Desde o lançamento de jogos da Sony Interactive Entertainment no PC que nos questionámos qual seria o primeiro título a tirar total partido deste poderoso novo hardware. Desde o controverso lançamento de Horizon: Zero Dawn no “longínquo” ano de 2018 que obtivemos alguns vislumbres do detalhe e requinte que um jogo da PlayStation poderia atingir num sistema tecnicamente mais poderoso. God of War (2018), The Last of Us Parte I, Marvel’s Spider-Man Remastered e Marvel’s Spider-Man Miles Morales (estes últimos ambos da Insomniac Games), foram alguns dos jogos que durante 5 anos encontraram uma nova casa, contudo, tudo leva a crer que Ratchet & Clank: Uma Dimensão à Parte seja o primeiro jogo que vai demonstrar o poder da nova geração de jogos da PlayStation no PC.

À semelhança da coletânea Uncharted: Coleção Legado dos Ladrões, uma das perguntas mais pertinentes que os jogadores vão fazer é a seguinte: “será necessário jogar as aventuras anteriores para ficarem a par dos desenvolvimentos desta?” Felizmente e ao contrário das expedições de Nathan Drake, Ratchet & Clank é uma série de jogos de cariz familiar sem grandes desenvolvimentos, basicamente apenas precisamos saber que Ratchet e Clank são grandes amigos e não fazem nada de… digamos, heroico há imenso tempo, mais precisamente desde que destruíram os planos do Dr. Nefarius pela enésima vez. Adorei como o jogo metaforicamente critica a indústria no que diz respeito às grandes aventuras 3D de ação e plataformas que foram abundantes na era onde os jogos de Ratchet & Clank receberam lançamentos, e atualmente parece que todos os heróis desta época continuam no desemprego.

Outra crítica muito divertida é o facto de os jogos já não estarem acompanhados por um manual de instruções, a piada implícita que temos do Dr. Nefarius num certo segmento foi muito bem inserida. No geral creio que de uma forma inteligente a Insomniac Games e a Sony Interactive Entertainment conseguiram apresentar o jogo para uma nova geração de jogadores sem a intimidar, convenhamos a série conta com mais de 10 jogos principais e diversos spin-offs espalhados entre gerações e sistemas, e o jogo abre com um tutorial que resume de uma forma muito inteligente o passado da dupla de heróis enquanto serve a sua gameplay base gradualmente. Julgo que a história atinge o seu auge quando se situa nos piores momentos das personagens. Nestes, temos momentos muito terra a terra, emotivos e revelam o quanto somos importantes para o mundo de outra pessoa.

Mas melodramáticas à parte, o Dr. Nefarius está também de regresso para retirar o duo dinâmico do desemprego quando durante um festival se apodera de um dispositivo especial que supostamente seria um presente de Clank para Ratchet, o Dimensioner, um engenho que permite viajar instantaneamente para qualquer parte do universo, infelizmente este acaba por ficar descontrolado fazendo com que as dimensões se sobreponham e o universo de Ratchet se misture com um universo paralelo, no qual Nefarius venceu e governa o mundo como imperador. Não podemos permitir que tal coisa aconteça, por isso vamos ajudar os nossos heróis a saltar entre dimensões para restaurar a ordem universal… e, no processo, procurar o rasto dos restantes Lombaxes espalhados pela galáxia. Mas e se o Dr. Nefarius continuar como imperador, o que é que vai acontecer ao Ratchet? Bem, o nosso herói vai tornar-se numa heroína chamada Rivet que é a versão de Ratchet na dimensão separada. Esta Lombax mantém as mesmas características do nosso herói, mas possui uma personalidade e modo de agir bem diferente.

