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    Filmes japoneses adiados na China devido a crise diplomática com o Japão

    500 mil voos cancelados: como um comentário sobre Taiwan está a destruir o turismo entre China e Japão

    visual 2 - 32º filme anime de Crayon Shin-chan

    A China adiou a estreia de dois aguardados filmes japoneses que estavam marcados para dezembro, numa escalada de tensões entre Pequim e Tóquio provocada por declarações da primeira-ministra japonesa Sanae Takaichi sobre Taiwan. Os filmes Eiga Crayon Shin-chan Chō Karei! Shakunetsu no Kasukabe Dancers e a adaptação live-action de Cells at Work viram as suas datas de lançamento canceladas, sem previsão de nova estreia.

    O filme de Crayon Shin-chan, 32º do anime, estava agendado para 6 de dezembro, enquanto Cells at Work tinha estreia marcada para 22 de dezembro. A decisão foi reportada por meios de comunicação chineses, refletindo o impacto das crescentes tensões diplomáticas no intercâmbio cultural entre os dois países.

    O que desencadeou a crise

    A origem do conflito remonta a 7 de novembro, quando Sanae Takaichi declarou publicamente que um ataque chinês a Taiwan poderia constituir “uma situação que ameaça a sobrevivência do Japão”, justificando assim uma possível ação militar japonesa. As palavras da primeira-ministra fizeram referência à legislação de 2015 da administração de Shinzo Abe, que estabeleceu as condições para o Japão exercer o direito de autodefesa coletiva.

    A reação de Pequim foi imediata e dura. O Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês condenou veementemente os comentários, exigindo a retratação das declarações, que segundo as autoridades chinesas violam o princípio de “uma só China” e representam uma interferência grave nos assuntos internos do país. A porta-voz Mao Ning afirmou que as declarações de Takaichi “prejudicaram seriamente a fundação política das relações China-Japão”.

    Medidas de retaliação económica

    Para além do adiamento dos filmes, a China implementou uma série de medidas que afetam diretamente o turismo e o intercâmbio entre os dois países. O governo chinês emitiu um alerta formal desaconselhando os seus cidadãos a viajar para o Japão, citando a deterioração do ambiente de segurança.

    As principais companhias aéreas chinesas, incluindo Air China, China Southern, China Eastern, Hainan Airlines, Sichuan Airlines, Xiamen Airlines e Spring Airlines, anunciaram no sábado que oferecerão reembolsos gratuitos ou alterações sem custos para voos com destino ao Japão reservados até 31 de dezembro. Segundo estimativas, cerca de 500 mil voos terão sido cancelados entre 15 e 17 de novembro.

    O impacto é significativo para o Japão, já que viajantes da China e Hong Kong representam o maior número de turistas estrangeiros no país. Dados oficiais mostram que 7,48 milhões de cidadãos chineses visitaram o Japão entre janeiro e setembro deste ano, tornando a China o principal mercado turístico do arquipélago.

    Poster IMAX live-action Cells at Work!

    O caso especial de Demon Slayer

    A situação dos filmes japoneses já em exibição na China permanece incerta. Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba – The Movie: Infinity Castle – Part 1: Akaza Returns, primeiro filme da trilogia Infinity Castle, estreou na China na sexta-feira e arrecadou 373 milhões de RMB (cerca de 52,53 milhões de dólares) nos primeiros três dias.

    As sessões IMAX do filme renderam o equivalente a 12,3 milhões de dólares, tornando-se a maior estreia IMAX de sempre para um filme japonês na China. O desempenho forte do anime surge num contexto particularmente delicado, com alguns analistas a questionarem se o filme conseguirá manter o momentum à medida que a tensão diplomática se intensifica.

    Contexto histórico e político

    Apesar de ter reconhecido a República Popular da China como único governo legítimo em 1972, o Japão mantém relações não oficiais com Taiwan. O falecido primeiro-ministro Shinzo Abe, mentor político de Takaichi, já tinha defendido publicamente que qualquer invasão da ilha justificaria uma resposta militar japonesa no âmbito do acordo de segurança com os Estados Unidos.

    As declarações de Takaichi marcam, no entanto, a primeira vez desde a derrota do Japão em 1945 que um líder japonês em funções vincula oficialmente a questão de Taiwan ao exercício do direito de autodefesa coletiva. Professores universitários japoneses, como Yoshihide Soeya da Universidade Keio, criticaram a postura da primeira-ministra, considerando-a “imprudente” e potencialmente prejudicial aos ganhos diplomáticos recentes.

    A tensão atingiu um novo patamar quando o cônsul-geral da China em Osaka, Xue Jian, publicou na rede social X uma mensagem em que defendia que “a cabeça suja que se intromete imprudentemente deve ser cortada sem um momento de hesitação”, numa aparente referência a Takaichi. A publicação foi posteriormente eliminada após protesto do governo japonês, que considerou o comentário “extremamente inadequado”.

    O Japão enviou o diplomata Masaaki Kanai, alto funcionário do Ministério dos Negócios Estrangeiros para a região da Ásia-Pacífico, à China para tentar acalmar a situação. Kanai reuniu-se com Liu Jinsong, diretor-geral do Departamento de Assuntos Asiáticos do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, mas as autoridades chinesas reiteraram os seus “fortes protestos” relativos às declarações de Takaichi.

    Ambos os líderes estarão presentes na cimeira do G20 em Joanesburgo, que tem início em 22 de novembro, mas a porta-voz chinesa Mao Ning já negou que esteja previsto um encontro bilateral para discutir as diferenças diplomáticas.

    Impacto cultural

    O adiamento dos filmes japoneses representa mais um capítulo na complexa relação cultural entre China e Japão. A franquia Crayon Shin-chan, em particular, tem uma popularidade significativa na China, e o 32º filme da série marca a primeira vez que a animação se passa na Índia, com foco em dança e entretenimento.

    Quanto ao filme live-action de Cells at Work, baseado no popular mangá e anime sobre células antropomorfizadas no corpo humano, a produção tinha estreado no Japão em dezembro de 2024 com sucesso comercial, arrecadando 845 milhões de ienes no fim de semana de abertura.

    Por enquanto, os fãs chineses terão de esperar por um desfecho das tensões diplomáticas para poderem assistir a estas produções nos cinemas, num claro exemplo de como disputas políticas podem afetar o intercâmbio cultural entre nações.

    Helder Archer
    Helder Archer
    Fundou o OtakuPT em 2007 e desde então já escreveu mais de 60 mil artigos sobre anime, mangá e videojogos.

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