Street Fighter II foi um dos jogos mais influentes da história, o mesmo não só contribuiu para estabelecer o género como ajudou a introduzir o termo “pop culture” no mundo e em cada era a série foi pioneira em de uma ou outra forma revitalizar a indústria. Na década de ’90 foi responsável por cimentar o seu género, que consequentemente também levou à criação de um número inacreditável de clones de outras empresas tais como os jogos The King of Fighters da SNK ou os Mortal Kombat produzidos pela Midway Games.

No início deste milénio conseguiu o feito de ressuscitar o género, isto porque as lutas virtuais desceram vertiginosamente a meados de 2000 em prol de jogos mais abrangentes como “sandboxes” e RPGs. Porém, Street Fighter IV demonstrou que ainda era fixe gritar “hadoken” mesmo num mercado com experiências cada vez mais cinematográficas. Uns anos mais tarde em 2016, e inicialmente envolto em polémica por apresentar conteúdos vazios, Street Fighter V levou os jogos de luta até aos maiores palcos mundiais ao cimentar o termo “eSports” no mundo. Em 2023 numa altura onde o género coexiste com tantos outros jogos a Capcom lançou Street Fighter 6, a tão aguardada sequela canónica de Street Fighter III: 3rd Strike.

Ao contrário do seu antecessor, a Capcom mostrou-se muito mais confiante desde o seu início ao não só revelar um sem fim de informações como através da disponibilização de diversas betas abertas e fechadas para todas as plataformas até ao lançamento do jogo. Desde muito cedo que senti que Street Fighter 6 seria um dos jogos de luta do ano, pois além de conservar a sua jogabilidade e honrar o seu legado de todas as formas possíveis e imaginárias também teve a ousadia de juntar todos os públicos no seu encalço, algo que durante anos e anos algumas produtoras tentaram replicar, mas sem sucesso.

Alguém me explica como esta mulher ainda está solteira?

É evidente que a Capcom desejava soltar o seu segundo impacto e lutar pelo futuro nos maiores palcos de eSports, dado que o jogo conserva o seu complexo sistema de combos e uma nova panóplia de novas mecânicas. É comum em cada jogo principal que Street Fighter adote uma nova mecânica base, por isso o V-Trigger de Street Fighter V deu lugar à Drive Bar, uma nova mecânica que se subdivide em diversos elementos imprescindíveis para caminharmos e sobrevivermos nas ruas. A Drive Bar possui um total de 6 barras pequenas que se restabelecem automaticamente no desenrolar do combate. A troco destas Ryu e companhia podem disferir “EX attacks” (variantes de golpes especiais mais poderosos), realizar Parries (cancelar ataques na nossa direção), ou um poderoso golpe frontal intitulado “Drive Impact” que não só quebra as defesas como também dispara o adversário para um dos cantos do ringue. Se os dois “Drive Impacts” colidirem vence quem tiver mais prioridade ou for mais incisivo. Este elemento é um dos aspetos visualmente mais atrativos deste pacote de cores vibrantes.

Quem estiver atento ao parágrafo em cima, especialmente aos jogos Street Fighter anteriores, saberá que quer os “EX moves” como o “Parry” são mecânicas que originaram de Street Fighter EX (que tecnicamente não é um jogo da série) e Street Fighter III, respetivamente. Já a “Drive Impact” é uma versão alternativa do “Focus Attack” de Street Fighter IV. Este é dos muitos pontos em que Street Fighter 6 honra o seu legado. A Drive Bar engloba todas as mecânicas chave de cada um dos jogos anteriores, ou seja, no seu sistema de jogo inclui um historial de mais de 10 títulos que receberam lançamentos durante as últimas décadas.

Contudo, Street Fighter 6 também apresenta uma novidade no seu sistema de jogo, a “Drive Rush”. O jogo não explica muito bem a sua execução, mas basicamente é executarmos um Parry ou um ataque especial enquanto carregamos duas vezes para a frente rapidamente. A troco de uma grande quantidade de Drive Bar, a nossa personagem vai rodear-se por uma estranha aura verde para possibilitar continuar um combo aparentemente terminado. Devido à semelhança com os juggles de Tekken, não me surpreenderia se esta mecânica estivesse planeada inicialmente para Tekken X Street Fighter, um jogo que infelizmente continua no limbo. Evidentemente que este sistema não é infalível. Se não dosearmos todos os recursos que a Drive Bar nos oferece vamos entrar num estado de Burnout. Neste a Drive Bar é lentamente restabelecida, contudo, não poderemos executar nenhum dos seus recursos até estar completa, o que nos pode deixar à mercê do adversário, especialmente porque não temos “Drive Impacts” ou “EX Moves” para ripostar. De resto tudo permanece igual como sempre. Um total de 3 Rounds por partida, barras de saúde, Super Arts e o imenso carisma de todos os lutadores. Contudo, é na jogabilidade que encontramos o primeiro grande denominador de Street Fighter 6.