No papel de Ratchet ou Rivet, vamos visitar 9 planetas em todas as duas dimensões praticamente em simultâneo. Quando pensava que o jogo não me podia surpreender mais, eis que o fazia, cada vez que entrava num novo nível não podia deixar de ficar indiferente à sua escala e detalhes. Cidades futuristas, desertos e selvas, além de serem locais bem variados são perfeitos para desfrutar de uma gameplay clássica de plataformas e ação, e este é um jogo que consegue um equilíbrio tremendo entre os dois. Isto porque as áreas de plataformas beneficiam de gadgets, tais como botas magnéticas, que nos permitem aderir a superfícies metálicas ou correr ao longo das paredes e acreditem os lombaxes possuem um bom catálogo de gadgets e armas bem mais vasto e variado que muitos shooters no mercado.

O jogo é praticamente um filme CGI moderno interativo

As dezenas de armas que Ratchet e Rivet utilizam são um misto de imaginação e estratégia. Podemos utilizar a podadora para transformar os nossos inimigos em plantas e imobilizá-los durante alguns segundos, transformar os nossos adversários em sprites de 8 bits, lançar bombas em arco (que são perfeitas para conquistar inimigos atrás de barreiras) e cercar os nossos adversários com cogumelos tóxicos ou optar por armas mais precisas, como a pistola explosiva ou o acelerador negatrónico. Cada uma das armas utiliza de forma brilhante os gatilhos adaptativos do comando DualSense, um elemento que sempre quis experimentar desde que o jogo recebeu lançamento em 2021 na PlayStation 5.

Ao empunhar a punisher (uma caçadeira), ao premirmos o gatilho até ao meio a arma dispara apenas de um cano, no entanto se premirmos o gatilho até ao fim a caçadeira esvazia completamente ambos os canos. O mesmo acontece com outras armas tais como o repulsor de vácuo. Enquanto a meia pressão ativa um escudo, a pressão total dispara os estilhaços que recolhemos do mesmo. Se pensávamos que Returnal utilizava os gatilhos hápticos de uma forma inteligente e inovadora esperem até empunharem este arsenal no vosso DualSense através de um cabo USB-C ligado a uma das portas USB C do vosso PC claro está.

Mas nem só de modernidade vive esta grande aventura, de regresso estão outros elementos de gameplay tais como o deslizamento sobre carris, contudo, como estamos a falar de um dispositivo mais poderoso que uma PlayStation 3 desta vez estes momentos frenéticos são acompanhadas de explosões, ataques aéreos, dinossauros, dragões, robôs gigantes… enfim tudo em Ratchet & Clank: Uma Dimensão à Parte é muito mais quantitativo e qualitativo, as sequencias de plataformas também são muito mais variadas, e todos estes elementos são pincelados com um toque cinematográfico, por vezes até dei por mim a pensar que estava perante um filme animado interativo em CGI, tal era a qualidade dos cenários, expressões faciais e de outros elementos visuais incríveis, complementados por um bom som envolvente, uma dobragem muito bem trabalhada – bastante engraçada- e uma excelente banda sonora composta por Mark Mothersbaugh (Thor Ragnarok, Crash Bandicoot e Jak & Daxter).

Encontra os 23 cobiçados parafusos dourados em cada um dos 9 planetas

Para além de níveis ao bom e clássico estilo da série, o seu level design permite executarmos missões secundárias e recolhermos colecionáveis para melhorar o arsenal dos lombaxes, por isso preparem-se para a explorar cada canto e recanto dos planetas nesta aventura breve, porém intensa. No entanto, a equipa da Insomniac Games também decidiu incluir pequenos segmentos onde controlamos Clank ou outras personagens aos comandos do glitch, um tanque-aranha capaz de escalar paredes e tetos para resolver alguns puzzles.

Escalar e atravessar é outro elemento em Ratchet and Clank: Uma Dimensão à Parte, isto porque o jogo introduz os tão badalados saltos interdimensionais. Podemos tirar partido das brechas que se abriram no universo de diferentes formas. A primeira e a mais simples, é deslocarmo-nos entre zonas próximas do mesmo nível… ou melhor, fazer com que o Ratchet ou Rivet se desloquem entre as mesmas como se estivessem a ser teletransportados para uma área no cenário. Mais impressionantes -do ponto de vista técnico- são os bolsos dimensionais, estas são pequenas áreas de plataformas que se abrem em cantos onde a realidade parece fragmentada. Cada bolso funciona como um puzzle de plataformas, que pode ser ultrapassado ao dominar habilidades como o wallrun, o grappling hook e o double jump, ao conquistarmos estes podemos obter incríveis peças para a armadura por isso o vosso esforço certamente será recompensado.

