Desde muito cedo que o panorama da indústria dos videojogos se divide em dois grandes territórios, os jogos ocidentais produzidos em terreno norte-americano, e os japoneses desenvolvidos no Japão. Contudo, no início da década de 90 assistimos também a um crescente novo império, os jogos europeus. Em diversas instâncias estúdios europeus conseguiram produzir verdadeiros ícones e séries, tais como Tomb Raider e Horizon.

Este movimento também fez com que muitas “softwarehouses” se lançassem no mercado, produzindo um sem fim de obras “indies” de diversas magnitudes, níveis, escalões e territórios. Seria impensável que territórios como Portugal, Brasil, e outros mercados menores conseguissem equiparar-se ou até ultrapassar verdadeiros magnatas de presença e vendas. Nesta senda de acontecimentos a Sunwolf Entertainment e a Fireshine Games decidiram lançar no mercado um jogo situado num novo inexplorado território, conhecido como Peru. As premissas deste seu primeiro projeto também seriam muito diferentes do habitual, pois além honrar as suas raízes, o jogo também tem como meta introduzir os jogadores à cultura nazca, que foi muitas vezes é referida, mas nunca foi devidamente explorada desde a série franco-japonesa As Misteriosas Cidades de Ouro. Ardentes de paixão e de lança na mão vamos descobrir se este exigente projeto vai brilhar como um sol de verão, ou ficar eclipsado pelas inúmeras obras semelhantes que partilha no seu céu.

O jogo narra a história de Nin, um ser criado com os últimos suspiros do sol que desce até à Terra para devolver a luz e o equilíbrio ao nosso planeta. Isto porque o poder solar foi roubado pelos Quatro Guardiões, o que consequentemente levou a um eclipse sem fim. Ao chegar à superfície terrestre o nosso herói flamejante descobre que cada um destes seres governa uma parte diferente do reino de um vasto império. Embora jovem e inexperiente, Nin é corajoso, determinado e nos seus dedos a humanidade e o sol depositaram todas as suas esperanças. Nin, sem ter consciência do seu destino parte para combater cada um destes guardiões enquanto tenta também descobrir mais sobre si mesmo.

O jogador conta com um elenco bem carismático para ajudar a devolver ao mundo a luz solar

A história começa e acaba de uma forma leviana, sem sair muito dos seus moldes iniciais. Contudo, o seu cartão de visita passa por outros departamentos que lhe conferem uma dimensão própria dentro do seu espaço. Indiscutivelmente os maiores destaques de Imp of the Sun são os seus ambientes e a sua direção artística. Todos os cenários desenhados à mão foram elaborados tendo um especial cuidado para representar as civilizações e culturas peruanas. Aliás, é bem notório que a produção da Sunwolf demonstrou um especial cuidado nesta temática, pois quando um cenário apresenta novos efeitos a câmara carinhosamente se afasta para podermos conferir os detalhes mais requintados dos seus belos cenários.

No submundo o jogador terá que desbravar caminho pela luz

Ao sabor do cada vez mais popular subgénero “metroidvania”, o jogo é todo interligado, obrigando o jogador a retroceder a novas áreas quando adquire novas habilidades e abre novas passagens solucionando pequenos quebra-cabeças que exemplarmente usam o “level design” da aérea correspondente. Contudo, não fomos incapazes de sentir uma certa monotonia em alguns momentos, dado que a exploração recrutou imensos efeitos e elementos que vivemos anteriormente na aventura, além de uma instável curva de aprendizagem que de início é brutalmente difícil, mas com a aquisição de novos elementos se torna muitíssimo mais fácil. Devido à sua estética Imp of the Sun é facilmente comparado à majestosa duologia Ori. Além do seu expressivo aspeto visual, a sua jogabilidade também partilha elementos semelhantes. Tal como em Ori, o jogador adquire novas habilidades à medida que explora e conquista os cenários. Nin, também adquire novas habilidades que não só lhe garantem a possibilidade de explorar novas áreas como melhoram a jogabilidade e a experiência final do jogador.

Embora Imp of the Sun seja um jogo 2D em certos ambientes a sua estética muda

Devido ao diminuto tempo desta aventura, o jogo torna-se em especial aliciante para os fãs de “speedruns”. Dash aéreo, Duplo Salto, escalar paredes (ao estilo de Megaman X) são elementos muito característicos neste panorama de jogos, que também contribuíram para tornar os movimentos do nosso diabrete mais fluidos e agradáveis, realmente foi um deleite percorrer grandes distâncias sem cessar tempo e movimentos. Por diversos momentos demos por nós a replicar os infernais momentos “Jump, Jump, Slide, Slide” de Megaman 8. Infelizmente o movimento do nosso herói podia ser melhor, para começar não existem mecânicas de desvio, Nin apenas pode afastar-se dos ataques, e em seguida o nosso amigo mesmo sendo uma criatura de fogo, tem a tendência a deslizar nos cenários. Neste género de jogos o controlo da personagem é crucial e devido a este pequeno senão a nossa aventura tornou-se muito mais frustrante, até porque cair em lagos é morte certa, nem mesmo o dash ou duplo salto nos salvam da extinção da nossa chama.

A água em Imp of the Sun é mortal!