A Drive Rush é vital para continuar um combo aparentemente terminado

Os diferentes ataques especiais e os movimentos únicos de cada lutador geralmente são fáceis de serem executados. No entanto, quanto mais jogarmos mais nos apercebemos que têm uma grande profundidade, e sem darmos conta ficamos imersos a um misto de entusiasmo e intimidação. A pensar nesses públicos e para não difamar qualquer demografia de Street Fighter, a produção do jogo estabeleceu três modos de controlo. Começamos pelo clássico, ou seja, o modo de toda a vida em Street Fighter, em que utilizamos um modo de seis botões para delimitar a força dos punhos e pernas, e cada movimento especial é executado à base de comandos. Enquanto uns são um quarto de círculo para a frente ou para trás, outros são uma volta completa (360.º) ou charge (que é manter pressionado trás e rapidamente fazer frente acompanhado por um botão de soco ou pontapé (consoante a personagem).

Durante anos temos assistido a diversas experiências para tentar casualizar estes complexos movimentos. Jogos como Dragon Ball FighterZ ou Guilty Gear -Strive- tentaram produzir estes efeitos como um botão de autocombos, que muito sinceramente acabaram por irritar o mercado competitivo. Julgo que a Capcom conseguiu o feito de respeitar a sua massa competitiva enquanto introduz o seu jogo a gerações modernas que estão habituadas a jogar Tekken e outros jogos de luta 3D. O modo de controlo Moderno permite utilizarmos um botão dedicado para movimentos especiais. Ao carregarmos no triangulo Ryu lança um hadoken, sem a necessidade de executar o tradicional comando de um quarto para a frente e soco. Para executarmos os “algumas vezes complicados” Shoryuken basta manter carregar para a frente e triângulo e “tatsumaki senpuu kyaku” basta carregar para trás e triangulo. O mesmo acontece com os EX moves, Super Combos, Super Arts e Critical Arts. Esta última é uma versão muito mais poderosa da Super Art de cada personagem que surge quando o lutador tem pouca saúde e está quase a perder o combate, o que se pode traduzir num último recurso para virar o combate a nosso favor.

Estes dois modos de controlo podem ser um tanto polémicos porque permitem que comandos sejam executados com uma maior fluidez e eficácia. Aqui posso também dar a minha opinião na matéria. Sinceramente a meu ver um bom jogador não deve ficar colado a este argumento, um World Warrior que se preze desse nome deve recorrer à sua astúcia. Jogos de luta não devem ser relegados a quem conhece ou consegue executar o maior número de comandos. A meu ver um bom jogador deve conhecer a sua personagem e a do adversário, utilizar os seus pontos fortes -tais como os infernais footsies de Chun Li, os neutrals de Zangief, ou as turtle tactics do Guile- analisar as distâncias e recorrer a movimentos e ações apenas quando o adversário permite. Em suma, um verdadeiro combate mental.

Adicionalmente a Capcom também foi muito astuta para delimitar as ferramentas que os jogadores do modo moderno têm ao seu dispor. Como apenas este modo possui um botão para movimentos, fracos, médios, fortes e especial, o seu rol de técnicas e combos ficaram muito comprometidos e não permitem que cada lutador possa explorar todo o seu potencial. É perfeitamente normal um jogador no modo de controlo moderno dar que fazer a um jogador no modo de controlo clássico e vice-versa,  penso que ambos podem coexistir e não vejo porque possam ser barrados em torneios oficiais, dado que cada possui pontos contra e a favor. No entanto, deixo a minha recomendação para utilizarem o modo moderno para escolherem e aprenderem mais sobre o vosso lutador, mas por favor não dependam apenas da sua acessibilidade. Sempre gostei do estilo de luta da Cammy, mas detesto charge characters, o modo de controlo moderno fez-me utilizar a personagem com a elegância e incisividade que desde cedo idealizava mas não conseguia replicar. Há pouco falei da existência de um terceiro modo e podem crer que não foi esquecido. O modo dinâmico permite que o vosso sobrinho de 6 anos se torne num guerreiro poderoso, porque dá a possibilidade de um botão executar um incrível número de combos. Este modo de controlo não está disponível nos modos online, já que julgo seria injusto.

