The Legend of Heroes é uma das séries RPG que mais se tem destacado neste últimos anos nos corações dos fãs deste género. Uma das principais causas é o monumental trabalho da NIS America que incansavelmente localizou jogos com guiões monumentais a um ritmo sobre-humano. Num espaço de 3 anos não só conseguiu finalmente ultrapassar a barreira do tempo ao lançar no ocidente a duologia de Crossbell, como finalmente fechou o capitulo de Erebonia e até nos fez chegar um spin-off que cada vez mais tem sido relevante para a série principal. Ou seja, no espaço de um par de anos conseguimos também chegar à República de Calvard onde vamos ser apresentados a novos locais e protagonistas. Vejamos se ao longo desta breve análise a nossa estadia na capital da tecnologia e da arte vai ser equiparada ao requinte dos anteriores jogos.
Edith, a capital da República de Calvard é uma metrópole vibrante repleta de pontos de interesse que recentemente recebeu um enorme surto de emigrantes de todos os cantos do continente de Zemuria. Os muitos bairros da cidade albergam de tudo, desde pacatas tabacarias a movimentados clubes, centros comerciais e cinemas. No meio deste cenário citadino, e na cidade velha do distrito, somos introduzidos a Van Arkride, um jovem Spriggan que gere o Gabinete de Soluções Arkride, uma agência que atua como híbrido entre os Bracers e a S.S.S visto que realiza trabalhos onde ambas não conseguem atuar.
Um dia, Van é abordado por Agnés Claudel, uma jovem estudante da prestigiada Academia Aramis, que pede a sua ajuda para encontrar uma Orbment chamada Oct-Genesis, uma invenção do seu falecido bisavô, Claude Epstein, um dos maiores cientistas de Zemuria. A busca para localizar esta e outras 7 Geneses leva a dupla a formar alianças com Bracers, agentes do governo (CID) e até organizações criminosas tais como a Ouroboros e a Heiyue.

À semelhança dos anteriores capítulos, a história de The Legend of Heroes: Trails Through Daybreak também é magistralmente elaborada. Contudo, a grande mudança é que apresenta um tom muito mais adulto e sombrio. A narrativa é rica em fações, relações e alianças complexas. Um dos temas centrais do jogo é a exploração de áreas morais cinzentas que desafiam a noção de que não existe um bem e mal absoluto. Embora os arcos anteriores tenham abordado esta ideia, o primeiro capítulo de Calvard aprofunda-a muitíssimo melhor. A segunda metade do jogo, em particular, está repleta de momentos intensos que vão fazer qualquer jogador questionar a sua conduta. Ao contrário de alguns jogos anteriores da série que se baseavam em reviravoltas no enredo à velocidade da luz, a aventura do Spriggan e do seu grupo oferece uma nova experiência mais calma e até bastante cultural.
A República de Calvard, possui um misto muito equilibrado entre o contemporâneo e o moderno que contrasta imenso com o Império de Erebonia ou a Cidade de Crossbell. Como Calvard é uma República e não é uma monarquia, a sua intriga política é bastante relacionável à do nosso mundo. A filosofia multicultural do país introduz perspectivas diversas de várias etnias que enriquecem a narrativa com cenários dinâmicos e variados. A exploração da diversidade cultural no jogo dá mais profundidade à história, porque estes choques culturais criam situações estimulantes e envolventes que contribuem para os temas de renovação e recomeço presentes no jogo. Se tivesse de rotular uma zona do nosso mundo para Calvard, diria que seria a França devido à sua arquitetura barroca, especial cuidado pela arte, vestuário e pelos acentos nos nomes de locais e personagens.

O elenco de personagens também contribui imenso para desenvolver a narrativa e pontos de vista de cada região. Estamos perante um dos mais robustos elencos da série. Van é um excelente protagonista que é apoiado por um conjunto de personagens profundamente imperfeitas, porém fascinantes que o complementam. Cada uma também tem um arco de história pessoal bem desenvolvido que acrescenta peso emocional ao jogador e à narrativa. Ao contrário de alguns jogos anteriores onde as personagens eram meros espaços à espera de serem preenchidos em The Legend of Heroes: Trails through Daybreak todas têm um propósito e uma motivação credível. Atribuir um líder adulto ao grupo, mesmo que muitas personagens o rotulem de velho, foi uma enorme lufada de ar fresco para a série porque permitiu evadir-se de “troupes” e humor juvenil. Van está para The Legend of Heroes como Yuri Lowell, esteve para Tales of Vesperia para ficarem com uma ideia, porque ambos também atuam de uma forma moral bastante ambígua e por vezes assustadora.

