Os videojogos desenvolvidos por estúdios independentes têm sido terreno fértil para inovações, bem como para preservar o sentimento de nostalgia presente em muitos de nós. Em parte, são estes pequenos estúdios que encontram as suas inspirações no que já foi feito no passado, que alimentam e modernizam até aos dias de hoje muitos dos géneros e estilos visuais que poderiam ter ficado esquecidos. É nesta linha de pensamento que o estúdio Sunnyside Games (Towaga: Among Shadows) apresenta Nocturnal, um side-scroller 2D de ação de plataformas que capta a atenção pela sua jogabilidade intuitiva com narrativa e imagem inspiradas na cultura e mitos da Pérsia.

Nocturnal começa com Ardeshir, um soldado da Ordem da Chama Perpétua, a regressar à sua ilha natal de Nahran. No seu regresso percebe que toda ilha foi ocupada por uma Névoa sombria que deu origem ao nascimento de criaturas, por isso, Ardeshir decide desbravar aquela terra condenada e perceber o que aconteceu com a sua população e salvar a sua irmã, Arsia.

A narrativa de Nocturnal apresenta-se tão minimalista quanto a sua jogabilidade. Enquanto avançamos pelos seus cenários, a sua história vai sendo entregue de modo simples, através de itens escritos que vamos encontrando, bem como a partir de diálogos que vão acontecendo com os sobreviventes. Embora a exploração não seja o foco principal, para retirarmos o máximo de conhecimento sobre o que está a acontecer devemos de ter em conta os locais ocultos dos cenários por onde passamos, visto ser a partir deles que descobrimos parte dos elementos narrativos. Outra característica que acho importante é o ambiente do jogo, que além da sua arte apelativa, consegue igualmente comunicar com o jogador, refletindo sem palavras o que aconteceu e está a acontecer na Ilha de Nahran.

Nocturnal identifica-se como um side-scroller de ação de plataformas, o que quer dizer que ao longo da excursão vamos atravessar os cenários do ponto A – através de saltos pelas plataformas, lutar e derrotar inimigos, resolver vários desafios entre eles quebra-cabeças – até chegarmos ao ponto B. Mas desde o começo que esta linearidade ganha impulso pelo elemento central do jogo, o fogo.

Esta mecânica fica embutida na espada de Ardeshir sempre que tocamos numa tocha acesa no cenário. O fogo é fundamental para enfraquecer a névoa e manter os ambientes iluminados, da mesma maneira que pode ser usado para derrotar os adversários e em especial os soldados consumidos pelas sombras. Além destes momentos, os quebra-cabeças ambientais do jogo foram também desenvolvidos para que o fogo tenha mais que uma finalidade, mas para isso devemos tentar que o mesmo se mantenha aceso dado que tem um curto tempo de duração. Em alguns dos quebra-cabeças, teremos de incendiar tochas por uma ordem correcta ou manter as tochas acesas para conseguirmos chegar ao local solicitado, mas há determinadas alturas em que os desafios se tornam mais evidentes, nomeadamente quando a névoa surge e começa a consumir a luz do local à medida que vão aparecendo diversos obstáculos à nossa frente.

A partir do fogo podemos também recuperar os nossos pontos de vida.

Com o desenrolar da jornada a jogabilidade vai ficando ainda mais estimulante com a conquista de novas habilidades que vão sendo desbloqueadas. Ainda que a árvore de habilidades do personagem seja modesta, dá acesso a umas adagas que podem ser arremessadas à distância, ao aumento dos nossos pontos de vida ou ainda do próprio tempo de duração do fogo. Claro que temos outras técnicas relacionadas com a manipulação deste elemento que se tornam cruciais para eliminar os adversários com rapidez.

Devo dizer que tudo isto funciona muito bem, embora se vá tornando continuamente mais exigente, os movimentos rápidos e precisos do personagem correspondem ao toque dos nossos botões. Isto também se verifica em combate, muito ao jeito da série Souls, Ardeshir consegue golpear de perto e à distância, saltar, rebolar e esquivar, abraçando um conjunto de estratégias alicerçadas nos movimentos de combate contra o inimigo, que exige que tiremos partido das suas falhas para atacar. Certamente que a natureza da situação acaba por interferir na complexidade do combate, sobretudo quando estão presentes diferentes tipos de inimigos com características distintas uns dos outros.

Infelizmente, a luta contra os bosses nem sempre foi tão fascinante quanto o resto. Apesar do primeiro exigir mais de nós por termos reduzidas as nossas capacidades, num todo os  bosses requerem pouco da nossa perícia por reproduzirem quase sempre os mesmos movimentos. Contava que o conceito nefasto em torno da Névoa fosse aplicado nestas alturas, não de forma que nos levasse a uma morte instantânea, mas que nos fizesse repensar na nossa abordagem.

Ao finalizarmos o jogo, é desbloqueado um modo speedrun.

Não há dúvida de que o que sobressai desde cedo em Nocturnal é a sua componente artística. Cada sala parece ser desenhada e pintada à mão, os seus gráficos 2D inspirados na arquitetura da Pérsia revelam ambientes exuberantes e com cores fortes que se integram na perfeição com a fantasia e drama representados. Houve também um admirável tratamento na animação do fogo, névoa e inimigos, embelezando assim os elementos do jogo num todo. Fora isso, encontramos problemas quanto à sua performance. Jogado na Nintendo Switch, por vezes senti alguns breves travamentos quando o personagem se move rapidamente em cenários com diversos elementos, acabando em certos casos por lesar um pouco a nossa partida. Já as músicas compostas por Paul Darbot são utilizadas em momentos determinantes, não deixando de lado a influência cultural vinculada no jogo patente em todas as faixas da sua banda sonora.

Nocturnal é um jogo de curta duração que atinge o seu objetivo ao proporcionar uma experiência fluida em combate e com quebra-cabeças exigentes que conseguiram cativar-me do início ao fim, juntamente com a sua narrativa e arte deslumbrante que nos faz parar para contemplar os ambientes, a nova obra da Sunnyside Games merece toda nossa atenção.

Nocturnal já está disponível para PlayStation 5, Xbox Series, Xbox One, Nintendo Switch e PC (Steam).

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