Este elemento pode alcançar níveis ainda mais frustrantes para alguns jogadores, visto que inicialmente as quatro arenas podem ser acedidas e diversos inimigos com enormes quantidades de vida nos aguardam. Além das habilidades que referimos nesta análise, o nosso protagonista também está equipado com uma pequena lança. O termo “pequena” faz jus ao nome, dado que a arma tem um alcance muito, muito limitado, e como se não bastasse algumas “hitboxes” são bastantes duvidosas. Em suma, é um sentimento difícil de expressar por palavras, pois não sentimos simbiose entre o movimento da personagem e as suas limitadas ações de combate. Como não podia deixar de ser estes elementos foram muito mais sentidos nos confrontos contra os requintados bosses. Cada um representa uma das quatro principais áreas do jogo. Embora alguns sejam intimidantes e a sua apresentação visual seja absolutamente deslumbrante, a sua dificuldade é bem variável. Tal como seria de esperar todos apresentam padrões de ataque, porém as suas mecânicas nem sempre foram as mais interessantes, principalmente quando temos de executar a mesma ação para nos aproximarmos e golpear. Inicialmente -principalmente no boss que governa o deserto- vamos morrer, morrer… e morrer, visto que a nossa chama ainda é muito pequena e precisamos desenvolver a nossa memória motora e visual aos padrões da criatura. Estes acontecimentos mais uma vez resgatam os elementos das séries “Eldersoulsborne” que parecem cada vez mais ser um elemento obrigatório nos “metroidvanias” “roguelikes” e “roguelites”. No entanto, um elemento que o separa deste cômputo, é a sua própria abordagem de “metroidvania”. Ao contrário de muitos não é tão labiríntico, sendo muito mais linear e a sua abordagem de escolha de “níveis” recai bastante pelos jogos Megaman, e similares.

Tui, o líder dos desertos atua como um tutorial

Ao derrotar cada inimigo o nosso diabrete adquire fragmentos de sol, sendo parcialmente perdidos cada vez que se extingue. Ainda relativamente a estas séries somos apresentados a uma “morte” que atua de forma semelhante às fogueiras da série Souls, além de nos permitir viajar, descansar ou subir de nível com os fragmentos obtidos. Todavia, o jogador recebe outras motivações para conquistar os Quatro Guardiões. Após a derrota de cada, contará um pouco sobre a sua história, e as suas raízes culturais. Este é um jogo que é literalmente um testemunho vivo da cultura do Peru. Cada localização, cada cenário, cada confronto com os bosses e as suas revelações atuam como autênticos pedaços de história. Como se não fosse bastante, com a recolha de itens colecionáveis baseados em artefatos antigos reais, intitulados de “quipus”, podemos mergulhar ainda mais fundo e descobrir mais acerca de cada um destes, e da sua história quando são entregues à personagem, Izhi.

Imp of the Sun, não esconde, nem nega a sua herança cultural em nenhuma das suas áreas, sendo que a sua sonoplastia também bebe da água do mesmo rio. A produção do jogo resgatou dos seus museus, instrumentos milenares da cultura peruana para compor a sua brilhante banda sonora. Além de melodias nunca antes ouvidas, as mesmos são acompanhadas por uma orquestra ao vivo que a transporta para uma dimensão realmente épica nos confrontos mais arrojados. Este é sem sombra de dúvidas um dos melhores registos de Imp of Sun, e um fator que o diferencia de tantas outras gotas num oceano.
Outro elemento fantástico, são as suas animações. Além de cenários majestosos recriados à mão atendendo à cultura por detrás deste título as animações que neles habitam são deslumbrantes. Quer a nossa chama antropoformica -com elementos de Son Goku-  como todos os aliados e antagonistas são portadores de um vasto número de animações incrivelmente fluidas, é deslumbrante assistir às mesmas em todo o seu esplendor. Infelizmente as mesmas podiam alcançar labaredas ainda mais intensas se não fosse o simples facto de a versão PC não ter quaisquer elementos gráficos básicos, resolução, fotogramas ou “V-sync”. Acreditamos que pelo menos estas áreas sejam obrigatórias para qualquer projeto, quer estejamos na presença de um jogo 2D ou um de elevado orçamento.

Imp of the Sun é uma aventura que é muito ciente dos seus pontos fortes. A Sunwolf Entertainment desde muito cedo indicou que produziria uma aventura assente nos seus valores, cultura e heranças. Estamos diante de um jogo que poderia alcançar voos mais altos se também estivesse ciente dos outros constituintes necessários quer para uma aventura deste género como para um produto no geral. Restam algumas arestas ainda por lapidar, e acreditamos que a produção, doravante não só se vai alimentar da chama de Imp of the Sun, como produzir mais projetos atendendo as suas raízes ao ponto até de transitar de ambientes. Isto porque mais-que-tudo Imp of the Sun consegue ser uma enciclopédia jogável, de facto seria interessante se este formato fosse utilizado para lecionar aulas de história nas escolas, sem dúvida que seria muito mais entusiasmante, lúdico e divertido.

Prós e Contras de Imp of the Sun:

+ Explora novos territórios e culturas
+ Perfeito para “speedruners”
+ Uma autentica enciclopédia digital da antiga cultura do Peru
+ Banda sonora deslumbrante
+ Animações fluidas e arte detalhada
+ Dificuldade elevada
– Jogo com pouca duração
– “Metroidvania” linear
– “Hitboxes” duvidosas
– Jogabilidade limitada e a precisar de melhorias
– Sem opções gráficas no PC
– História simplista
– Frustrante em alguns momentos pelas piores razões

Bruno Reis
Vindo de vários mundos e projetos, juntou-se à redação do Otakupt em 2020, pronto para informar todos os leitores com a sua experiência nas várias áreas da cultura alternativa. Assistiu de perto ao nascimento dos videojogos em Portugal até à sua atualidade, devora tudo o que seja japonês (menos a gastronomia), mas é também adepto de grandes histórias e personagens sejam essas produzidas em qualquer parte do globo terrestre.
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