
Os últimos meses têm sido difíceis para quem acompanha a Xbox, mas agora começa a perceber-se porquê. A Microsoft terá imposto à sua divisão de videojogos um objetivo de margem de lucro de 30%, muito acima do que é considerado realista na indústria. A revelação ajuda a explicar os despedimentos em massa, os jogos cancelados e o aumento vertiginoso dos preços que têm marcado 2025.
Segundo fontes citadas pela Bloomberg, a meta dos 30% foi implementada em 2023 por Amy Hood, diretora financeira da Microsoft. Internamente, a empresa chama a isto “margens de responsabilização”, um termo que soa bem em reuniões mas que na prática significa pressão brutal sobre equipas de desenvolvimento.
O problema é simples, a média da indústria de videojogos situa-se entre 17% e 22%, segundo dados da S&P Global Market Intelligence. Nos últimos seis anos, a própria Xbox oscilou entre 10% e 20%. Nos primeiros nove meses de 2022, ficou-se pelos 12%. Pedir 30% a uma divisão que historicamente opera muito abaixo disso é, na melhor das hipóteses, otimista.
Neil Barbour, analista da S&P Global, foi direto ao assunto, as margens de 30% são “normalmente reservadas para uma editora que está realmente a arrasar”. E a Xbox claramente não está nessa categoria, pelo menos não consistentemente.
O Game Pass como bode expiatório
Desde 2018 que a Microsoft coloca todos os seus jogos de primeira linha no Game Pass desde o primeiro dia. Esta estratégia, que na altura parecia revolucionária e atrativa para consumidores, tornou-se num dos principais obstáculos para atingir as metas de lucro absurdas impostas pela empresa.
As fontes da Bloomberg revelam que o modelo do Game Pass tem contribuído para que os jogos falhem sistematicamente em atingir a margem dos 30%. A Microsoft criou um sistema de créditos chamado “member-weighted value” que considera fatores como o número total de horas que subscritores passam num jogo, mas esta fórmula tende a beneficiar sobretudo títulos multiplayer. Jogos de história única e experiências mais curtas ficam prejudicados.
Para o futuro, as mesmas fontes indicam que a Microsoft vai dar prioridade a jogos com custos de desenvolvimento baixos e modelos de receita comprovados, em detrimento de projetos mais arriscados ou inovadores. Isto explica muito sobre o cancelamento de vários títulos anunciados e o redirecionamento de recursos para franquias já estabelecidas.

A divisão de gaming foi pressionada a alcançar 30% de lucro quando a média da indústria mal chega aos 22%, levando a despedimentos massivos e cancelamento de jogos
Em maio deste ano, a Microsoft despediu 3% da sua força de trabalho global. A divisão de gaming foi uma das mais afetadas. Não foi coincidência. Quando se estabelecem objetivos impossíveis de atingir, alguém tem de pagar a fatura, e geralmente não são os executivos que definiram as metas.
A empresa justifica dizendo que vê cada jogo e projeto de forma diferente no que toca ao que constitui sucesso, e que às vezes tem de tomar decisões difíceis, incluindo terminar o desenvolvimento de jogos, para concentrar recursos em projetos “mais alinhados com a nossa direção e prioridades”. É uma forma corporativa de dizer, se não dá lucro rápido, encerra-se.
As aquisições multimilionárias não ajudaram tanto quanto a Microsoft esperava. A compra da Activision Blizzard por 68,7 mil milhões de dólares em 2023 trouxe franquias como Call of Duty e Diablo. Em 2020, a aquisição da ZeniMax deu acesso a The Elder Scrolls e Fallout. Mas mesmo com estes ativos valiosos, a pressão para atingir margens irrealistas continua a criar problemas.
A estratégia recente da Microsoft tem sido clara, aumentar preços. No mês passado, as consolas Xbox ficaram mais caras nos Estados Unidos pela segunda vez em 2025. No início de outubro, a subscrição do Game Pass Ultimate sofreu um aumento de 50%. Esta semana, os kits de desenvolvimento para criadores de jogos subiram 500 dólares.
A empresa também tem levado jogos exclusivos para outras plataformas, incluindo a PlayStation 5 da Sony, sua principal rival. Títulos como Forza Horizon 5 e Indiana Jones and the Great Circle já fizeram a transição nos últimos 12 meses.
Um porta-voz da Microsoft disse à Bloomberg que a empresa vê cada jogo de forma diferente em termos de métricas de sucesso, mas esta flexibilidade aparente contrasta com a rigidez das metas de 30% impostas à divisão como um todo.
Xbox está a repetir os erros que levaram a SEGA a abandonar as consolas
A situação toda levanta questões sobre sustentabilidade. Se uma empresa do tamanho da Microsoft, com franquias do calibre de Halo, Gears of War, Forza, Call of Duty e Elder Scrolls, não consegue atingir margens de 30% sem despedir pessoas e cancelar projetos, será essa meta sequer razoável? Ou estamos perante um caso de gestão financeira desconectada da realidade da indústria dos videojogos?
O que está claro é que os próximos meses serão determinantes para perceber se a Xbox consegue equilibrar as exigências financeiras da Microsoft com a necessidade de criar jogos que as pessoas realmente querem jogar.









