Tales of Arise é o 17.º conto das histórias principais da série. Este chega ao mercado com uma premissa pouco comum, diríamos mesmo vanguardista, ser um RPG japonês que eleve a série, o seu género e o apresente orgulhosamente ao mundo. Embora o seu anterior título fosse muito bem recebido pelos fãs e pela imprensa, sentiu-se como uma desculpa ao caos que Tales of Zestiria gerou, e após anos de hiato prometia voltar de cara lavada e em plena força! Perante estes registos esta pode ser uma tarefa quase impossível, porém desde que Tales of Arise foi revelado ao mundo que conseguiu cativar o interesse dos fãs, não só através da sua direção e narrativa, como também pelos seus magníficos visuais alimentados por um novo e poderoso motor de jogo mais próximo da atualidade.

Tales of Arise conta com fantásticas sequências animadas produzidas pelo célebre estúdio de animação UFOTABLE

Ao contrário de muitos capítulos este teve a ousadia de mudar radicalmente a sua narrativa, ao introduzir-lhe elementos que jamais esperaríamos encontrar num dos seus jogos que nos remetem a temas do mundo real tais como a discriminação social e a escravidão. O jogo apresenta-nos um conflito entre os planetas Rena e Dhana. Enquanto Os Renans conquistaram o mundo inferior com a sua tecnologia, os Dhanans não conseguiram ripostar e não encontraram outra forma senão viver sob o domínio dos seus opressores durante três séculos. Contudo, ventos de mudança sopram com a chegada de um misterioso homem intitulado Máscara de Ferro. Tal como o nome indica, este é um jovem misterioso que usa uma máscara de ferro que lhe cobre totalmente a cabeça e não se recorda da sua idade ou do seu passado. Porém, o seu maior denominador é o facto de ser incessível à dor. Por sua vez, Shionne é uma Rena que vive sob uma maldição que impede que qualquer um lhe toque. Este encontro -e consequente complemento- afetará os dois mundos, e porá um fim ao domínio tirânico dos Renans.

O desenvolvimento de personagens é progressivo e demonstra reversos da mesma moeda, relatados pelas suas personagens principais

Naturalmente que durante esta viagem a relação entre esta dupla ficará mais estreita, e além de um desenvolvimento de personagens magistral, com especial atenção às visões de cada conflito, o grupo também receberá mais membros que tal como habitualmente transpiram de carisma. Muitos podem julgar que é neste registo que Tales of Arise degusta do seu vinho mais familiar. Nada mais longe da realidade, embora apresente uma estética anime e se baseie em alguns estereótipos anteriormente explorados, as personagens neste conto estão muito mais próximas de indivíduos com valores humanos, não se assentando em temas ou situações juvenis, e são por excelência um grupo de jovens que discursam e têm motivações credíveis. Estes valores atingem maiores dimensões com os tradicionais “skits” que também receberam melhorias significativas. Nesta nova evolução são apresentados como se tratassem de um mangá “interativo”, longe vão os tempos onde os mesmos eram simples quadrados ou recortes das personagens com ligeiras animações. No entanto, sentimos um ligeiro sabor agridoce nestes, ao invés dos modelos 3D do jogo, a produção devia ter apostado por visuais 2D, para não só preservar este elemento na sua máxima forma, como também para se aproximar do seu efeito base. Felizmente a empatia e o desenvolvimento de personagens que tanto caracterizam esta dinâmica encontram-se presentes, até diríamos mesmo que elevaram consideravelmente a fasquia.

Os tradicionais “skits” estão de regresso, mas com temas mais adultos e um humor muito menos juvenil

No final do dia Tales of Arise é um JRPG (para o melhor ou para o pior consoante o ponto de vista de cada um). Estamos perante o tradicional jogo onde o mundo é dividido por regiões coabitadas por humanos e monstros nos seus mais variados e deslumbrantes ambientes. É precisamente neste ponto que Tales of Arise recorre às suas raízes mais profundas. O Tales Studio já tentou emular a vastidão de um mundo aberto como vimos em Tales of Zestiria, contudo sentimos que as suas áreas eram literalmente segmentos, visto que não existiam ligações entre as mesmas. Em Tales of Arise, a produção finalmente conseguiu criar um mundo muito mais vasto e orgânico. Mesmo na exploração de ambientes ou masmorras labirínticas existe mais verticalidade, o jogador pode nadar e saltar para aceder a novas áreas, que nos recompensam com items, atalhos ou áreas secretas. Em várias instâncias será comum encontrar pequenas e adoráveis corujas que fazem parte de uma progressiva missão secundária. Este é um dos únicos pontos negativos de Tales of Arise, as tarefas secundárias continuam a ser mais do mesmo, são tediosas, mundanas e repetitivas. Este efeito é mais sentido devido à evolução natural de todos os seus restantes elementos. Contudo, existe uma grande atividade paralela que foi inteligentemente integrada no enredo, a gestão de pequenas quintas. Estas são imprescindíveis para a recolha, conceção de novos alimentos e preparação de diversos pratos.