À medida que os jogadores progridem na história e nas missões secundárias, as suas escolhas influenciam os seus valores de alinhamento: LAW, GRAY e CHAOS. Estes valores têm impacto nas estatísticas de combate, em certos pontos do enredo, nos aliados que a Arkride Solutions pode recrutar e nos adversários que enfrenta. Uma afinidade LAW elevada permite alianças com organizações públicas como a Bracer Guild, enquanto o aumento dos valores GRAY e CHAOS permite recrutar personagens moralmente questionáveis como o Enforcer VIII na Ouroboros, ou Shizuna, a misteriosa praticante da Eight Leaves Style que venceu sem esforço o Ashen Chevalier no final do anterior jogo. Estes valores mudam com base nas decisões e ações do jogador ao longo do jogo, com algumas escolhas a alterar significativamente as capacidades de Mare, o núcleo holográfico pessoal de Van.
O sistema Alignment, embora pareça interessante em conceito, na prática é muito limitado. Para além de alterar as propriedades do núcleo holográfico de Van, o impacto no jogo é mínimo. Apenas existe um momento crítico onde os jogadores vão ter de escolher uma fação para formarem equipa, mas, para além disso, o sistema não influencia significativamente a jogabilidade ou a narrativa, vi tudo mais como um sistema de reputação do que outra coisa.
Como The Legend of Heroes: Trails Through Daybreak é um novo jogo na série também introduz uma evolução significativa no seu sistema de batalha. O mesmo incorpora um misto entre Action RPG e Batalhas por Turnos. Esta inovação permite transições suaves entre as “Field Battles” e as “Command Battles” porque combina a ação frenética em tempo real com uma elevada camada de profundidade estratégica por turnos. Com um simples premir de botão, os jogadores podem mudar de modo para rapidamente eliminar os inimigos mais fracos com ataques rápidos e contínuos antes de passarem para as batalhas por comandos para participarem numa abordagem mais estratégica e receberem Tactical Bonus elevados.

O modo “Command Battle” mantém a mecânica clássica das batalhas Active Time ao recorrer aos tradicionais comandos Attack, Crafts, Arts e Itens para conquistar os inimigos. Os jogadores podem explorar o poder dos sete elementos com Artes ou utilizar Crafts exclusivas da sua personagem para derrubarem os inimigos. A utilização sábia destas capacidades pode até permitir aos jogadores derrotarem inimigos significativamente mais fortes ao debilitá-los antes da batalha porque um adversário em estado “Stun”, além de não poder atacar também sofre dano adicional no terreno.

O novo sistema de batalha atinge um equilíbrio perfeito entre a ação e a gameplay por turnos e oferece aos jogadores um maior controlo sobre os cenários de combate. O envolvimento em tempo real é uma fantástica adição à série, embora penso que deviam ter sido implementadas mais ações para o tornar mais substancial. Na minha mente este era o sistema de batalha que tinha pensado quando revelaram a trilogia de Final Fantasy VII Remake ao mundo, porque consegue agradar a ambos os públicos, os novos que preferem ação ininterrupta, e os veteranos que assistiram à maturidade da série e ao seu combate por turnos durante décadas.

Outro efeito muito reminiscente do sétimo episódio de Final Fantasy são as Xiphas, as novas Tactical Orbments avançadas que substituem as ARCUS e fornecem buffs permanentes, ataques combinados com aliados próximos e aumentam o poder das Artes e Crafts. Quem jogou The Legend of Heroes: Trails From Zero vai sentir-se em casa, porque as 4 linhas também se estendem a partir do núcleo central: Arma, Escudo, Impulso e Extra. Os valores dos atributos do Quartz colocados em cada linha determinam a utilização dos fragmentos, que ativam várias habilidades passivas dos Shards em batalha. Contudo, e à semelhança da duologia de Crossbell, as diferentes habilidades destes fragmentos requerem valores elementares específicos para serem ativadas.
Ao dispor o Quartz estrategicamente, os jogadores podem desbloquear habilidades de fragmento mais fortes que vão até auxiliar na caça aos baús, porque se Agnés juntar um fragmento Mirage ao seu Xipha na linha de Extra, vai revelar todos os tesouros no mapa com a sua habilidade desbloqueada, o mesmo acontece com Van se este equipar um Shard Space na mesma linha na sua Xipha, mas ao invés de revelar tesouros vai revelar os inimigos nos corredores das masmorras e outros cenários. No entanto, cada Driver de Artes vem equipado com um conjunto de Artes pré-instaladas que podem ser aprofundadas com a adição de Plugins que simplesmente são artes especificas equipadas numa das slots do aparelho. A instalação de um Driver numa Xipha permite ao seu utilizador ativar novas Artes, e um Núcleo Holográfico de nível superior dá acesso a Artes mais poderosas no dispositivo.

