
Uma proprietária de loja de banda desenhada na Carolina do Norte foi detida pela polícia depois de distribuir exemplares de uma comic com classificação para adultos durante um evento de Halloween destinado a famílias e crianças. O caso levanta questões sobre limites da liberdade de expressão e proporcionalidade das consequências legais.
Kathleen Lincoln, dona da Marvelous Issues, uma loja de comics na Carolina do Norte, foi presa depois de entregar cópias de Grendel Tales: the Devil’s Hammer #1 durante um evento Trunk-or-Treat em Sunset Beach. Este tipo de evento funciona como alternativa mais segura ao tradicional “doçura ou travessura”, onde comunidades se reúnem num ambiente controlado para distribuir guloseimas durante a época de Halloween.
A obra em questão, publicada pela Dark Horse Comics em 1994, traz um aviso explícito na capa: “Not For Children” (Não é Para Crianças). A comic contém nudez masculina e cenas de natureza sexual, além de violência gráfica típica do género de terror. Foi precisamente este conteúdo que gerou indignação entre pais presentes no evento.
Várias denúncias chegaram ao Departamento de Polícia de Sunset Beach após participantes notarem o tipo de material que estava a ser distribuído. Lincoln aparentemente utilizava a comic como parte de uma estratégia de autopromoção, entregando a comic juntamente com os panfletos publicitários da sua loja.
A situação escalou rapidamente. Lincoln acabou acusada de violar o Estatuto Geral da Carolina do Norte § 14-190.1, relacionado com literatura e exibições obscenas. No estado americano, esta violação é classificada como crime de Classe G, e a fiança foi estabelecida em 20 mil dólares. Lincoln ainda não fez declarações públicas sobre a detenção.
O Departamento de Polícia de Sunset Beach confirmou a prisão através de uma publicação no Facebook, onde detalhou as circunstâncias que levaram à intervenção policial. Nas redes sociais, pais expressaram choque e perturbação com a escolha de Lincoln, argumentando que nenhuma criança deveria ter acesso àquele tipo de conteúdo num contexto familiar.
Grendel Tales: the Devil’s Hammer é um spin-off da série Grendel Tales de Matt Wagner, publicado ao longo de três edições. A história segue Petrus Christus, único sobrevivente de uma cidade massacrada por um grupo de Grendels. Para se vingar, Petrus adopta ele próprio a identidade de Grendel, sem saber o preço terrível que terá de pagar.
Embora a capa e o tema de terror possam parecer apropriados para Halloween à primeira vista, é o conteúdo interno que causou o problema. A obra não esconde a sua natureza adulta, o aviso está claramente impresso na publicação.
A prisão gerou controvérsia e dividiu opiniões. Alguns questionam se chamar a polícia e apresentar acusações criminais foi uma resposta proporcional à situação. Poderia ter havido alternativas menos severas que ainda assim responsabilizassem Lincoln pelo erro de julgamento? Para outros, a distribuição deliberada de material adulto a menores num evento familiar justifica plenamente a intervenção das autoridades.
Não está claro se Lincoln sabia exactamente o que continha o comic que estava a distribuir. É possível que tenha escolhido Grendel Tales: the Devil’s Hammer baseando-se apenas na capa e no título, sem conhecimento real do conteúdo interior. Para alguém que gere uma loja especializada, porém, essa explicação levanta sobrancelhas.
O caso toca numa questão mais ampla sobre banda desenhada e percepção pública. Apesar de décadas de evolução do meio, persiste a ideia de que comics são automaticamente para crianças. A realidade é bem diferente, existe banda desenhada para todas as idades, desde títulos infantis até obras destinadas exclusivamente a adultos, com conteúdo violento, sexual ou psicologicamente perturbador.
A indústria de banda desenhada desenvolveu sistemas de classificação etária precisamente para evitar situações como esta. Editoras como a Dark Horse Comics são claras nas suas advertências. A questão é se consumidores, vendedores e o público em geral respeitam essas indicações.
O Trunk-or-Treat onde ocorreu o incidente é desenhado especificamente como espaço seguro para famílias. Pais levam os filhos esperando ambiente controlado e apropriado. A distribuição de material adulto neste contexto quebra uma confiança implícita da comunidade.