A cozinha sempre foi um elemento predominante na franquia Tales of, e em Tales of Arise sente-se como um elemento narrativo integrado. Durante os acampamentos ou nas estadias em pensões, poderemos preparar diversos pratos. Além de oferecerem “buffs” e outros elementos em combate, também se tornam um elemento na história porque tal como nós, o paladar das personagens são variados e certamente existem pratos favoritos por cada. Se alimentarmos o nosso aliado com um dos seus favoritos, além de uma breve animação, vamos aumentar a nossa relação e assistir a histórias mais pessoais, também poderemos desfrutar de vários incrementos da sua parte nos combates. Quanto à evolução de personagens somos apresentados a um misto entre Final Fantasy X/XIII e Tales of Graces f, onde percorremos uma tabela com os pontos que recolhemos das missões e das batalhas e desbloqueamos os característicos “Titles” da série.

O produtor de Tales of Arise é o talentoso Yusuke Tomizawa, um conhecido de longa data do OtakuPT que podem ver em cima a ser entrevistado pelo Hélder em Madrid por altura do lançamento de God Eater a convite da Bandai Namco Entertainment. Pedimos desculpa a Tomizawa pelo lançamento tardio da nossa análise a Tales of Arise, mas em Portugal temos tido muita dificuldade em assegurar a cobertura dos lançamentos da Bandai Namco Entertainment.

Embora se sinta como um jogo diferente por terceiros, o ADN característico da série encontra-se intacto em todos os seus momentos

Nesta viagem não existe um mapa-mundo e as áreas são todas percorridas em campos 3D sem separações ou transições entre as mesmas. Evidentemente os efeitos mais clássicos como visitar cidades, colecionar items em baús, recolha de ingredientes para cozinhar refeições e combater a fauna e flora -denominada de Zeugles- do mundo estão presentes e neste último registo Tales of Arise produziu um sistema de batalha tão inovar e orgânico que faz com que o galardoado “Style-Shift Linear Motion Battle System de Tales of Graces f seja descrito como algo de primitivo, parece ser difícil de acreditar, mas é verdade. Durante décadas a franquia Tales of, baseou-se num sistema de combate evolutivo, mas que se sentia também estagnado. É certo que apresentava novos elementos, mas a sua essência era literalmente o “Linear Motion”, com ligeiras melhorias. Em Tales of Arise as tradicionais arenas de combate são muito mais vastas, integradas no próprio ambiente e a transição entre exploração e combate é suave e imediata. Assim que entramos em combate podemos atacar os nossos inimigos com artes e combos associados aos “face buttons” do nosso comando. Ao contrário de qualquer jogo da série a personagem não pode estar incansavelmente a usar artes, e será necessário introduzir ataques básicos e encadeamos para o contador de “hits” não desaparecer do ecrã. Além destes ataques cada personagem controlada pelo CPU -por vezes com ações no mínimo questionáveis- irá ajudar-nos com ataques especiais se tivermos recursos para tal. Salvo a investida da arma de Shionne, um das recorridas foi o enorme escudo de Kisara que protege os seus aliados com o seu escudo. O jogo aposta nesta sinergia intensa de personagens, e utiliza-a para elevar os combates aos maiores patamares. O grande ponto a favor dos jogadores para se envolverem nas temáticas, explorarem as fraquezas dos seus adversários e conseguirem manter um combo ativo a todos os instantes é o facto de podermos terminar o mesmo com um ataque devastador do Máscara de Ferro -que muito cedo na aventura revela o seu verdadeiro nome- recorrendo à sua impressionante espada flamejante! Atenção que não falamos” das Mystic Artes”, que também existem, e recorrem mais uma vez ao estado “Overlimit” introduzido pela Team Symphonia.

