Embora a Sucker Punch Productions seja uma empresa que outrora produziu jogos de sucesso da série Sly Cooper e Infamous, julgo que foi com Ghost of Tsushima que finalmente se conseguiu sentar no panteão da PlayStation e da Sony Interactive Entertainment porque conseguiu desenvolver um dos jogos mais surpreendentes e requintados da geração PlayStation 4 que a par de Sekiro: Shadows Die Twice apresentou uma das melhores aventuras decorridas no Japão Feudal. Também conseguiu o feito de revitalizar uma localização japonesa anteriormente desconhecida que consequentemente viu o seu turismo local ser revitalizado. Numa altura onde as águas de uma nova ilha estão bastante agitadas vejamos se as consegue apaziguar enquanto replica o que atingiu nas consolas PlayStation 4 e PlayStation 5 em 2020 e 2021.

Ao contrário dos inúmeros jogos baseados neste período, Ghost of Tsushima não se passa no tradicional período sengoku, mas sim durante a invasão de 1274 que levou 80 samurais a enfrentarem milhares de invasores da Mongólia. Um destes 80 guerreiros é Jin Sakai que foi inspirado numa figura histórica. Contudo, e por muito estranho que vos possa parecer, inicialmente somos apresentados ao guerreiro como uma personagem um pouco unidimensional por este ser motivado por elementos desgastados neste tipo de obras. Contudo, como Jin partilha uma constante obrigação de seguir um código de honra conhecido como “Bushido”, consegue muito rapidamente evadir-se de alguns clichés que o prendem.

O combate é um dos principais pilares para o seu desenvolvimento e reflete com clareza o seu credo por apresentar um sistema onde um único golpe com a espada é suficiente para determinar quem emerge vencedor. No entanto, antes que seja desferido o golpe fatal, os jogadores devem quebrar a postura do adversário. A forma mais eficaz é fazer com que percam a concentração para desferir um golpe incisivo e mortal, de salientar que durante estes momentos o jogo envereda por uma perspectiva bastante cinematográfica e intensa. Outro aliciante deste elemento é o facto de golpes bem executados aumentarem o “ki” de Jin para que este recupere alguma da sua vitalidade.

Outra forma de eliminar o inimigo e fazendo justiça ao nome do jogo é transformar Jin num fantasma para espalhar medo nos corações dos mongóis e assim aniquilar vários inimigos de uma só vez em incríveis cenas em câmara lenta. Contudo, se Jin decidir deixar a sua honra em casa, pode utilizar objetos à distância para ferir o adversário, tais como flechas, criar emboscadas com os companheiros ou transformar-se num autêntico guerreiro ninja. Este foi o meu elemento favorito para conquistar o exército mongol de Ghost of Tsushima porque como fã de longa data da série Tenchu reconheço que o jogo utilizou imensos elementos dos assassinos shinobi que matam pela calada. Tal como Rikimaru e Ayame, Jin também possui um gancho para subir a telhados ou muros, utiliza bombas de fumo para confundir o adversário, fere com kunais e zarabatanas, e esgueira-se nas folhagens e nas sombras. No entanto, este não deixa de ser um dos aspetos divisores da filosofia do Bushido, já que o caminho das sombras vai contra os princípios do samurai justo, e cabe ao jogador escolher o caminho fácil ou o caminho certo.

O enredo de Ghost of Tsushima acompanha a vida de Jin através de uma série de missões enquanto dá a conhecer melhor os outros sobreviventes da ilha levando a um bom arco de história, embora não corra muitos riscos. Parte da narrativa está na recriação da ilha e podem crer que está incrível! A ilha de Tsushima está repleta de uma natureza exuberante e cada paisagem transpira elementos da arquitetura, cultura e folclore do Japão. Apesar de se tratar de um jogo desenvolvido por um estúdio americano, tenho de admitir que conseguiram captar a beleza clássica do xintoísmo, das lanternas de pedra, dos portões tori, dos santuários salpicados de florestas de áceres vermelhos, dos bosques de bambu e planícies de espigas varridas pelo vento, todos estes elementos transportam os jogadores imediatamente para o Japão Feudal, diria mesmo que toda a apresentação é muito superior a diversas produções japonesas dentro e fora dos videojogos.

