
Kimi Onoda, a atual ministra de Estado para a Segurança Económica do Japão, tornou-se viral nas últimas semanas depois de antigos tweets ressurgirem nas redes sociais. As publicações, que acumularam mais de 1,7 milhões de visualizações, revelam uma funcionária governamental com uma identidade invulgar, uma otaku assumida que declara abertamente o seu desinteresse por relacionamentos no mundo real e a sua devoção exclusiva a personagens de anime e mangá.
A política de 42 anos, que nasceu em Chicago e integra atualmente o gabinete da primeira-ministra Sanae Takaichi como a ministra mais jovem, não esconde a sua ligação à cultura otaku. Em 2022, declarou no Twitter: “No mundo 3D, estou casada com a nação, e em privado, sou dedicada ao mundo 2D!”.
Antes de entrar na política, Onoda trabalhou na indústria criativa japonesa, nomeadamente na empresa Asgard (também conhecida como honeybee), onde esteve envolvida na produção de otome games e drama CDs. Esta experiência profissional foi revelada publicamente pelo colega parlamentar Ken Akamatsu, criador dos mangás Love Hina e Negima!, que em 2022 se tornou o primeiro autor de mangá eleito para a Câmara dos Conselheiros do Japão.
Quando Akamatsu a descreveu como uma “otaku genuína” com experiência real na indústria, Onoda respondeu com a modéstia típica da cultura otaku: “De maneira nenhuma, eu sou apenas uma novata que conhece apenas um bocadinho!”.
A postura de Onoda sobre conteúdo 2D vai muito além das preferências pessoais. Ao contrário de muitos políticos que responsabilizam anime e mangá por problemas sociais, ela defende uma separação clara entre fantasia artística e responsabilidade legal. Num tweet que ganhou particular atenção, argumentou que forçar alguém que prefere personagens 2D a ter relacionamentos no mundo real seria equivalente a forçar uma pessoa homossexual a casar com alguém do sexo oposto.
Quanto à proteção de crianças, a sua posição é inequívoca. Em resposta a notícias que ligavam casos criminais ao consumo de mangá, escreveu: “Regulem o mundo 3D para proteger crianças reais. Parem de reduzir o conteúdo 2D a crimes no mundo real”.
Esta defesa da liberdade de expressão não é nova no currículo político de Onoda. Ela é membro da Liga Parlamentar para o Anime, Mangá e Jogos do Japão, uma organização dentro do Partido Liberal Democrata dedicada a proteger a indústria criativa japonesa. Como ministra responsável pela estratégia Cool Japan, Onoda está numa posição privilegiada para influenciar políticas que afetam a exportação cultural do país.
Em declarações aos media japoneses, Onoda explicou a sua visão: “Quando se trata da política de conteúdo do Cool Japan, as pessoas frequentemente focam-se no volume de exportação e no impacto económico, mas acredito que se estende para além dessas coisas. Hoje, anime, mangá e jogos são as principais razões pelas quais as pessoas aprendem japonês. Servem como ferramentas poderosas que podem levar as pessoas a compreender a cultura e as formas de pensar japonesas”.
Numa conferência de imprensa, quando questionada sobre os seus anime e mangá favoritos, Onoda recusou responder, explicando diplomaticamente que, sendo uma figura controversa, não queria que o seu apoio público tornasse os fãs dessas obras desconfortáveis. Em 2023, durante uma aparição no canal de YouTube de Ken Akamatsu, mencionou títulos influentes como Himiko de Tsunezo Murotani, Uta Koi de Kei Sugita e Hetalia: Axis Powers de Hidekazu Himaruya.
A ministra também revelou que participou na Comic Market (Comiket), o maior evento mundial de obras doujinshi (publicações independentes), e que produziu fanzines para a série Phantom Guardian, bem como CDs de drama sob o seu próprio nome.
Apesar da sua defesa da liberdade criativa, Onoda mantém posições conservadoras em outras áreas. Como ministra responsável pela coexistência ordenada e harmoniosa com estrangeiros, prometeu “tomar medidas firmes contra estrangeiros que não seguem as regras”, uma posição que tem gerado debate no Japão.
Ministra japonesa promete acabar com estrangeiros que cometam crimes no país
A presença de Onoda no governo de Takaichi simboliza uma mudança geracional na política japonesa. Num país onde a separação entre cultura pop e política séria sempre foi rígida, ela representa uma nova geração de políticos que não esconde as suas paixões nem tenta conformar-se com expectativas tradicionais de decoro ministerial.
Quando assumiu o cargo de ministra em outubro de 2025, Onoda apareceu no Palácio Imperial com um vestido prateado que imediatamente gerou especulação nas redes sociais. A sua resposta no twitter foi característica: “É meu. Já o usei antes. Porque não alugar um?” O tom descontraído violou deliberadamente as expectativas de decoro ministerial, mas ressoou com uma audiência digital que valoriza autenticidade sobre formalidade.
Para a comunidade otaku internacional, Onoda tornou-se um símbolo de legitimação. Numa indústria frequentemente sujeita a pânicos morais e tentativas de censura, ter uma ministra que compreende a distinção entre ficção e realidade, e que está disposta a defender essa posição publicamente, representa um desenvolvimento significativo.









