, foi possível obter os 40 fps quase fixos e ter uma experiência portátil semelhante à da PlayStation 4. É claro que foi necessário recorrer à AMD FSR 3.1 para renderizar o jogo abaixo dos 720p para o programa fazer o upscalling para esta resolução, o que neste tamanho de ecrã não é percetível nem foi nocivo para os meus olhos.

A acompanhar a análise de God of War Ragnarok também recebemos uma ROG Ally X para ser analisada, e a aventura de Kratos foi um dos jogos a que recorremos para demonstrar o poder da nova portátil da ASUS e o melhor resultado que obtive foi o seguinte:

  • Limite da taxa de FPS: 120
  • Memória alocada à GPU: 8GB
  • Resolução: 1080p
  • Tecnologia Supersampling: FSR 3.1
  • Qualidade de Upsampling: Equilibrada
  • Texturas: Ultra
  • Modelos: Alto
  • Filtro anisotrópico: Ultra
  • Iluminação: Médio
  • Sombras: Baixo
  • Reflexos: Médio
  • Atmosfera: Baixo
  • Oclusão ambiental: Baixo
  • Tesselação: Médio
  • Perfil energético: 25w

ROG Ally X – Análise

É mais que evidente o poder que a ROG Ally X tem sob a sua rival, não só podemos desfrutar de texturas com um requinte muito mais elevado como numa resolução superior o jogo sempre se manteve acima dos 60FPS e chegou mesmo em certos momentos a atingir a fasquia dos 80FPS com grafismos dignos de uma PlayStation 5 que devido ao pequeno ecrã de 7″” da portátil ganharam mais nitidez e destaque. Acredito que com mais tempo e através do modo turbo seja possível obter 70 a 80 FPS fixos na maioria dos ambientes e situações.

God of War Ragnarok é mais um grande lançamento da PlayStation nesta nova casa. Embora estejamos perante uma continuação com uma narrativa mais fraca, a sua jogabilidade e fluxo sofreram melhorias em praticamente todos os departamentos nesta port que merece sentar-se no panteão da PlayStation no PC porque não só consegue colmatar todas as suas lacunas anteriores como oferecer um guia de como estes lançamentos se devem comportar. Não deixem que um simples registo na PlayStation Network vos impressa de desfrutar uma aventura intensa e emocionante que vos acompanhara para o resto das vossas vidas. 

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