
Morgan Freeman declarou numa entrevista ao The Guardian que está “um pouco chateado” com a forma como empresas de inteligência artificial têm usado a sua voz sem permissão. O ator de 88 anos, cuja voz se tornou numa das mais reconhecíveis de Hollywood ao longo de décadas de carreira, não está disposto a deixar passar a apropriação não autorizada da sua voz.
“Sou como qualquer outro ator: não me imitem com falsidade. Não aprecio isso e sou pago por fazer coisas assim, portanto se vão fazê-lo sem mim, estão a roubar-me”, afirmou Freeman. A escolha de palavras não deixa margem para dúvidas, para o vencedor de um Óscar, isto não é uma questão de vaidade mas sim de roubo puro e simples.
Quando questionado se isto já estava a acontecer consigo, Freeman revelou que os seus advogados “têm andado muito, muito ocupados”. A equipa legal já descobriu vários casos de uso não autorizado da sua voz e está ativamente a perseguir os infratores. Em dezembro de 2024, a equipa legal do ator emitiu uma ordem de cessar e desistir a Yonatan Badash, criador de um bot do Twitter chamado FreemanAI concebido para imitar a voz, cadência e estilo do lendário ator.
A situação não é única. Freeman junta-se a um número crescente de atores preocupados com a forma como a tecnologia está a ser usada para replicar as suas vozes e imagens sem consentimento ou compensação. O timing é particularmente delicado dado o lançamento recente de ferramentas como o Sora 2 da OpenAI, que permite aos utilizadores recriar pessoas e personagens reais.
A primeira “atriz” totalmente IA
Freeman não ficou impressionado com Tilly Norwood, apresentada como a primeira “atriz” totalmente gerada por IA. Criada pela comediante Eline Van der Velden através do estúdio de talentos IA Xicoia e da produtora Particle6, Norwood foi revelada em setembro de 2025.
“Ninguém gosta dela porque não é real e isso tira o lugar de uma pessoa real, portanto não vai funcionar muito bem em filmes ou televisão”, declarou Freeman. O ator sublinha que o trabalho dos sindicatos é manter atores a atuar, pelo que haverá inevitavelmente conflito com estas criações sintéticas.
A posição de Freeman encontra eco em figuras como Whoopi Goldberg, que criticou Norwood ao explicar que estas criações são geradas com características de milhares de outros atores,”tem a atitude de Bette Davis, tem os lábios de Humphrey Bogart”. É uma amalgamação que ameaça a singularidade que define cada intérprete.
O contraste com quem abraça a tecnologia
A posição de Freeman contrasta fortemente com outros atores que optaram por abraçar a tecnologia. Michael Caine, seu colega em The Dark Knight, fez recentemente parceria com a empresa de áudio IA ElevenLabs para produzir uma versão autorizada da sua voz para uso comercial. O novo Iconic Voice Marketplace da empresa permite que marcas e criadores licenciem vozes de celebridades através de acordos baseados em consentimento.
Matthew McConaughey foi ainda mais longe, investindo numa quantia não revelada na ElevenLabs e usando a sua voz IA aprovada para publicar uma edição em espanhol da sua newsletter Lyrics of Livin’. Até o Fortnite entrou na onda, introduzindo um Darth Vader no jogo com voz autorizada pelo espólio de James Earl Jones.
Mas Freeman mantém-se firme na sua convicção de que vozes IA nunca substituirão talento real. Para ele, a autenticidade não é negociável, e a sua voz, treinada ao longo de décadas com o instrutor de voz e dicção Robert Whitman, não é algo que possa ser simplesmente replicado por algoritmos sem consequências.
O cerne da questão para Freeman é simples: controlo sobre o próprio trabalho e imagem. A sua voz ajudou-o a conseguir papéis icónicos, narrou inúmeros documentários e projetos, e tornou-se numa ferramenta de trabalho que gera rendimento. Permitir que empresas tecnológicas a clonem livremente é, na sua perspetiva, permitir que roubem o seu ganha-pão.
A indústria do entretenimento encontra-se cada vez mais desconfortável com IA que clona vozes, rostos e performances sem consentimento dos intérpretes. O SAG-AFTRA e outros sindicatos têm pressionado contra performers sintéticos, argumentando que exploram e ameaçam os meios de subsistência de atores reais.
Freeman deixou clara a sua posição, quando inteligência artificial clona a sua voz sem permissão, não é inovação, é roubo. E enquanto alguns veem a IA como uma ferramenta criativa cheia de possibilidades, Freeman sublinha a importância fundamental de consentimento e crédito nesta paisagem em evolução. Os artistas querem controlar como a sua imagem e voz são usadas, e para este veterano de Hollywood, essa linha não é negociável.










E que outros façam o mesmo.