
A iRobot, empresa pioneira que transformou os aspiradores robóticos num produto de consumo massivo com o icónico Roomba, entrou em processo de falência. A fabricante norte-americana com sede em Massachusetts anunciou que irá vender todos os seus ativos à Picea Robotics, uma empresa chinesa que é simultaneamente o seu principal fornecedor e credor.
A decisão surge quase dois anos depois de a aquisição de 1,7 mil milhões de dólares pela Amazon ter caído por terra em janeiro de 2024, bloqueada por reguladores europeus que temiam que a gigante do comércio eletrónico pudesse prejudicar a concorrência no mercado de aspiradores robóticos.
Do pico à queda
Fundada em 1990 por três investigadores do MIT, Rodney Brooks, Colin Angle e Helen Greiner, a iRobot foi durante anos a referência absoluta em robótica doméstica. O primeiro Roomba, lançado em 2002, tornou-se num fenómeno cultural que ultrapassou a categoria dos aspiradores, vendendo mais de 50 milhões de unidades ao longo de 35 anos de história.
No auge da pandemia em 2022, a empresa estava avaliada em 3,56 mil milhões de dólares. Hoje, o seu valor de mercado ronda apenas os 140 milhões de dólares.
A empresa lutou contra ventos contrários crescentes nos últimos anos. Perturbações na cadeia de abastecimento pós-COVID, concorrência feroz de marcas chinesas como Roborock, Dreame e Ecovacs com produtos mais baratos, e tarifas de 46% sobre importações do Vietname, onde a iRobot fabrica os seus produtos para o mercado norte-americano, apertaram ainda mais o cerco financeiro.
O golpe fatal da regulação europeia
O momento decisivo chegou quando a Comissão Europeia sinalizou que bloquearia a fusão com a Amazon, argumentando que a gigante tecnológica poderia favorecer os seus próprios produtos no seu marketplace em detrimento da concorrência. Margrethe Vestager, vice-presidente executiva da Comissão Europeia, afirmou que a aquisição poderia ter “restringido a concorrência no mercado de aspiradores robóticos, levando a preços mais altos, menor qualidade e menos inovação para os consumidores”.
A Amazon acabou por pagar 94 milhões de dólares como indemnização pela quebra do acordo. Mas esse dinheiro não foi suficiente para salvar a iRobot.
Colin Angle, fundador e então CEO, demitiu-se imediatamente após o colapso do negócio. A empresa cortou 31% da força de trabalho, cerca de 350 funcionários, num esforço desesperado para reduzir custos. Em março de 2025, a iRobot já admitia dúvidas substanciais sobre a sua capacidade de continuar em operação.
Ainda em março de 2025, sob a liderança do novo CEO Gary Cohen, a iRobot lançou a sua maior gama de produtos de sempre: as séries Roomba 105, 205, 405 e 505. Os novos modelos incluíam navegação LiDAR, aspiração 70 vezes mais potente que os modelos antigos da série 600, e funcionalidades avançadas como compactação de pó e bases de lavagem automática.
Mas a inovação chegou tarde demais. As vendas não recuperaram o suficiente para compensar as perdas acumuladas.
O que acontece agora
A Picea Robotics, com sede em Shenzhen, já era o principal fabricante contratado e credor da iRobot. Em dezembro de 2025, a subsidiária da Picea, Santrum Hong Kong, adquiriu 190,6 milhões de dólares em dívida que a iRobot tinha para com o Carlyle Group, um empréstimo ponte contraído durante o período de revisão regulatória da compra pela Amazon.
Com a declaração de falência segundo o Capítulo 11 no tribunal de Delaware, a Picea ficará com 100% do capital da empresa. A dívida de 190 milhões de dólares e mais 74 milhões devidos sob o acordo de fabricação serão cancelados. Outros credores e fornecedores serão pagos na totalidade, mas os acionistas comuns perderão tudo.
O processo deverá estar concluído em fevereiro de 2026. A iRobot promete continuar a operar “sem interrupção antecipada” das suas funcionalidades de aplicação, programas de clientes, parceiros globais ou suporte de produtos. Os utilizadores de Roomba devem continuar a ter acesso a peças de substituição e consumíveis.
Gary Cohen, CEO da iRobot, descreveu o acordo como “um marco fundamental para garantir o futuro de longo prazo da iRobot”. Mas a realidade é inescapável, a empresa que criou a categoria de aspiradores robóticos e dominou o mercado durante mais de uma década será agora controlada por um fabricante chinês, numa reviravolta irónica para uma história que começou nos laboratórios do MIT.