Não pares! O sistema de batalha abre janelas a combos surpreendentes que podem ser executados quer por veteranos como novatos

Como não podia deixar de ser, o fluxo de batalha recai no nosso protagonista, e mesmo sendo um herói espadachim, sentimos uma maior diferenciação quando comparado a qualquer outro na série e até fora desta. Mesmo magos de ataque ou suporte como Rinwell ou Shionne são bem diferentes de jogar e não se limitam a desferir feitiços como foram os casos de Rowen de Tales of Xillia ou Rita Mordio de Tales of Vesperia. A jogabilidade no próprio combate também recebeu adições modernas vindas até de outros títulos como Bayonetta. Esquivas perfeitas, bloqueios perfeitos (parries), e ataques aéreos (evolução natural de Tales Of Hearts R) recompensam os jogadores mais dedicados. Contudo, quanto mais avançamos na história não só sentimos um decréscimo na sua dificuldade, como adquirimos mais proeminência neste fantástico sistema de batalha, isto porque os ataques tornam-se mais devastadores, daí que recomendamos aumentarem a dificuldade para encontrarem um desafio à altura em todos os momentos e poderem assimilar todos os melhores elementos do mesmo. De início o jogo é punitivo nas suas dificuldades mais altas, mas por favor desfrutem do mesmo para sentirem mais desafio, se a dificuldade for demasiada podem sempre voltar à vossa zona de conforto, pois a dificuldade pode ser modificada a qualquer altura nos menus, e inclusive existe uma dificuldade denominada de “Story” para apreciarem a história do jogo. Relativamente a menus mais uma vez estamos perante os melhores num JRPG. A arte 2D e estéticas transmitem um misto de clássico e moderno com muito requinte, limpos sem demasiado ruido, harmoniosos e evolutivos conforme o desenvolvimento do jogo e das nossas personagens.

A sinergia entre personagens é a nossa maior arma para triunfar contra os Zeugles mais poderosos

Visualmente estamos perante o conto mais impressionante dos vinte e cinco anos da sua história. O “Atmospheric Shader” pincela todos os cinco reinos de Dhana com toques de aguarela e confere aos seus cenários um requinte e uma identidade muito próprios. Cada localização apresenta uma beleza natural sem paralelo, e é radicalmente diferente, sendo equilibrada por certos elementos que lhe atribuem uma enorme identidade e carisma. Enquanto a área inicial é governada pelo fogo, cores quentes e assistimos a partículas de carvão nos ares, a seguinte é dominada por ventos gelados, cores frias e muita neve. Contrariamente a muitos jogos deste género os cenários e grafismos tornam-se mais ricos assim que o Máscara de Ferro também expande os seus horizontes. Podemos afirmar que o motor de jogo introduzido em Tales of Xillia, que se sentia estagnado pode finalmente descansar em paz. O poder do Unreal Engine 4 apresenta melhores destaques, é muito mais moldável, e introduz a evolução esperada por cerca de uma década. É certo que assistimos a decréscimos de qualidade visuais quando comparados ao seu trailer de revelação, mas a franquia Tales of, não tem como meta cenários fotorealísticos, o tema anime mesmo perante um maior requinte é todo sentido nas suas arestas. Relativamente a modelos de personagens, o 17.º capítulo da série apresenta-nos modelos de personagens com proporções mais humanas, e animações muitíssimo superiores, que até fazem corar algumas superproduções. As personagens mesmo em movimentos de corrida apresentam uma breve investida de corpo antes da ação, e em combates os movimentos graciosos de cada transbordam de fluidez e não existe estática quando são integrados, este último foi infelizmente sentido em Tales of Berseria. Infelizmente também são os NPC que continuam demasiado semelhantes aos que conhecemos, embora se sinta um ligeiro incremento de qualidade para se integrarem nos ambientes e personagens principais.

Após uma década o motor de jogo de Tales of Xillia recebe a sua merecida reforma

Ainda no cômputo técnico, mas relativamente à sua banda-sonora, estamos perante o regresso de Motoi Sakuraba à sua velha forma. Contudo, também sentimos um sabor agridoce neste quesito. Embora seja uma banda sonora poderosa, apresenta valores demasiado épicos em quase todos os seus momentos, e sentimos que já ouvimos a mesma faixa quer neste jogo como nos seus outros trabalhos. Até mesmo o seu fantástico tema de batalha -que infelizmente apenas surge nas masmorras de início- apresenta trechos muito semelhantes aos de Star Ocean: The Last Hope e Eternal Sonata, duas obras de renome do compositor. Julgamos que neste ponto, uma maior variedade e evasão da sua zona de conforto introduzisse uma maior variedade e distinção neste título. Quanto a opções de áudio o jogo apresenta vozes em japonês e inglês.

