Não é surpresa nenhuma que desde as primeiras imagens de Stellar Blade (anunciado em 2019 como Project Eve) que a proposta do estúdio coreano Shift Up pensada para as consolas acabou por se tornar uma das obras mais desejadas dos fãs de ficção científica. As suas inspirações, expressamente retiradas de Nier: Automata e a aparência sensual de Eve tem dado muito que falar, e embora sejam aspetos a salientar, o que de facto atraiu a minha atenção foi a jogabilidade e a parte visual do jogo, mostrando ter um enorme potencial na sua execução.

Stellar Blade é uma das surpresas de 2024 da Shift Up e da Sony Interactive Entertainment, um jogo de ação e aventura ambientado num mundo distópico que vai estar disponível em exclusivo para a PlayStation 5 no dia 26 de abril.

Os primeiros instantes de Stellar Blade começam com uma enorme injeção de energia, introduzindo a história com uma impressionante cinemática vertiginosa, onde no meio de um conflito espacial vemos os membros do Esquadrão aéreo a serem enviados para a Terra com a finalidade de recuperar o planeta da invasão dos Naytiba. Neste planeta que se encontra abandonado após ter sido invadido por estas criaturas, a humanidade foi dizimada quase na sua totalidade e os restantes sobreviventes para se protegerem, decidiram refugiar-se numa colónia espacial. No entanto, depois de uma aterragem atribulada, Eve, a personagem que controlamos, juntamente com a comandante do seu esquadrão, veem-se envolvidas num duelo contra um perigoso Naytiba Alfa que deixa Tachy (comandante) às portas da morte ao tentar proteger a nossa protagonista. Entretanto, Eve, quase inconsciente, é salva por um sucateiro chamado Adam que a resolve acompanhar e apoiar durante a sua missão.

Lily, Eve e Adam

Embora esta narrativa de guerra e invasão extraterrestre apresentada em Stellar Blade não seja totalmente original, consegue ser muito mais do que descrevo no parágrafo acima. Sem querer dar spoilers, a Shift Up proporciona aos jogadores uma experiência emocionante que vai ganhando novas proporções com a descoberta do mundo e dos enredos que o rodeiam. O ambiente pós-apocalíptico é sentido visualmente mas também a partir dos restantes sobreviventes que o habitam, das experiências e histórias que cada um tem para relatar. Os costumes e formas de pensar das máquinas e humanos deste mundo assemelham-se ao nosso mundo real, levando-nos ao encontro de temas como a morte, esperança, fanatismo religioso ou a teorias acerca de um falso deus e profeta.

As próprias personagens que nos acompanham, são credíveis e humanas, especialmente a nossa Eve, que vai vivenciando emoções às quais não estava habituada na colónia espacial onde vivia. Desde o princípio que notamos que ela quer saber mais pormenores sobre a civilização antiga daquele planeta e isso vai sendo estimulado durante pequenas conversas entre Adam e a futura companheira Lily (membro do esquadrão de engenharia), assim como através de memórias e documentos que encontramos nas áreas por onde passamos. São estes detalhes e os pequenos enredos que atribuem mais valor ao enredo, e que fazem Stellar Blade ir para além de somente um jogo de ação.

Wasteland

Para quem me conhece, sabe o quanto aprecio um level design composto e recompensante. Felizmente encontrei isso durante a exploração de Stellar Blade. Conforme avançamos, o mundo vai-se tornando cada vez mais rico e diverso, dividindo-se em áreas lineares e semi-abertas que contêm zonas de cidades em ruínas, desertos, locais subterrâneos, e outras localizações. Tanto as áreas lineares como as semi-abertas que vão surgindo à medida que a história avança, apresentam uma boa variedade de criaturas, segredos, tesouros e missões secundárias. A isto, junto os pequenos quebra-cabeças e a própria navegação pelos cenários que fazem com que a jogabilidade seja diversificada e estimulante com bastantes surpresas.

Nos acampamentos espalhados pelo mundo, podemos repousar, comprar itens, melhorar as habilidades e equipamentos, usar a cabine telefónica para teletransportar para outros locais e ainda contemplar a música de um leitor de vinil.

Temos muito para investigar nestes ambientes distópicos e futuristas de Stellar Blade, particularmente em áreas mais abertas, e graças ao sonar do nosso companheiro drone nunca nos sentimos perdidos, já que sempre que o ativamos indica a localização de elementos no mapa (recursos, baús, corpos) que estão à nossa volta.

Deu imenso prazer usufruir da espetacular mobilidade da nossa protagonista em exploração, ao mesmo tempo que também pudemos por em prática as nossas habilidades contra os Naytiba. Porém, a estrutura da jogabilidade muda em alguns eventos principais, parecendo que somos levados para o interior de um shooter de terror com um ambiente denso e cheio de perigos. Estas situações apresentam-se de forma refrescante, além de que são muito bem inseridas entre os instantes de maior tensão sem quebrar o ritmo do jogo.

Xion, o hub do jogo

Ainda temos acesso a uma cidade chamada Xion, a última cidade habitada da terra que serve de hub, onde encontramos a maior parte das tarefas secundárias, lojas, vendedores, locais de descanso e de atualização das armas, bem como outras atividades.

Ao longo do jogo vamos colecionando latas de bebidas que desbloqueiam recompensas únicas.

