
Keiji Inafune, uma das figuras mais influentes da Capcom nas últimas décadas, deixou um aviso claro aos programadores durante a Console Game Developer Conference na Coreia do Sul, agarrar-se apenas aos sucessos do passado não é estratégia sustentável.
O designer responsável pela conceção visual de Mega Man e produtor de franquias como Onimusha, Dead Rising e Lost Planet partilhou a sua visão sobre como a indústria tem adotado uma postura cada vez mais defensiva, privilegiando lançamentos seguros em vez de arriscar em ideias novas.
Segundo Inafune, embora não haja nada de errado em continuar séries estabelecidas ou criar jogos dentro de géneros populares, limitar-se apenas a isso é insuficiente. A questão não é evitar sequelas, mas sim garantir que não representam a totalidade da produção de um estúdio.
Durante os 38 anos de carreira na indústria, Inafune testemunhou transformações tecnológicas radicais. Apesar disso, nota que o desejo de criar um êxito comercial sempre foi uma constante. O problema surge quando esse êxito se torna uma prisão criativa.
“Ter um sucesso é óptimo, mas também pode colocar uma carga tremenda sobre ti”, explicou. O veterano designer de videojogos observa que muitas pessoas que alcançam sucesso uma vez raramente conseguem repeti-lo, precisamente porque ficam presas aos métodos que funcionaram anteriormente.
A experiência pessoal de Inafune ilustra bem o ponto que defende. Apesar de ter começado focado em Mega Man, envolveu-se em projetos completamente diferentes ao longo da carreira. Durante os anos 80 e 90 na Capcom, trabalhou em títulos como Breath of Fire, DuckTales e Gold Medal Challenge ’92, antes mesmo de expandir Mega Man para novos géneros.
Jogos como Mega Man: Battle & Chase, Mega Man Battle Network e The Misadventures of Tron Bonne demonstraram que era possível reinventar uma franquia estabelecida. Mais tarde, afastou-se completamente da série azul para criar universos totalmente distintos como Lost Planet e Dead Rising.
“Quantas vezes é que as sequelas dessas pessoas também tiveram sucesso?”, questionou Inafune, referindo-se a criadores que fazem um único hit. Sem querer parecer presunçoso, admite orgulhar-se de ter várias obras representativas em géneros diversos, precisamente porque nunca se acomodou.
O contexto histórico ajuda a perceber a mudança que critica. Quando começou na Capcom nos anos 80 e 90, fazer algo original era quase um dado adquirido. Não existiam ainda as categorias estabelecidas de jogos tipo Monster Hunter, tipo Resident Evil ou tipo Mega Man. Os programadores criavam sem moldes pré-definidos.
Atualmente, Inafune acredita que a indústria atingiu um ponto onde todos adotam uma postura defensiva, optando por projetos com maior probabilidade de retorno financeiro. Embora reconheça que lançar o décimo primeiro jogo de uma série pode fazer sentido do ponto de vista empresarial, questiona se essa será a decisão correta daqui a cinco ou dez anos.
A mensagem dirigida aos programadores coreanos presentes na conferência foi particularmente direta. Se daqui a uma década o mercado sul-coreano continuar dominado exclusivamente por jogos mobile seguros e títulos online estabelecidos, será que isso representa um caminho saudável para a indústria?
A Coreia do Sul tem uma indústria de jogos robusta mas fortemente concentrada em certos nichos, especialmente MMORPGs e títulos para dispositivos móveis. Inafune sugere que os estúdios coreanos deveriam começar a investir mais no desenvolvimento para consolas, diversificando a sua produção.
O veterano programador não está sozinho nestas preocupações. Vários criadores da velha guarda têm manifestado inquietação semelhante relativamente à homogeneização da indústria. A questão do risco criativo versus segurança financeira continua a dividir estúdios, especialmente num momento em que os orçamentos de desenvolvimento atingiram valores astronómicos.
Para Inafune, a confiança necessária para criar vem de uma base sólida, e o sucesso passado pode fornecer essa base. Contudo, transformar essa base numa jaula é desperdiçar o potencial criativo que a indústria ainda tem para oferecer.