A versão para PC (Steam) que nos chegou à redação é possivelmente a definitiva de Tales of Arise. Ao contrário das versões para consolas, o jogo pode ser desfrutado com todos os seus elementos gráficos elevados ao máximo com resoluções 4K a 120 fotogramas por segundo sem quaisquer quebras, e com apenas decréscimos um ponto antes dos carregamentos entre áreas. No geral o resultado é no mínimo deslumbrante, as partículas a esvoaçarem nos ares, os movimentos e modelos de personagens em ambientes super nítidos, e até a fluidez em combate contribui para fazer desta a versão definitiva em qualquer plataforma na atualidade. Para os nossos amigos do Brasil, é com muito prazer que indicamos que esta versão do jogo está localizada em português do Brasil, a Bandai Namco Entertainment mais uma vez a pensar nas várias nacionalidades dos seus fãs em redor de todo o planeta terra.

Tales of Arise conta com fantásticos efeitos de luz e sombras que usam os recursos do motor de jogo Unreal Engine 4

Tales of Arise, é um dos raríssimos produtos que além de entregar o que prometeu, ainda teve a “ousadia” de o fazer a superar as expectativas dos seus fãs mais devotos. Enquanto sentimos uma evolução natural em todas as suas frentes, o seu ADN mais clássico permanece inalterável, quer seja no carisma das suas personagens, como nas suas frenéticas e desafiantes batalhas, que nunca se sentiram fatigantes. Tal como Final Fantasy VII, introduziu às massas o requinte dos RPGs japoneses em 1997, Tales of Arise vai certamente repetir esse movimento e introduzi-lo a uma nova geração de jogadores, pois além de ser um genial jogo, é também um excelente ponto de partida quer para a série como para o próprio género. O mesmo pode orgulhosamente dividir o Olimpo protagonizado por Tales of Symphonia, Tales of the Abyss, Tales of Vesperia e Tales of Berseria e ocupar o seu lugar como um dos jogos de maior renome e influência na série. Não temos nenhuma dúvida que estamos perante um dos jogos do ano e de uma história que vai ser certamente contada e vivida por tempos imemoriais.

Prós e Contras de Tales of Arise:

 

 

+ Narrativa surpreendente polvilhada com temas adultos
+ Personagens credíveis que ostentam valores humanos
+ Jogabilidade imersiva, evolutiva, desafiante e versátil
+ Grafismos repletos de requinte carisma e beleza natural
+ Modelos e animações de personagens vastamente melhoradas
+ Exploração de masmorras mais versátil e variada
+ Maior investimento no desenvolvimento de personagens e integrações na narrativa
+ Localização em vários idiomas
– Atividades secundárias demasiado mundanas com poucas implicações no enredo
– Banda-sonora demasiado assente na zona de conforto do compositor

Bruno Reis
Vindo de vários mundos e projetos, juntou-se à redação do Otakupt em 2020, pronto para informar todos os leitores com a sua experiência nas várias áreas da cultura alternativa. Assistiu de perto ao nascimento dos videojogos em Portugal até à sua atualidade, devora tudo o que seja japonês (menos a gastronomia), mas é também adepto de grandes histórias e personagens sejam essas produzidas em qualquer parte do globo terrestre.
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Julio Sebilhano
Julio Sebilhano
15 , Setembro , 2021 19:29

Esse pra mim só fica atras do Symphonia (que sempre vai ter um lugar guardado no meu coração), mas em comparação com o zestiria e o berseria, que foram os dois antecessores, ele com certeza está muito a frente.
Enfim, o jogo tá sensacional, gráfico, história, personagens, tem tudo pra ser o melhor jogo da série!

Bruno Reis
Bruno Reis
Reply to  Julio Sebilhano
15 , Setembro , 2021 22:06

O Tales of Symphonia com o passar do tempo tornou-se muito lento. As batalhas e desenvolvimento são muito lentos para padrões atuais. Era um dos jogos que apostava num Remake no futuro.

Over persephine
Over persephine
15 , Setembro , 2021 18:59

Perfeito!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Tartaglia
Tartaglia
15 , Setembro , 2021 21:20

O jogo do Ano pra min.

Lucius Artorius Pendragon
Lucius Artorius Pendragon
15 , Setembro , 2021 20:26

Em termos técnicos ele é o melhor da franquia sem duvidas (jogo lindo com gameplay gostosa D+) mas em termos de historia, personagens, missões, inimigos e construção de mundo acho ele bem OK. Poderia ter sido muito melhor.

Daria um 7/10

Paulo Henrique
Paulo Henrique
16 , Setembro , 2021 0:45

Ansioso para jogar, porém a versão que quero ”Deluxe Edition” tá quase R$400, o jeito é esperar uma promoção.
Aliás, tem um spoiler que quero muito saber em relação a um certo elemento que amo em histórias, mas ao mesmo tempo também não, pois pode me deixar bem triste se não for como eu espero… Enfim, tô nesse maldito impasse :/