O novo sistema Orbment oferece uma personalização muitíssimo mais profunda, mas acredito que pode ser demasiado complexo e intimidante quando se trata de criar builds específicas para as personagens. Nos jogos anteriores, a configuração das personagens era mais simples, podem crer que passei largos minutos a afinar os Xipha com os Quartzes, Núcleos e Plugins para obter um melhor rendimento. Adquirir novos ataques pode ser um desafio no início, e obter novas Shard Skills requer requisitos muito específicos. Ao contrário dos anteriores jogos as Sepith Masses não são tão abundantes e em vários momentos tive de fazer grinding para comprar equipamento e comida, sim leram bem, porque acreditem que vão levar a Arkride Solutions a uma tournée culinária por toda a Calvard enquanto aumentam o vosso Gourmet Rank já que Van é o herói mais comilão da série até à data, algumas intervenções neste tema são bem divertidas, Van é o novo “C” na série, porque Carros, Comida e Caminhar em direção a banhos termais são as únicas coisas que cabem na sua cabeça.

Graficamente The Legend of Heroes: Trails through Daybreak representa o auge da Nihon Falcom Corporation em termos de fidelidade gráfica. Os cenários e personagens são detalhados e nítidos, as cores vibrantes e as animações foram bastante melhoradas em comparação com o seu antecessor, The Legend of Heroes: Trails into Reverie, que em algumas instâncias recebeu uma versão experimental deste novo motor de jogo. A mudança do PhyreEngine para um novo motor proprietário permitiu animações mais dinâmicas e detalhes gráficos melhorados que elevam e finalmente equiparam a experiência visual a outros jogos do seu género.
Outro elemento de especial destaque, é a sua banda sonora. A Nihon Falcom Corporation continua a ter especial cuidado neste parágrafo e a brindar-nos com algumas das melhores faixas musicais num videojogo. Mesmo numa nova região este elemento continua sólido. Desde o orquestral até ao Rock Progressivo, entre violinos, pianos e guitarras elétricas, o difícil mesmo é escolhermos a nossa faixa musical favorita. O jogo volta a contar com vozes em inglês e japonês, e não destoando o trabalho dos atores de voz ocidentais, julgo que este é um jogo a ser jogado com o áudio em japonês pelo fãs, porque o elenco de seiyuu é repleto de estrelas. Daisuke Ono (Jotaru Kujo de JOJO’s Bizarre Adventure), Yui Ogura (Sacerdotisa de Goblin Slayer), Yuma Uchida (Meguro De Jujutsu Kaisen), Yui Ishikawa (2B de NieR Automata) e Akio Ōtsuka (Big Boss/Solid Snake de Metal Gear Solid e Black Beard de One Piece) são apenas alguns dos ilustres nomes deste elenco. De salientar que a aparência de Bergard Zeman é idêntica à do lendário super soldado da Konami, até tem uma pala no olho.
Características do PC utilizado na Review:
Processador: AMD Ryzen 9 5950X
Placa gráfica: NVIDIA GeForce RTX 4090 MSI Suprim X
RAM: 64 GB RAM a 3600 MHz
Disco: Samsung 990 PRO NVMe M.2 SSD
Como se devem ter apercebido, The Legend of Heroes: Trails through Daybreak é mais uma grande port de Durante no PC, e tal como as anteriores vem equipada com elementos exclusivos que não existem nas versões para as consolas, tais como resoluções ultrawide e suporte de rácio de aspeto, suporte para taxas de fotogramas até 360 FPS, uma definição de campo de visão superior e várias novas opções gráficas que podemos modificar, tais como qualidade e resolução de sombras, volumetria e reflexos no espaço do ecrã. Mesmo com o lançamento do jogo no PC há mais de uma ano, Durante continuou a melhorá-lo nos bastidores e após o seu anuncio ocidental decidiu implementar um grupo de opções gráficas que estavam em projeto e que são uma novidade, até para o próprio sistema.
A cache das sombras foi vastamente melhorada. Nesta versão do jogo, com a nova definição de cache de sombras predefinida, a qualidade de sombras foi melhorada sem custos de desempenho. O SGSSAA (Sparse Grid Supersampling) nativo por hardware é uma tecnologia que foi criada para retificar todos os problemas de antiliasing dos jogos anteriores principalmente em movimento, agora as arestas e jaggies nas personagens e cenários são praticamente inexistentes, a troco de um impacto brutal no desempenho. Outra grande novidade é a divisão de reflexos, dinâmicos no espaço do ecrã e estáticos baseados em mapas de cubos para melhorar transparências em superfícies espelhadas ou rios, e suporte a HDR, apesar da sua implementação ainda precisar de algumas melhorias. Também pela primeira vez na série todas as opções gráficas podem ser modificadas no próprio jogo e em qualquer altura sem recorrermos a um launcher para esse efeito. São as seguintes:
- Resolution
- Refresh Rate
- V-Sync
- Field of View
- Motion Blur
- Depth of Field (Apenas atua em cutscenes)
- Character Draw Distance
- Level-of-detail Distance
- Light Draw Distance
- Shadow Resolution
- Shadow Filtering
- Shadow Caching
- Local Shadowing (impacto considerável em placas gráficas com pouca VRAM, porque armazena texturas de sombras em tempo real na VRAM)
- Rendering Scale
- Anti-Aliasing
- Sparce Grid Supersampling (imenso impacto na performance no modo “Everything”)
- Transparency Multisampling
- Portrait Supersampling
- Mini map Anti-Aliasing
- Anisotropic Filtering
- Screen-space Reflections
- High-Resolution Cubemaps
- Volumetric Lightining (impacto considerável em resoluções altas)
- Water Shading
Na nossa já vossa conhecida build PC pudemos jogar o primeiro capitulo na República de Calvard a uns sólidos 120 fotogramas por segundo com todas opções gráficas ativadas e no máximo exceto a Sparce Grid Supersampling que foi mantida em MSAA 2x, mas com a opção “Everything” para um acabamento cristalino nas arestas. Contudo, quando saímos do requinte de um computador de secretária para a mobilidade e versatilidade de dispositivos portáteis é que me apercebi que o trabalho de Durante é um verdadeiro guia para ports de jogos de consolas nos PC form factor. Com o preset “Médio” pude desfrutar do jogo na Steam Deck a uns sólidos 60 fotogramas por segundo em praticamente todos os ambientes e situações. O mesmo pode ser dito da ROG ALLY, onde pude atingir sem qualquer problema os 120 fotogramas a 1080p com o mesmo preset e com a tecnologia Fluid Motion Frames ativada. Contudo, existe um denominador que achei vital em qualquer um dos aparelhos que é simples e que molda quase por completo a experiência de jogo. Durante e a sua equipa da PH3 adicionaram uma opção que melhora a “UI” em resoluções BAIXA. Este elemento é bastante útil quando jogamos numa resolução baixa dado que permite ao jogador ler textos com clareza nos diálogos e menus de jogo sem esforço e sem os habituais cortes nas caixas de texto.

