A morte de Jean Pormanove durante uma transmissão ao vivo desencadeou uma tempestade legal internacional que pode redefinir as responsabilidades das plataformas de streaming. A França iniciou um processo judicial contra a plataforma australiana Kick, ameaçando os seus executivos com penas de prisão até 10 anos e multas que podem chegar ao milhão de euros.
O caso remonta a 18 de agosto, quando Raphaël Graven, conhecido online como Jean Pormanove, morreu aos 46 anos durante uma transmissão na plataforma. A sua morte ocorreu após o que foi descrito como “dez dias de tortura” transmitidos ao vivo, durante os quais o streamer terá sofrido agressões, privação de sono e ingestão forçada de substâncias tóxicas junto com outros streamers conhecidos como Naruto e Safine.
Clara Chappaz, ministra francesa para os assuntos digitais, não poupou críticas à plataforma: “Jean Pormanove foi humilhado e maltratado durante meses ao vivo no Kick”. A ministra, que assumiu este caso como “a sua luta” e prometeu “não desistir”, acusa a plataforma de violar uma lei de 2004 que regula conteúdos online.
“O Kick não fez tudo o que era possível para parar a transmissão de conteúdo perigoso”, declarou Chappaz, exigindo consequências legais sérias para a plataforma. A procuradora de Paris, Laure Beccuau, confirmou que as autoridades abriram uma investigação para determinar se o Kick transmitiu conscientemente “vídeos de ataques deliberados à integridade pessoal”.
O timing do caso não podia ser pior para o Kick. Os procuradores estão também a examinar se a plataforma cumpre o novo Ato de Serviços Digitais da União Europeia sobre moderação de conteúdo. As violações podem resultar em penalidades até 10 anos de prisão e multas de 1 milhão de euros, embora ainda não seja claro se França solicitará a extradição dos executivos australianos.
Compilações perturbadoras mostrando o streamer a ser abusado e maltratado tornaram-se virais, gerando indignação internacional. O foco centra-se na falha do Kick em encerrar as transmissões, apesar dos sinais evidentes de abuso. A plataforma, apoiada pela Stake, baniu posteriormente as contas dos envolvidos, mas também enfrentou críticas por ter usado a imagem de Pormanove em posts de marketing, levando ao corte de laços com a sua agência francesa de redes sociais.
A situação legal do Kick complica-se ainda mais na sua jurisdição natal. A Comissária de eSafety da Austrália nota que as plataformas são legalmente obrigadas a proteger utilizadores de material prejudicial ou criminal. O falhanço em fazer cumprir os próprios termos de serviço pode resultar em multas até 49,5 milhões de dólares australianos.
Kick bane streamers após morte controversa de Jean Pormanove
O caso expõe também falhas no sistema judicial francês. Em janeiro de 2025, Naruto e Safine foram detidos sob suspeita de produzir vídeos ao vivo de humilhação de pessoas vulneráveis, mas foram libertados no mesmo dia da detenção.
Esta tragédia levanta questões fundamentais sobre a responsabilidade das plataformas de streaming. Até que ponto devem as empresas de tecnologia ser responsabilizadas pelo conteúdo transmitido pelos utilizadores? Como podem ser implementados sistemas de moderação eficazes sem comprometer a natureza em tempo real do streaming?
O Kick afirma estar a cooperar totalmente com os investigadores franceses, mas enfrenta agora uma batalha legal em duas frentes que pode estabelecer precedentes cruciais. Com processos judiciais iminentes tanto na Europa como na Austrália, este caso pode remodelar fundamentalmente como os serviços de livestreaming são responsabilizados pela segurança dos utilizadores.