Ratchet vai encontrar versões alternativas dos seus amigos nesta dimensão

Certos níveis também mudam completamente sempre que atingimos um cristal que nos permite chegar a áreas que estão bloqueadas numa dimensão, mas acessíveis na outra. No entanto o melhor elemento neste quesito são certamente as viagens contínuas entre dimensões e planetas que infelizmente não abundam, mas podem crer que são incríveis cada vez que acontecem e vão precisar de pelo menos um disco SSD para as desfrutarem continuamente, no entanto deixo a recomendação de uma unidade NVME, escusado será dizer, esqueçam os discos mecânicos tradicionais ou vão ter carregamentos muitíssimo demorados e frequentes mas que não impossibilitam esta aventura de ser desfrutada.

É realmente fantástico como numa build composta por um processador AMD Ryzen 9 5950X, placa gráfica NVIDIA GeForce RTX 4090 MSI Suprim X e 64 GB RAM a 3600 MHz, o jogo nunca oscilou dos 120 fotogramas por segundo em resoluções 4K com todos os elementos visuais ligados no máximo dos máximos. Quer fosse nas sequências cinematográficas, momentos explosivos de gameplay ou travessias entre planetas nunca assisti a um engasgo ou outra incoerência técnica. Estamos perante outra grande port da Nixxes Software por isso esperem uma panóplia de opções visuais muito pouco próprias em jogos de PC. Além de 5 presets que oscilam do muito baixo ao ultra, podemos modificar a resolução, qualidade e filtragem das texturas, qualidade das sombras, profundidade de campo, níveis de detalhes gráficos, densidade do tráfego, qualidade do cabelo, reflexos do espaço do ecrã, qualidade das partículas, campo de visão, intensidade do motion blur e grão (as únicas opções visuais que desliguei) e nitidez. Como estamos na presença de uma port de PlayStation 5 para o PC, era de esperar encontrar suporte ao ray tracing. Esta é sem dúvida uma das implementações mais impressionantes desta tecnologia até a data, isto porque com o HDR ligado a 1500 nits e reflexos, sombras e oclusão ambiental por ray tracing este é um dos jogos visualmente mais impressionantes que vi até à data e fica muito, mas mesmo muito próximo de um citado filme animado em CGI moderno. Claro que este requinte técnico e visual apenas pôde ser alcançado através da tecnologia NVIDIA DLSS 3.0, que como sabem gera fotogramas adicionais intermédios sem perdas de qualidade e aumento de latências, isto claro com o recurso de outra tecnologia a NVIDIA Reflex. O jogo dispõe de outras tecnologias de upscalling temporal tais como o ITGI, Intel XeSS e AMD FR 2.1, contudo, de momento o suporte de ray tracing apenas está disponível nas placas gráficas NVIDIA RTX.

O jogo conta com dezenas de opções gráficas

Contudo, quando passámos para os dispositivos móveis, ou seja, Steam Deck e ROG Ally, naturalmente que tivemos de sacrificar esta incrível fidelidade visual para manter a sua portabilidade. Como Ratchet and Clank: Uma Dimensão à Parte recebeu a certificação que é jogável na Steam Deck no mesmo dia do seu lançamento perguntei a mim mesmo se era mesmo exequível na incrível máquina da Valve, e a resposta é sim… com alguns pequenos contratempos. Embora naturalmente não apresente a mesma nitidez e definição da build descrita acima é perfeitamente jogável com as definições predefinidas fornecidas pela Valve entre a 30 a 40 fotogramas definidos na taxa de fotogramas do aparelho. A Nixxes Software provou, mais uma vez, que é fantástica quando se trata de portar e otimizar os seus jogos. Contudo, o que mais me chamou a atenção foi a versatilidade do jogo graças ao AMD FSR 2.1 e ao aumento dinâmico da resolução. O jogo não apresenta diferenças visuais significativas entre os presets “Very Low” e “Low” devido ao tamanho e resolução da portátil da Valve, quando passei para o preset médio senti o jogo menos fluido e mais pesado, por isso para desfrutarem da aventura a 30 fotogramas por segundo na Steam Deck o mais recomendável é simplesmente escolherem o preset “Very Low” ativarem a AMD FSR 2.1 e manterem o jogo a 30 fotogramas por segundo. Quando às tão badaladas travessias entre planetas apenas notei que as personagens ficavam a pairar uns breves segundos no ar, o SSD NVME de 512GB da Steam Deck e o próprio aparelho estiveram à altura de mais um duro desafio.