Um Zangief “modernizado” é um autêntico pesadelo para qualquer um

Mas as novidades não se ficam apenas nos controlos, todos os lutadores também receberam um misto de novas técnicas e novos visuais. Sempre senti Street Fighter como aquela série que no que dizia respeito a visuais de lutadores era mais fácil de acompanhar do que os guarda roupas de outras séries como Tekken ou Dead or Alive. As únicas diferenças cosméticas eram essencialmente cores, apenas em Street Fighter IV, foram oferecidas algumas mudanças neste departamento. Contudo, em Street Fighter 6 é onde assistimos às maiores mudanças. Enquanto algumas são ligeiras como o Qi Pao da Chun Li, e calças do Zangief, outras como a Cammy de cabelo curto e o casaco londrino, ou o aspeto gasto do Ken representam mudanças dramáticas! De salientar que a Capcom neste ponto foi eximia porque estas mudanças refletem o desenvolvimento de cada personagem. Chun Li desistiu da sua vida de agente da Interpol e tornou-se uma mentora de Kung Fu para crianças. As suas pulseiras com picos foram modificadas por pulseiras normais porque a sua luta pela vingança do seu pai foi finalmente terminada. Ryu após dominar o Satsui no Hado e aceitar os seus efeitos tornou-se num discípulo de Oro. Este confere-lhe um cinto de ombros semelhante ao que usa, e Ryu novamente viaja pelo mundo à procura de aperfeiçoar a sua técnica.

Não sou capaz de ficar indiferente ao sentir que o lutador parece que terminou o seu jogo principal e agora anda a fazer as sidequests post-game. É realmente incrível como estas mudanças cosméticas também se traduzem nos movimentos das personagens. Cada uma tem pelo menos uma grande novidade. Ryu recebeu o Hashougeki, uma espécie de Hadoken corpo a corpo, Blanka utiliza uns bonecos elétricos, Ken recuperou o seu furioso combo de pontapés e Zangief adicionou um cartwheel e contra-ataques aos seus poderosos movimentos de Wrestling.

Contudo, estes registos são apenas na superfície porque ainda existem muitos elementos a descobrir e mesmo que os novos lutadores à partida não se equiparem aos clássicos com o decorrer do tempo vão conquistar-vos especialmente os punhos da Marisa, o infernal JP com as suas nefastas táticas de “zoner” e a hiperbólica Manon, que mais parece um tributo às antigas joke characters dos jogos de luta dos anos 90. Quem também vai conquistar-vos por inteiro são os seus incríveis três modos de jogo. Assim que entramos no menu principal de Street Fighter 6 somos apresentados a uma divisão muito clara de modos e demografias. Os três blocos são “World Tour”, “Battle Hub” e “Fighting Ground”. O termo “World Tour” não é de todo desconhecido pelos fãs de Street Fighter, dado que foi integrante num dos mais incríveis modos de jogo na série, ou seja, infelizmente apenas existiu em Street Fighter Alpha 3 nas versões para a PlayStation, SEGA Saturn, SEGA DREAMCAST e PlayStation Portable. O mesmo transformou o jogo de luta numa espécie de RPG onde a nossa personagem percorria o mundo e adquiria técnicas ao aumentar de nível. Mesmo com elementos de um RPG, não chegou a ser um jogo do género porque carecia do elemento base, uma narrativa, e é aqui que Street Fighter 6 com a sua versão do World Tour vista e revista entra em cena pronta para revolucionar por completo dos jogos de luta.

