O IV ciclo Mestres Japoneses Desconhecidos vai começar dia 30 de Janeiro. Os filmes terão estreia em Lisboa, no Cinema City Alvalade, e Coimbra, Cinemas NOS Alma, sendo exibidos durante três fins de semana em salas da NOS de Lisboa, Porto, Viseu, Faro e Almada.
No dia 31 de Janeiro, após a sessão da noite com o filme Imagem de uma Mãe no Cinema City Alvalade, o programador Miguel Patrício estará à conversa com o programador francês Clément Rauger, um dos maiores programadores de cinema japonês a nível mundial, que se deslocará a Lisboa com este propósito.
A cada novo ciclo Mestres Japoneses Desconhecidos somos premiados com filmes que não estrearam nem nunca foram exibidos em Portugal e que o grande publico teria dificuldade em conseguir ver. Têm aqui uma grande oportunidade!
Neste IV ciclo Mestres Japoneses Desconhecidos vão encontrar:
Imagem de uma Mãe / Image of a Mother (母のおもかげ, 1959)
Título Original: Haha no omokage, Realização: Hiroshi Shimizu, Argumento: Benpei Toyama, Direcção de Fotografia: Hiroshi Ishida, Música: Yûji Koseki, Direcção de Arte: Mikio Naka, Produção: Kazuyoshi Takeda, Elenco: Chikage Awashima, Jun Negami, Chieko Murata, Bontarô Miake, Satoko Minami, Tamae Kiyokawa, Nobuo Minamitaka, Tatsuo Hanabe, Yosuke Irie, Tsutomu Nakata, Kan Takami, Keni Oyama, Estúdio: Daiei / Kadokawa, Preto e Branco, 89 minutos.
Sinopse: O jovem Michio, filho de um condutor de cacilheiro recentemente viúvo, apega-se à memória da sua mãe, valorizando um pombo-correio que ela lhe ofereceu pouco antes de falecer. O seu pai bem-intencionado, Sadao, pressionado a casar-se novamente, encontra uma parceira apropriada na gentil Sonoko, que também tem uma filha pequena. Com a entrada da nova madrasta na sua vida, o desconforto de Michio intensifica-se devido às pressões ao seu redor para esquecer a falecida mãe e chamar à sua nova madrasta de “mãe”.
O último filme da carreira de mais de trinta anos de Hiroshi Shimizu retoma o tema das relações entre pais e filhos, uma preocupação recorrente do cineasta. Apesar do seu tom emotivo, esta derradeira obra é habilmente conduzida nas mãos do realizador japonês, já que representa a turbulência interior de um jovem menino que culmina num desenlace esmagador. Obra rara de Shimizu em formato scope, repleta dos seus característicos movimentos de câmara fluidos e da sua humanidade indelével, Imagem de uma Mãe constitui uma despedida adequada de uma carreira sempre dedicada às vidas e lutas dos incompreendidos e indefesos.
Já numa edição anterior do ciclo Mestres Japoneses Desconhecidos em 2023 foi apresentado um outro filme de Hiroshi Shimizu, O Som do Nevoeiro.
Roída até ao Osso / Gnawed to the Bone (骨までしゃぶる, 1966)
Título Original: Hone-made shaburu, Realização: Tai Katô, Argumento: Kiyoshi Saeki, Direcção de Fotografia: Motoya Washio, Música: Ichirô Saitô, Direcção de Arte: Takatoshi Suzuki, Produção: Shigeru Okada, Elenco: Hiroko Sakuramachi, Naoko Kubo, Junko Miyazono, Yukiko Kuwahara, Yôko Mihara, Isao Natsuyagi, Gannosuke Ashiya, Kogan Ashiya, Sanpei Taira, Tatsuo Endô, Minoru Hodaka, Kin Sugai, Masao Mishima, Estúdio: Toei, Preto e Branco, 88 minutos.
