Uma equipa de investigadores da Universidade Kwansei Gakuin no Japão está a revolucionar a interseção entre entretenimento digital e oftalmologia, desenvolvendo um jogo de realidade virtual que demonstrou capacidade de melhorar a visão dos utilizadores. O estudo, que desafia décadas de advertências sobre os efeitos nocivos dos ecrãs na saúde ocular, pode representar um ponto de viragem na forma como encaramos a tecnologia digital.
Durante gerações, pais e educadores alertaram para os perigos de passar demasiado tempo em frente aos ecrãs, associando os videojogos à deterioração da visão. Contudo, os cientistas do departamento de estudos de ciência e tecnologia da Universidade Kwansei Gakuin desenvolveram uma abordagem que inverte completamente esta narrativa, utilizando a própria tecnologia como ferramenta terapêutica.
O projeto, documentado num artigo de investigação publicado em fevereiro de 2025 e intitulado “Testar o efeito de um jogo VR concebido para restaurar a visão de jovens”, foca-se especificamente no tratamento da miopia e fadiga ocular causadas pelo uso excessivo de dispositivos digitais.
Fundamentos Científicos da Abordagem
A investigação baseia-se no princípio de que a fadiga ocular resulta do sobrecarregamento e espasmos dos músculos ciliares, fenómeno comumente conhecido como falsa miopia ou pseudomiopia. Esta condição, frequentemente associada ao uso intensivo de ecrãs, pode teoricamente ser tratada através de exercícios específicos que promovem o alongamento destes músculos oculares.
O jogo desenvolvido pela equipa integra três tipos de exercícios terapêuticos: exercícios de perspetiva, exercícios de fixação visual e exercícios de estereópsia. Esta combinação foi cuidadosamente calibrada para proporcionar o estímulo necessário aos músculos oculares sem causar fadiga adicional.
Durante um período experimental de seis semanas, dez participantes com idades entre os 22 e 36 anos utilizaram o jogo pelo menos uma vez a cada três dias. Todos os voluntários eram estudantes do departamento de ciências da computação, garantindo que o grupo de teste representava utilizadores intensivos de tecnologia digital.
Os critérios de seleção exigiam que os participantes tivessem pelo menos 0,5 de acuidade visual em ambos os olhos antes do início da experiência. Notavelmente, todos os participantes registaram melhorias na visão após o período de teste, um resultado que surpreendeu até os próprios investigadores.
Mecânicas de Jogo com Propósito Terapêutico
O jogo em si assemelha-se deliberadamente aos testes oftalmológicos convencionais, mas numa versão interativa e envolvente. Os jogadores utilizam os comandos para empurrar alvos para longe, direcionando posteriormente um laser na direção de símbolos de testes de visão. O sistema regista acertos, falhas e combos quando múltiplos alvos são atingidos consecutivamente.
A alternância entre alvos próximos e distantes constitui o elemento central da terapia, forçando os músculos ciliares a contrair e relaxar de forma controlada e progressiva. Esta dinâmica simula exercícios oftalmológicos tradicionais, mas numa experiência mais apelativa e consistente.
Limitações e Próximos Passos
Apesar dos resultados encorajadores, os investigadores reconhecem várias limitações no estudo atual. O grupo de teste restringiu-se a jovens adultos numa faixa etária específica, todos com backgrounds similares em ciências da computação. Para validar completamente a eficácia da solução, será necessário expandir os testes para diferentes grupos etários e ambientes diversos.
Os cientistas enfatizam que investigação adicional permanece essencial antes de se poder considerar esta tecnologia como uma solução médica estabelecida. Contudo, os resultados preliminares sugerem um potencial considerável para aplicações terapêuticas mais amplas.
Esta investigação pode representar uma oportunidade significativa para empresas de tecnologia e saúde explorarem novas vertentes de aplicação da realidade virtual. O conceito de “jogos terapêuticos” poderá abrir mercados inteiramente novos, combinando entretenimento com benefícios de saúde mensuráveis.