Este modo é diferente de tudo o que vimos num jogo de luta até ao momento. Devido a estar muito mais próximo de um RPG, tenho assistido a um elemento muito interessante, vários fãs do género compraram o jogo apenas devido a este modo. Tal como qualquer jogo do mesmo somos convidados a criar uma personagem. Mesmo estando perante de um jogo de luta na sua essência o editor de personagens e incrivelmente robusto. Não só podemos criar uma personagem masculina como feminina como personalizar todas as partes do seu corpo e idade, preparem-se para assistirem a muitas hilariantes aberrações online. Assim que terminamos a nossa criação, viajamos imediatamente até Metro City, a cidade onde a ação de Final Fight decorre. Por si só esta viagem é um tanto caricata, dado que este jogo era suposto ser o segundo Street Fighter (Street Fighter ’89), mas como os beat’ em ups invadiram os salões de arcadas o jogo evoluiu para um jogo deste género. Contudo, e quem conhece a série Street Fighter saberá que desde Street Fighter Alpha que estes dois mundos são um só. Pois bem, nesta Metro City moderna não estamos barrados a um corredor, podemos ir a todos os sítios, interagir com os seus habitantes e partir em missões. Pelo caminho vamos encontrar as carismáticas personagens do jogo que neste modo atuam como mestres e são parte integrante da história. Através desta descobrimos mais sobre os seus modos de vida, curiosidades na série e o que fizeram após a derrota da Shadaloo de M.Bison. A maioria está reformada das suas antigas lutas. Um dos segmentos mais interessantes e estranhamente hilariantes é o de Ryu. O nosso valoroso guerreiro está a tentar dominar uma nova e incrível técnica! Utilizar um telemóvel!! Até mesmo um guerreiro minimalista tem de se manter contatável especialmente quando o seu amigo de longa data deseja saber o seu paradeiro e como está. Também descobrimos que Ryu, é uma personagem bem abastecida. Com todos os prémios em dinheiro dos antigos torneios, o guerreiro Shotokan poderia viver sem constrangimentos. Contudo, com a ajuda do seu amigo Ken viaja com um cartão de crédito quase ilimitado para sobreviver minimamente. Já a bela Chun Li que inexplicavelmente ainda está solteira dedica-se a ensinar Kung Fu a uma nova geração.

O Ryu parece os nossos avôs a utilizar um telemóvel

O jogador pode encontrar muitos outros tais como Dhalsim, Zangief ou até Juri para estreitar amizades e adquirir novas técnicas. Estas depois podem ser equipadas na nossa personagem. Gradualmente sentimos que se torna num híbrido semelhante a Seth, o vilão da S.I.N de Street Fighter IV dado que podemos utilizar os hadokens de Ryu, os pontapés fulminantes da Chun Li e o “carrossel demoníaco” de Zangief. Contudo, para desbloquear as Super Arts de cada mestre é necessário que a sua compatibilidade atinja os 100%. Esta é uma tarefa dantesca porque além de exigir imenso tempo, também temos de derrotar inimigos com as técnicas de cada um e amealhar muitos zenny (moeda dos jogos da Capcom). Isto porque a melhor via para conquistar a amizade de cada um dos 16 mestres é oferecer presentes. Devido ao fluxo deste interessante modo não pude deixar de sentir que o mesmo é a melhor porta de entrada para o mundo de Street Fighter 6. Como algumas missões exigem a utilização de mecânicas complexas como a Drive Rush, ou minijogos onde teremos de executar técnicas simples para destruir filas de garrafas e blocos de cimento, o World Tour acaba por muito ao de leve atuar como um tutorial extenso que foi implementado de uma forma muito inteligente para oferecer as fundações base quando os jogadores decidirem que é o momento de enfrentarem novos adversários nos seguintes blocos de modos de jogo.

O Fighting Ground essencialmente engloba os modos de jogos mais clássicos dos jogos de luta num só local. Começamos pelo Arcade, que tal como o nome indica apresenta uma experiência de jogo clássica para um jogador. Contudo, perante o requinte de todo o pacote, julgo este modo de jogo existe simplesmente para apresentar as motivações e histórias de cada uma das 18 personagens. Infelizmente não assistimos a sequências cinematográficas, apenas presenciamos algumas ilustrações acompanhadas de vozes e texto, algo muito simples, mas igualmente funcional. O seguinte bloco é muitíssimo importante porque basicamente vai ser o vosso “laboratório”, é neste local através dos modos de treino, guia, tutorial e combo trials que vamos perder horas da nossa existência a treinar e desenvolver técnicas. De salientar que todos estes foram desenvolvidos quer a pensar nos jogadores veteranos com nos novatos. Existem um sem fim de opções técnicas como “frame data”, “frame priority”, até reencenar uma situação de luta para aprendermos como defender e contra-atacar.  Quer para os novatos como para os veteranos existem mais de 300 exercícios de combos para praticar e dominar.