Outro dos cartões de visita de Ghost of Tsushima é como não existe nenhuma “UI” no ecrã. Os tradicionais mapas ou bússolas foram substituídos pela direção do vento para indicar onde está o próximo alvo de Jin, os pássaros voam à volta de locais de interesse e as raposas convidam-nos a segui-las até santuários escondidos. Mesmos passados alguns anos esta forma continua a ser uma das mais orgânicas para o jogador explorar um cenário. Acreditem que existe bastante para descobrir na ilha porque se o jogador decidir desviar-se da história principal vai encontrar fortalezas do exército Mughal para libertar, missões de busca para participar, faróis, e uma série de minijogos relacionados com o modo de vida dos samurais, tais como o tameshigiri (cortar bambu com uma espada), meditar ou compor haiku. Também não faltam objetos à espera para serem recolhidos, e a possibilidade de aprender técnicas ou melhorar armas e yoroi (armadura tradicional) em diferentes artesãos espalhados pela ilha.

Ghost of Tsushima já era um jogo enorme e com a expansão da ilha de Ikki na edição Diretor’s Cut é muito mais. A história é fantástica e cada ato cresce de escopo e intensidade. Quando começamos a odisseia de Jin, ficamos impressionados com a quantidade de itens que podem ser melhorados e personalizados, senti uma lufada de ar fresco neste género com as técnicas e posturas que podemos aprender e com todos os recursos desbloqueáveis, porque tudo praticamente está disponível desde o início. Num mapa onde pontos de interesse estão sempre a surgir, quem levar a epopeia de Jin com serenidade vai ser recompensado.

Este é um dos aspetos que insere equilíbrio e convida os jogadores a assimilar a beleza que exala em cada canto da ilha. Não se trata apenas de um profundo conhecimento da estética clássica japonesa no uso da cor, na recriação de cenários e na comunhão com a natureza. A focagem da câmara, a iluminação e as partículas permanentes, cinzas, folhas que caem, pirilampos ou libélulas também complementam uma pintura onde cada fotograma é uma autêntica obra de arte. Na minha ótica continua a ser o jogo em mundo aberto mais requintado da atualidade.

Tudo atinge ainda mais requinte com a sua magistral banda sonora polvilhada por instrumentos tradicionais como o koto shamisen e a flauta, da autoria de Ilan Eshkeri e Shigeru Umebayashi. Este é um daqueles jogos que recomendo vivamente jogarem com o áudio em japonês porque tudo é muitíssimo mais autêntico apesar de estar completamente localizado em diversos idiomas onde constam o português europeu e o português do Brasil.

Autêntica também é a reputação da Nixxes Software como o melhor estúdio para a portabilidade de jogos PlayStation 4 e PlayStation 5 para o PC. Isto porque os seus programadores vão sempre mais longe e tentam acrescentar características específicas ao ecossistema PC e aos seus diferentes tipos de utilizadores. Assim, tal como o anterior lançamento, Horizon Forbidden West, que podem ler a sua análise aqui, para além do formato 16:9, a Nixxes Software colocou todas as configurações de ecrã ultra-wide ou ultrawide, tais como 21:9, Super Ultrawide 32:9, 48:9 e configurações de monitor triplo. Desta leva os jogadores vão poder tirar total partido de qualquer configuração de ecrã que tenham. O jogo conta com vários presets (baixo a ultra) com as seguintes as opções gráficas:

  • Motion Blur Strength
  • Texture Quality
  • Texture Filtering
  • Shadow Filtering
  • Shadow Quality
  • Level of Detail
  • Terrain Detail
  • Volumetric Fog
  • Depth of the Field
  • Screen Space Reflections
  • Ambient Occlusion
  • Bloom
  • Vignette
  • Water Caustics

Na nossa habitual configuração, ou seja, uma build composta por um processador AMD Ryzen 9 5950X, uma placa gráfica NVIDIA GeForce RTX 4090 MSI Suprim X, 64 GB RAM a 3600 MHz e uma unidade Samsung 990 PRO NVMe M.2 SSD, pude usufruir de Ghost of Tsushima: Director’s Cut em resoluções 4K com todos os elementos gráficos elevados ao máximo a mais de 120 fotogramas por segundo. Também posso garantir que Ghost of Tsushima: Director’s Cut não sofreu dos habituais problemas de compilação de shaders e soluços que tanto pragam este sistema. A compilação de shaders é iniciada quando o mapa é carregado e esta demora apenas alguns segundos, pelo menos numa unidade NVMe e são guardados na cache, e os carregamentos subsequentes do jogo vão ser muito mais rápidos, a menos que se mude a placa gráfica ou se faça uma atualização de drivers da placa gráfica.