Falando um pouco das missões secundárias, estas podem divergir de simples tarefas de rastrear um item ou derrotar inimigos específicos, até missões mais complexas que envolvem investigação, interação com personagens ou encontros contra chefes, que são fundamentais para obter recompensas adicionais, como recursos, fatos ou até pontos de experiência. No entanto, para além de nos incentivar a explorar o mundo do jogo, o que realmente fica são os segredos e histórias que descobrimos. São missões que nos convidam a refletir sobre os acontecimentos que vivenciamos, adicionando profundidade à narrativa.

Combate eletrizante

Ao lado de uma história e exploração fascinante temos um sistema de combate eletrizante, e ao mesmo tempo metódico, que vai ganhando complexidade consoante a evolução da nossa jovem guerreira. Resumidamente, estamos perante uma boa evolução do que vimos em Sekiro e Nier: Automata, com ênfase na agilidade, defesa e esquiva, o que nos exige atenção ao aproximar dos inimigos, estudando os seus padrões de ataque e defesa para fazer o contra-ataque em segurança.

Eve em batalha contra um Naytiba Elite

Em luta a nossa protagonista tem à disposição múltiplos tipos de combos, aos quais vão sendo adicionadas habilidades especiais que necessitam de uma energia específica para serem utilizadas. Por exemplo, as habilidades Beta necessitam da energia Beta que é recarregada quando infligimos dano aos inimigos ou numa esquiva ou bloqueio perfeito. Ao longo do jogo também podemos adaptar o nosso estilo de combate ao padrão das criaturas que encontramos, a partir da Exocoluna e do equipamento de Eve. Existe variedade, desde engenhos que atribuem melhorias ao combate corpo a corpo, à defesa, menor consumo de energia beta e mais.

Para melhorar a barra de saúde e de energia beta precisamos de absorver a energia dos membros dos esquadrões que descobrimos perdidos nas áreas do jogo.

Temos de estar atentos aos ataques especiais dos inimigos sinalizados por uma luz que requerem muita da nossa perícia para os evitar, permitindo realizar um desvio perfeito ou teletransportar Eve para trás das costas do oponente para um contra-ataque. Por outro lado, alguns dos Naytiba além de também disporem de um escudo, ainda dispõem de um medidor que indica o seu equilíbrio que pode ser reduzido se concretizarmos bloqueios perfeitos ou quando os atingimos com habilidades especiais. Quando os inimigos ficam completamente desequilibrados mantêm-se por um tempo vulneráveis a um ataque crítico que retira uma boa parte da sua vida. Há aqui um factor de risco e recompensa que torna as lutas incrivelmente satisfatórias, principalmente quando começamos a dominar todas as nuances do sistema de combate.

Os maiores desafios de Stellar Blade são sentidos durante as lutas contra os chefes, solicitando sempre mais das nossas capacidades e de um foco redobrado sobre os seus ataques devastadores, resultando em excelentes confrontos repletos de ação frenética. Ainda assim, nem todos foram marcantes, talvez por ter dedicado parte do meu tempo à exploração, acabando por ganhar mais experiência e desta forma apostando no fortalecimento das habilidades.

Uma das belíssimas cinemáticas do jogo

Inicialmente, o lado visual de Stellar Blade deixou-me um pouco na dúvida, é um jogo que numa primeira impressão nos deslumbra com as suas sequências de história e cenários lindíssimos que nos transportam para um universo pós-apocalíptico cibernético muito apelativo, os detalhes estão à vista, desde o design original dos Naytiba, aos cenários amplos que apresentam um cuidado redobrado na criação da sua atmosfera, até aos efeitos visuais durante os combates, tudo em conjunto funciona em perfeita harmonia. Todavia, fica a sensação que em cenários mais escuros, como acontece em especial durante o início da aventura, existe pouca saturação o que resulta na perda de definição dos elementos e dos ambientes. Os próprios movimentos dos personagens não parecem naturais, tal como a sincronização labial que nem sempre está no seu melhor.

O jogo oferece três modos gráficos: O Performance Mode que dá prioridade aos 60 fps, o Balanced Mode que oscila entre os 50/60 fps em 4K e o Resolution Mode que aposta nos 30fps em 4K. Como o próprio diretor aconselhou, o Balanced Mode é o mais adequado para os jogadores que procuram uma experiência rica e equilibrada que não sacrifique a fluidez durante os combates e a componente visual do jogo.

Visualmente ambicioso

Por fim, temos a música de Stellar Blade que ainda hoje ecoa na minha mente. É uma banda sonora única e diversificada que se adapta profundamente aos eventos que vamos experienciando em jogo. As vozes em inglês dos personagens também estão muito bem conseguidas. Além disso, como a Sony nos habitou, temos disponível legendas em Português e em Português do Brasil.

Com Stellar Blade, a Shift Up prova que os estúdios coreanos estão prontos para sair da sua área de conforto e criar experiências memoráveis para as consolas. É um jogo visualmente ambicioso que entrega uma narrativa interessante e um sistema de combate dinâmico e gratificante de controlar. O exclusivo PlayStation 5 será com certeza um sucesso, tornando-se certamente uma jornada obrigatória para os apreciadores de um excelente jogo de ação e de ficção científica.

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