Portugal apresenta uma situação contraditória no cenário da pirataria digital europeia. Apesar de ter implementado um dos sistemas de bloqueio de sites mais rigorosos da Europa, com mais de 3.000 domínios bloqueados, o país mantém-se como um dos maiores consumidores de conteúdo pirata do continente, especialmente no universo anime e mangá.
O Sistema de Bloqueio Português: Uma Década de Medidas Anti-Pirataria
Desde 2015, Portugal opera sob um acordo voluntário entre governo, detentores de direitos autorais e fornecedores de internet. Este sistema permitiu o bloqueio sistemático de milhares de domínios piratas, sendo inicialmente saudado por Hollywood como um exemplo a seguir por outros países europeus.
Números Impressionantes, Resultados Questionáveis
Os dados mais recentes da MUSO, empresa especializada em tracking de pirataria, revelam uma realidade surpreendente:
- Taxa de pirataria 33% superior à média europeia
- Maior número de visitas a sites piratas da região
- Padrão consistente mantido ao longo de vários anos
Panorama de Portugal segundo a MUSO (2017 a março de 2025)
- Total de visitas piratas: 8,4 mil milhões
- Média de visitas por internauta: 1.211
A taxa de pirataria por utilizador em Portugal é 33% superior à média europeia, marcando o país como um dos territórios mais ativos no consumo de conteúdos não autorizados.
Nos últimos 12 meses (abril de 2024 – março de 2025), Portugal registou 1,29 mil milhões de visitas a sites de pirataria, o que equivale a 186,58 visitas por utilizador da internet. Em comparação, a Europa registou 143 mil milhões de visitas ou 107,61 por utilizador da internet.
A Brecha do Anime e Mangá: O Ponto Cego das Autoridades
A análise dos sites mais visitados em Portugal revela um padrão interessante e preocupante para a indústria do entretenimento japonês. Entre os dez sites piratas mais populares, destacam-se plataformas dedicadas exclusivamente a anime e mangá:
A ausência destes sites nas listas de bloqueio portuguesas sugere uma lacuna significativa na estratégia anti-pirataria nacional. Várias razões podem explicar esta situação:
1. Foco em Conteúdo Mainstream
As medidas de bloqueio têm-se concentrado tradicionalmente em filmes e séries ocidentais, deixando o conteúdo asiático numa zona cinzenta de enforcement.
2. Complexidade dos Direitos Autorais
O mercado de anime e mangá apresenta estruturas de licenciamento mais complexas, com múltiplos detentores de direitos em diferentes territórios.
3. Menor Pressão da Indústria
Comparativamente com Hollywood, a indústria japonesa de entretenimento tem exercido menos pressão sobre as autoridades portuguesas.
O Fenómeno Tugaflix: O Jogo do Gato e do Rato
Um exemplo paradigmático desta situação é o Tugaflix, que há uma década joga o “jogo do gato e do rato” com as autoridades portuguesas. Apesar de estar consistentemente bloqueado, continua a aparecer entre os sites mais visitados através de novos domínios.
Portugal encontra-se numa encruzilhada interessante: possui um dos sistemas anti-pirataria mais desenvolvidos da Europa, mas continua a ser um dos países com maior consumo de conteúdo pirata.