O lendário realizador Yoshiyuki Tomino, criador da icónica série Mobile Suit Gundam, revelou numa entrevista recente à NHK os seus planos para uma nova obra que reflicta os conflitos armados actuais, incluindo a guerra na Ucrânia e o conflito no Médio Oriente.
A entrevista, transmitida no programa News Watch 9 da NHK a 17 de Junho, foi realizada no âmbito das comemorações do 80.º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial. Durante cerca de seis minutos, Tomino partilhou as suas memórias de guerra, o processo criativo por trás de Gundam e as suas preocupações sobre o estado actual da franquia.
Memórias de Guerra Moldaram Gundam
Tomino, agora com mais de 80 anos, recordou as suas vivências durante a Segunda Guerra Mundial, quando tinha apenas três anos. “Lembro-me de fugir de um bombardeamento aéreo com dois ou três livros de imagens nas mãos”, contou o realizador. A sua família vivia na casa mais distante do abrigo antiaéreo do bairro, o que os obrigava a ocupar os lugares menos seguros, junto à entrada, protegidos apenas por esteiras de palha que tremulavam ao vento.
Foi só mais tarde que Tomino compreendeu porque é que a sua cidade natal era um alvo militar. “Fiquei a olhar para uma montanha de baterias. Percebi que eram produtos militares. É simples dizer guerra, mas a indústria está ligada a ela. Por isso, são necessários suprimentos. Sem esses suprimentos, a guerra é impossível”, explicou.
Estas reflexões tornaram-se fundamentais na criação de Gundam. “O primeiro inimigo que o Gundam encontra são três mobile suits Zaku”, disse Tomino. “É preciso haver uma indústria militar e um sistema industrial para os produzir em massa. Acho que não tive outra escolha senão retratar uma guerra entre nações”.
Críticas ao Rumo Actual da Franquia
Apesar do enorme sucesso comercial de Gundam, Tomino mostrou-se preocupado com a direcção que a franquia tem tomado. “Quando se diz ‘gosto de Gundam’, as palavras que surgem são, obviamente, ‘as batalhas de mobile suits são fixes’. Esse não é o ponto. De todo”, lamentou o criador.
O realizador também comentou sobre os seus colegas mais novos que trabalham actualmente na franquia: “Os meus colegas mais jovens estão a fazer séries Gundam hoje em dia, e não sinto que tenham experiência com a guerra”. Tomino admitiu não ter a certeza se conseguiria transmitir as experiências de guerra a uma geração que nunca as viveu em primeira mão.
Novo Projecto Inspirado em Conflitos Contemporâneos
Quando questionado sobre futuros projectos, Tomino revelou ter algo em mente. Embora não tenha partilhado muitos detalhes, o realizador foi claro sobre a sua inspiração: “A guerra na Ucrânia já dura há três anos e o conflito em Israel há 30 a 40 anos. Não acho que compreendamos muito bem estas coisas. Por isso, o tema é saber se a humanidade consegue parar este comportamento social”.
Esta declaração marca um regresso às raízes conceptuais de Gundam, que sempre utilizou robots gigantes como metáfora para explorar os horrores e as consequências da guerra, em vez de glorificar o combate.
A entrevista completa esteve disponível na plataforma NHK+ no Japão até 24 de Junho, demonstrando o interesse contínuo do público japonês nas reflexões do veterano realizador sobre guerra, paz e o papel da animação na sociedade contemporânea.