Sinopse: 1900. Kinu, com apenas dezoito anos, é vendida a um bordel para ajudar financeiramente a sua família. Os donos promovem-na como virgem para atrair clientes, tornando-a bastante popular. Rapidamente, ela percebe o esquema traiçoeiro do casal, que explora a fraqueza das mulheres, inventando dívidas exorbitantes para restringir a liberdade. Kinu e as outras prostitutas desejam fugir do bordel, mas a vigilância é muito rigorosa e os castigos ainda mais severos. Um dia, inesperadamente, um artesão chamado Jingorô torna-se cliente de Kinu. Após algumas visitas, Jingorô expressa o desejo de se casar com ela e saldar-lhe a dívida. Emocionada com as suas palavras, ela sabe que ele não tem condições para fazê-lo…
Obra situada num período muito fértil da carreira de Tai Katô, Roída até ao Osso vê o cineasta abandonar o filme de sabre e yakuza, géneros habituais seus no estúdio Toei, em virtude do onna eiga (filme sobre as atribulações de ser mulher). Este conto sobre a procura da felicidade em condições adversas tem como pano de fundo a actividade de um bordel japonês no princípio do século XX e recria e crítica o ambiente machista que subjaz ao comércio sexual daquele tempo, sempre comparando o à escravidão. Katô usa as suas marcas estilísticas distintivas para semear o caos, ora encenando pequenas revoltas dentro das quatro paredes do prostíbulo, ora encaixando as suas personagens femininas em enquadramentos arriscados e apertados para, de alguma forma, sublinhar a atmosfera opressiva em que vivem.
Yôko, a Delinquente / Pretty Devil Yoko (非行少女ヨーコ, 1966)
Título Original: Hikô shôjo Yôko, Realização: Yasuo Furuhata, Argumento: Fumio Kônami, Ryûnosuke Ôno, Direcção de Fotografia: Hanjirô Nakazawa, Música: Masao Yagi, Direcção de Arte: Shûichirô Nakamura, Produção: Tôru Yoshida, Elenco: Mako Midori, Hayato Tani, Ichirô Araki, Renji Ishibashi, Eiji Okada, Reiko Ôhara, Nenji Kobayashi, Chieko Nakakita, Shûji Sano, Rokkô Toura, Mari Yoshimura, Shirô Ôsaka, Yuki Jôno, Shûji Terayama, Estúdio: Toei, Preto e Branco, 85 minutos.
Sinopse: Yôko, uma jovem que fugiu do campo para Tôkyô, vê-se envolvida com Takeshi, seu amigo de infância, e foge dos seus desejos lascivos. Ela vagueia pelas ruas movimentadas de Shinjuku e é frequentemente abordada por homens com más intenções. Um dia, Yôko é convidada por Harumi, uma prostituta, a entrar num bar frequentado por jovens delinquentes. Eles entregam-se ao ritmo do jazz, tomam drogas e desperdiçam a sua juventude, dançando e fazendo tropelias. Yôko, após uma bad trip, perde a consciência. Na manhã seguinte, ela acorda no quarto de Jirô, um dos frequentadores do bar de jazz. Apesar de apaixonado por Yôko, o tímido Jirô não consegue fazer nada por ela, o que a deixa furiosa. O único sonho que a sustenta é visitar Saint-Tropez, uma praia soalheira que ela viu numa ida ao cinema.
A estreia na realização de Yasuo Furuhata pode ser vista como uma resposta aos excessos e descontrolo da geração hippie, que na última metade dos anos 60 atingia o seu auge de popularidade tanto no Japão como nos Estados Unidos da América. Na verdade, Yôko, a Delinquente retrata uma tribo urbana japonesa conhecida por futen zoku (tribo dos vagabundos) que emergiu no bairro de Shinjuku em Tóquio e se caracterizava, como o nome indica, pela errância, ausência de pouso fixo, e pelo consumo de substâncias ilícitas pelos seus membros. Se bem que Furuhata, olhando com uma certa distância crítica para este fenómeno moderno, se coíbe de alinhar com cineastas mais revolucionários como Nagisa Ôshima ou Kôji Wakamatsu (que ostensivamente filmaram essa mesma juventude a uma luz muito mais positiva), ele não deixa de injectar criatividade na mise en scène, bem como demonstrar imensa empatia pelos seus personagens à beira do abismo. O filme é uma cápsula do tempo deste Japão psicadélico e à deriva, e mesmo figuras marcantes de vanguarda daquela era, como o poeta, dramaturgo (e mais tarde cineasta) Shûji Terayama fazem pequenas aparições.
Maravilhosos