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    Mais de 70% dos jogos gacha japoneses fecham antes de completarem três anos de serviço

    Investiste tempo naquele gacha? Há 70% de probabilidade de fechar antes dos três anos

    Tribe Nine key visual

    O mercado de jogos gacha no Japão enfrenta uma crise silenciosa. Números recentemente divulgados revelam uma realidade brutal, mais de 70% destes jogos não sobrevivem para além do terceiro aniversário. A investigação, conduzida por Ayashii Rinjin, um especialista em jogos gacha e live-service, compilou dados de quase 2.200 jogos que já encerraram servidores, oferecendo uma perspetiva preocupante sobre a sustentabilidade deste modelo de negócio.

    Os dados mostram que é mais comum um jogo gacha fechar no segundo ano de operação do que em qualquer outro período. Dos 2.172 jogos analisados, 1.541 terminaram antes de entrarem no terceiro ano, representando exatos 70,9% do total. Mais impressionante ainda: 692 jogos (31,9%) não conseguiram sequer completar o primeiro ano de vida.

    A distribuição temporal dos encerramentos é reveladora. Apenas 28 jogos fecharam nos primeiros três meses, mas esse número dispara para 163 entre os três e seis meses, e depois para 501 jogos que terminaram entre os seis e doze meses. O pico surge entre o primeiro e segundo ano, quando 554 títulos encerraram operações. Depois dos três anos, a curva de mortalidade desce drasticamente: 178 jogos fecharam entre o terceiro e quarto ano, 135 entre o quarto e quinto, e apenas 160 títulos sobreviveram mais de sete anos.

    Os números não surpreendem quem acompanha a evolução do mercado japonês de jogos mobile. Enquanto os títulos live-service dominaram a indústria no final da década de 2010, o modelo tem vindo a perder força nos anos 2020. A saturação do mercado, combinada com custos de desenvolvimento cada vez mais elevados e uma escassez crónica de mão de obra qualificada, criou um ambiente que muitos profissionais da indústria descrevem como a “fase do Titanic a afundar-se”.

    Tribe Nine tornou-se num dos exemplos mais recentes e emblemáticos desta tendência. O jogo, desenvolvido pela Akatsuki Games com supervisão criativa de Kazutaka Kodaka (criador de Danganronpa), foi lançado em fevereiro de 2025 e anunciou o encerramento de servidores para 27 de novembro do mesmo ano. Nem sequer completou um ano de vida, apesar de ter ultrapassado os 10 milhões de downloads.

    Criadores japoneses desafiam a indústria ao ressuscitar Tribe Nine após encerramento

    O caso de Tribe Nine ilustra perfeitamente os desafios que os jogos gacha enfrentam. Kazutaka Kodaka, visivelmente frustrado com o desfecho, criou o grupo independente Neoneon Tribe para completar gratuitamente a história do jogo através de publicações doujin não oficiais, com permissão da Akatsuki Games. “Detestava a ideia de que a construção de mundo e as personagens que criei ficassem reduzidas a ‘aquele jogo que durou três meses'”, afirmou o criador.

    Casos ainda mais extremos existem. O jogo TOKYO BEAST, baseado em NFT, encerrou apenas dois meses após o lançamento, devido a um sistema de monetização considerado excessivamente predatório pelos jogadores. Estas situações demonstram que, no atual mercado, nem popularidade inicial nem downloads massivos garantem sobrevivência.

    Os dados de Ayashii Rinjin sugerem que gerir um jogo live-service é essencialmente um jogo de alto risco. Existem mais títulos que fecham nos primeiros seis meses do que aqueles que conseguem sobreviver até ao sexto ou sétimo ano de operação. Poder-se-ia chamar “alto risco, alta recompensa”, mas mesmo para os poucos que conseguem manter-se ativos durante sete anos ou mais, a longevidade pode tornar-se numa maldição em vez de benção.

    Criadores de Tribe Nine trabalham gratuitamente para salvar a história do jogo cancelado

    Dragon Quest of the Stars, da Square Enix, exemplifica este problema. O jogo anunciou o encerramento em agosto de 2025 após uma década de operação, citando complicações técnicas numerosas resultantes do volume e complexidade acumulados. Como observou Eihigh, programador de jogos gacha e blogger técnico japonês, “após 10 anos de operação, o código de um jogo acumula tanta dívida técnica que se torna impossível pagá-la de volta”

    Os jogos live-service exigem atualizações frequentes para se manterem relevantes e manterem os jogadores envolvidos. Contudo, quanto mais o jogo cresce, maior é inevitavelmente o fardo colocado sobre os programadores. O caso de Dragon Quest of the Stars mostra que até mesmo franquias estabelecidas com bases de fãs leais não estão imunes aos problemas estruturais deste modelo de negócio.

    O surgimento de Genshin Impact em 2020 elevou dramaticamente a fasquia para jogos gacha em termos de gameplay e profundidade narrativa, fazendo com que os competidores, especialmente os japoneses, parecessem superficiais em comparação. A HoYoverse demonstrou que um jogo gacha pode oferecer uma experiência próxima de títulos AAA, com um mundo aberto exploratório, sistemas de combate polidos e uma história envolvente.

    TRIBE NINE com 10 milhões de downloads

    Com a competição feroz do mercado e perspetivas baixas de sobrevivência, muitos programadores têm mudado recentemente de uma monetização agressiva para uma abordagem mais orientada para os jogadores. A China parece estar a liderar esta mudança. Estúdios como Hero Game (Duet Night Abyss) e Naked Rain (ANANTA) anunciaram recentemente que iriam remover completamente a monetização gacha dos seus jogos, uma decisão que poderá causar uma mudança maior na indústria se provar ser bem-sucedida.

    A questão que permanece é se os programadores japoneses estarão abertos a fazer mudanças semelhantes. A Square Enix, que publicou mais de uma dúzia de jogos nos quais Yoko Taro trabalhou desde Drakengard em 2003, já anunciou em 2024 uma mudança estratégica para investir em menos lançamentos, num processo que descreveram como uma “mudança de quantidade para qualidade”. No entanto, esta estratégia veio acompanhada de encerramentos de vários títulos estabelecidos.

    Os jogadores de gacha já se habituaram a consultar listas de “jogos que vão fechar em breve” antes de investirem tempo e dinheiro num novo título. Esta desconfiança generalizada cria um ciclo vicioso, jogadores hesitam em comprometer-se com novos jogos por medo de encerramento precoce, o que por sua vez reduz as receitas e aumenta a probabilidade de o jogo realmente fechar.

    O panorama atual sugere que apenas os jogos gacha que conseguirem diferenciar-se genuinamente, seja através de gameplay inovador, histórias cativantes, ou modelos de monetização mais justos, terão hipótese de sobreviver no mercado saturado. Títulos como Fate/Grand Order, que opera de forma lucrativa há quase uma década, são agora a exceção e não a regra.

    A estatística dos 70% serve como um aviso para jogadores, investidores e programadores. Para os jogadores, representa um lembrete de que qualquer tempo ou dinheiro investido num jogo gacha carrega um risco significativo de perda quando o servidor fechar. Para os programadores, os números indicam que o velho modelo de “lançar e ver o que acontece” já não é sustentável num mercado onde três em cada quatro jogos falham antes do terceiro aniversário.

    SourceAutomaton
    Helder Archer
    Helder Archer
    Fundou o OtakuPT em 2007 e desde então já escreveu mais de 60 mil artigos sobre anime, mangá e videojogos.

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