Para fazer uma pausa o testarmos os nossos progressos a Capcom preparou no próximo bloco de modos um misto de diversas experiências. No modo versus podemos lutar em duelos contra o computador ou contra o nosso familiar ou amigo no outro lado do sofá. Infelizmente o divertido modo de torneio offline de Street Fighter V ficou de fora. Para juntar o publico mais casual e divertir, a empresa também preparou o modo “Extreme Fight”, este é formado por uma série de combates onde configuramos regras que têm tanto de aleatório como de bizarro. Combater com zonas eletrocutadas, entre manadas de touros ou destruir um enorme camião são apenas alguns dos divertidos combates em que vamos poder participar. De salientar que este último é uma alusão ao primeiro nível de bónus de Street Fighter II onde o nosso World Warrior tentava a todo o custo destruir um indefeso Toyota Lexus LS 400 antes que o tempo esgotasse. Estes modos de jogos são extremamente divertidos e vitais para unir o publico casual.

Não é à toa que Tekken 3 é um dos jogos mais recordados por introduzir mini jogos como o “Tekken Ball” ou o “Tekken Force” ao púbico casual para consequentemente se tornar numa porta de entrada ao mundo da competição. O último bloco de modos no “Fighting Ground” é o modo online que está intimamente ligado à Battle Hub. Este atua como unificador dos restantes modos e marca o fim e principio de uma longa viagem. Aqui vamos utilizar o mesmo avatar que críamos no World Tour -se desejamos poderemos criar outro- e viajamos para um salão arcade onde podemos constatar as bizarrices dos jogadores de todo mundo enquanto procuramos pela máquina arcade mais próxima. Este modo replica com precisão o sentimento que os fãs de longa data de Street Fighter viveram nas suas infâncias quando colocavam uma moeda de 50$ para jogar uma partida de Street Fighter II. Isto pois tal como alguns de nós, após o nosso avatar chegar a uma máquina de arcade virtual este também pode ser desafiado.

Aqui confesso que realmente gostava que os carregamentos entre combates fossem mais demorados. Quem está atento à minha atividade sabe que há alguns anos escrevi um artigo sobre a arte dos menus de carregamento estre combates. Street Fighter 6 retira apontamentos de um dos jogos que falei nesse artigo, Soul Calibur II, este jogo essencialmente evoluiu esse registo. Tal como o jogo da Namco antes de cada combate também surgem as caras dos jogadores. Contudo, em vez de um botão para fazer a nossa personagem falar, conseguimos fazer algo bem mais divertido e único. Ao recorremos aos botões direcionais do comando -ou teclado- a nossa personagem e a do nosso adversário atuam de acordo com várias emoções como, alegre, zangada, admirada, aborrecida e indiferente.

Street Fighter 6 oferece a oportunidade de colocarmos a nossa “gameface”

Senti que este elemento muitas das vezes marcou o começo do combate porque além de produzir dinâmicas bem divertidas também demonstrou de certa forma o estilo e transparência do adversário. Notei que adversários que adotaram emoções mais alegres são extremamente confiantes nas suas habilidades e que os adversários com expressões mais sérias recorreram quase sempre a um conjunto de técnicas nefastas, a voltinha de 360º do JP que o diga! De salientar que durante o duelo os jogadores não vão lutar com o seu avatar mas sim com a personagem de Street Fighter 6 que escolheram no menu “Profile”. No mesmo podemos ficar a par e passo do historial de cada uma das nossas personagens, isto porque Street Fighter 6 atua com cada personagem no singular. Por exemplo se o ranking do vosso Ryu for Gold, mas escolherem a Chun Li ou o Ken vão começar como rookie nessas personagens.

Se os World Warriors são demasiado sérios para o vosso gosto, podem lutar em batalhas de avatares no meio do ringue no salão. Estes combates podem ser extremamente desequilibrados porque colocam batalhas de avatares com todos os parâmetros e elementos que obtivemos no World Tour. Adicionalmente a assistir a duelos entre os outros jogadores, colocar música, e interagir com os outros jogadores seja pelo chat ou realizar os célebres movimentos especiais de cada personagem, também podemos participar em algo muito especial.