Não vou terminar esta análise sem antes responder aquela tradicional pergunta que está presente na maioria dos grupos de fãs fervorosos desta magnifica série, pois bem: “É possível desfrutar de The Legend of Heroes: Trails through Daybreak mesmo sem jogar os capítulos anteriores?”.
A minha resposta é sim por mais controverso que seja para alguns. É certo que vão perder bastante contexto da série, por exemplo, não vão saber de onde vem Zaine, Zane, Zin, ou outro nome que as editoras decidam colocar no robusto praticante de Taito, quem é na verdade a sarcástica Renne Bright, porque a organização mafiosa Revanche ainda é mencionada mesmo estando extinta, as origens de Fie Clausell ou porque o orbment RAMDA ainda é utilizado apesar de ser tecnologicamente inferior à Xipha.
A Nihon Falcom Corporation continua a fazer um excelente trabalho a agradar a novos e veteranos na sua série, e com este novo capítulo julgo que tudo o que os novos jogadores vão perder é o pano de fundo e contexto de personagens secundarias e alguns locais. Não se vão sentir perdidos e vão poder desfrutar de um dos jogos que mais tive prazer em jogar neste ano de 2024. Aliás, a banda sonora das batalhas é um forte indicador deste parágrafo. À semelhança dos temas “Sophisticated Battle” de The Legend of Heroes: Trails in the Sky FC e “Glint of Cold Steel” do primeiro capítulo de The Legend of Heroes: Trails of Cold Steel, é também despreocupada e animada e transmite os mesmos sentimentos de começo que vivemos em Liberl e Erebonia.
The Legend of Heroes: Trails through Daybreak marca aquele passo importante que a série teria de dar para se soltar das suas amarras. Estamos perante um dos melhores jogos da série que na minha opinião consegue igualar o célebre The Legend of Heroes: Trails to Azure nos departamentos de elenco de personagens, locais, banda sonora e momentos. Não fiquem intimidados pelos trilhos deixados pelos heróis de Liberl, Crossbell e Erebonia e alistem-se hoje mesmo na Arkride Solutions na movimentada República de Calvard e podem crer que vão ficar maravilhados e ansiar pelo próximo capítulo de uma série que finalmente recebeu o seu merecido destaque no género.
joguei a demo e achei bem ruim
Em que sentido?