Quando passei o jogo para a sua concorrente mais direta, ou seja, a ROG Ally deparei-me imediatamente com um dos meus maiores receios na máquina e um perfeito exemplo de uma comunidade unida por conquistar mais poder técnico. Ao executar o jogo pela primeira vez fiquei muito admirado por surgir uma mensagem de erro que indicava que o driver da GPU da AMD está desatualizado e para garantir a melhor experiência possível era necessário atualizar o mesmo, o problema é que mesmo passados quase dois meses a AMD e a ASUS não lançaram drivers atualizados para o aparelho, como relatei neste artigo esta é uma das minhas maiores preocupações com a ROG Ally, o suporte. Mesmo com este inconveniente consegui executar o jogo em 1080p e tentei encontrar um preset funcional com o aumento da resolução. Infelizmente, mesmo no modo Turbo -definido a 30w ou 25w personalizado- tive imensas dificuldades em manter uma taxa de fotogramas consistente. Nesta resolução a nitidez dos grafismos é muito superior à da Steam Deck, mesmo com a escala dinâmica de resolução ativada, mas as frequentes quebras entre 20 a 30 fotogramas por segundo, especialmente nas áreas mais congestionadas ou durante explosões levam-me a crer que estes problemas existem por estar a utilizar drivers desatualizados, se a AMD lançar novos drivers não tenho nenhumas dúvidas que o jogo vai ser muito melhor e mais agradável. Acredito que tudo passe pela atualização dos drivers porque este é de momento um dos raros exemplos onde um jogo necessita de 8GB dedicados de VRAM para ser executado devidamente. Caso não saibam podem modificar a alocação da VRAM na ROG Ally ao acederem à BIOS. Mantenham o botão de baixar volume enquanto ligam o aparelho para acederem ao menu da BIOS, depois naveguem até ao modo “Advanced” e escolham a opção “UMA FRAME BUFFER SIZE”, depois é só alocarem 8GB com o d-pad para baixo e gravarem as definições, desta forma o jogo não vai ter crashes aleatórios.

À semelhança dos anteriores jogos de PlayStation para o PC e consolas, Ratchet and Clank: Uma Dimensão à Parte possui suporte para 26 idiomas, entre os quais constam o português europeu e o português do Brasil totalmente localizados, e dezenas de opções de acessibilidade para que todos possam desfrutar desta montanha russa repleta de emoções fortes.

A chegada ao PC de Ratchet e Clank não podia ser da melhor forma. Não só estamos perante o jogo mais belo da PlayStation para o PC como um dos mais belos para qualquer sistema. A quantidade de elementos no ecrã, os efeitos em tempo real, as mudanças de dimensão e as expressões faciais… deixaram-me boquiaberto vezes sem conta. A Insomniac Games já lançou diversas aventuras do duo dinâmico intergaláctico ao longo dos anos, mas Rivet e outra personagem adicionaram um toque humano necessário à série. Ratchet and Clank: Uma Dimensão à Parte pode não ser a aventura com a maior duração do planeta, mas podem crer que é uma aventura com muito coração e muita alma. A Insomniac Games prometeu uma experiência semelhante a um filme CGI moderno, e sem nenhumas reservas confirmo que cumpriu a sua palavra.

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Marcio RogerioD
Marcio Rogerio
4 , Agosto , 2023 17:02

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