Contudo, o requinte visual equilibrado com a fluidez de jogo deve-se na maioria dos casos a uma incrível implementação que espero ver noutros lançamento no futuro. Ghost of Tsushima: Director’s Cut é o primeiro jogo onde podemos juntar as tecnologias NVIDIA DLSS 3 e AMD FSR 3, ou seja é possível desfrutar da tecnologia de geração de fotogramas da AMD com os visuais da NVIDIA mesmo se não tivermos placas gráficas da série NVIDIA RTX 4000. Quem tem uma MSI Claw pode ficar descansado porque a Nixxes Software também implementou a tecnologia Intel XeSS 1.3 nesta port. Mas e o que dizer de outras portáteis no mercado, nomeadamente as que possuo, a Steam Deck e a ROG Ally?

Na portátil da Valve com as definições predefinidas o jogo consegue manter-se bastante estável e acima dos 30 fotogramas por segundo, por vezes atinge a fasquia dos 40, uma taxa perfeitamente jogável, embora a ROG Ally com o seu APU mais poderoso naturalmente consiga ir mais longe. O maior feito de Ghost of Tsushima: Director’s Cut na ROG ALLY é que é capaz de ser executado entre 50 e 60 fotogramas por segundo graças à tecnologia AMFM, também conhecida como AMD Fluid Motion Frames, ou o equivalente de software de geração de fotogramas para melhorar a sensação de fluidez dos jogos da AMD. Com uma taxa energética de 25w, resolução de 900p e preset em médio (exceto o Shadow Quality e Filtering) pude desfrutar desta grande aventura ao ar livre a praticamente 60 fotogramas, claro que com a bateria a esfumar-se quase em tempo real.

Quem esteve atento ao pré-lançamento de Ghost of Tsushima: Director’s Cut no PC  certamente que se deve lembrar da polémica da obrigatoriedade de um registo de uma conta PlayStation Network para o jogar no PC, porque Ghost of Tsushima Diretor’s Cut tem a honra de ser o primeiro jogo a ter o “overlay” PSN neste sistema. Ou seja, a qualquer momento do jogo podemos ativar a interface da PSN com quatro opções: procurar amigos, ver a nossa lista de adições à PlayStation, troféus ganhos, que serão os mesmos no PC e na consolas, e definições. Muitos utilizadores ficaram apavorados com esta implementação, mas como o jogo não tem “DRM” e funciona offline o registo apenas é necessário para o modo cooperativo multiplayer “Legends”, e naturalmente é uma forma de unificar ecrãs e o ecossistema PlayStation, podem crer que os inevitáveis The Last of Us: Parte II Remastered, God of War Ragnarok e Marvel’s Spider-Man 2 no PC também vão seguir esta via mesmo sem componentes multiplayer.

A par de Bloodborne e God of War: Ragnarok, julgo que Ghost of Tsushima: Director’s Cut é o jogo PlayStation mais ansiado pelos jogadores do PC. Mais uma vez a Nixxes Software voltou a surpreender com uma port magistral, extremamente requintada e otimizada que não vai ter problemas absolutamente nenhuns quando for executada num PC moderno ou qualquer um dos dispositivos portáteis atualmente disponíveis no mercado. Visualmente continua arrebatador e revela ser um verdadeiro manual de disciplina do que a Sony deve fazer numa plataforma que se revela cada vez mais importante no futuro. Numa altura onde o regresso a Tsushima está iminente na PlayStation 5 não deixem de revisitar a primeira aventura com um requinte ainda maior. 

Bruno Reis
Vindo de vários mundos e projetos, juntou-se à redação do Otakupt em 2020, pronto para informar todos os leitores com a sua experiência nas várias áreas da cultura alternativa. Assistiu de perto ao nascimento dos videojogos em Portugal até à sua atualidade, devora tudo o que seja japonês (menos a gastronomia), mas é também adepto de grandes histórias e personagens sejam essas produzidas em qualquer parte do globo terrestre.
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