Preparem-se para um verdadeiro festival de aberrações online

Algumas máquinas de arcadas permitem que os jogadores desfrutem na integra de clássicos da Capcom, tais como Street Fighter II ou Final Fight. Este registo é importante porque além de apresentar o legado da empresa aos novos jogadores também faz com que os veteranos desfrutem e viajem para um tempo das suas vidas bem mais despreocupado. Realmente sinto muito potencial adormecido nestas máquinas de arcade virtuais, julgo que com o passar dos anos a Capcom vai introduzir jogos célebres ou obscuros tais com Street Fighter Alpha 3, Cadillacs and Dinossaurs ou Canon Spike. De referir que o legado da Capcom também se encontra em pequenos detalhes tais como um sprite 2D 8 bit de Megaman a saltar com uma máquina fotográfica. Como já se devem apercebido a Battle Hub foi criada para a comunidade online. A mesma promete ficar de pedra e cal durante muitos anos devido ao suporte cross-play, torneios periódicos, a um robusto código de rede rollback e a um suporte imaculado.

Quem também prometeu e entregou foi a Capcom no seu quesito técnico. O jogo é um verdadeiro festim para os olhos. Os cenários são ricos em detalhe e os modelos de personagens estão muitíssimo superiores aos do jogo anterior. As personagens de Street Fighter V, tentaram criar um misto entre o cartoonesco e o realismo, enquanto alguns personagens como Ryu ou Chun Li assentaram bem neste estilo, outros como Sakura ou Ken -e o seu cabelo de bananas- entraram no de estigma de “uncanny”. Street Fighter 6 foi uma evolução em todos os sentidos visuais, as personagens adotaram dimensões e recortes mais realistas ao abandonar por completo o design cartoonesco que adquiriram desde Street Fighter IV. Ao contrário do que esperava este efeito não fez as personagens perderem a sua essência, vou mais longe ao dizer que demonstraram um lado B de cada. A sensualidade de Chun Li continua presente na personagem, contudo, também sinto uma certa arrogância. O sempre sério Ryu provou que consegue sorrir, e o Zangief …bem o Wrestler russo deixou de ser cómico e tornou-se num monstro assustador, aquela cara e esfumar do nariz como um touro é um pesadelo para qualquer um, principalmente se vos agarrar! O resto dos efeitos visuais quer dos incríveis cenários como dos efeitos respiraram de carisma. Os grafitti de Kimberly ou o choque de Drive Impacts são um veredeiro festim para os nossos olhos!

A visão está intimamente ligada com a audição, os dois sentidos interligam-se e são indissociáveis e o mesmo podemos dizer de Street Fighter 6 que resgata os ritmos e batidas urbanas de rap que ficaram célebres em Street Fighter III. Quanto mais os ouvimos mais sentimos gradualmente que Street Fighter está novamente a tentar evadir-se da sua zona de conforto. Os tradicionais temas musicais que acompanham cada personagem desde Street Fighter II já não existem e no seu lugar temos muitas faixas com ritmos urbanos semelhantes às que ouvimos em Street Fighter III. Realmente Street Fighter 6 coloca o termo “Street” no audiovisual. Novamente o jogo conta com áudio em japonês e inglês com a possibilidade de mapear cada lutador num idioma ou outro. Não abdico da minha Miyuki Sawashiro Cammy, mas também não do comicamente estereotipado sotaque inglês (russo) de Zangief. Felizmente o jogo deu-me essa hipótese. Também nos dá a oportunidade de o desfrutarmos numa série de idiomas por texto, onde naturalmente consta o português do Brasil.

Quanto ao restante computo técnico, apenas vos posso dizer que estamos perante mais uma genial port da Capcom para o PC. Esta na minha opinião continua a ser a empresa nipónica que mais leva a sério o mercado nesta plataforma. O RE Engine não só garante visuais requintados como também um produto robusto e de qualidade. Sem surpresa o jogo pôde ser desfrutado no preset máximo na nossa build composta por um processador AMD Ryzen 9 5950X, placa gráfica NVIDIA GeForce RTX 4090 MSI Suprim X e 64 GB RAM a 3600 MHz a 60 fotogramas por segundo nas lutas e 70 a 110 fotogramas por segundo nos mapas do World Tour ou no salão da Battle Hub. De salientar que mesmo que coloquemos 120 fotogramas por segundo nas opções visuais o jogo vai estar sempre barrado a 60 fotogramas por segundo nos combates. Infelizmente a Steam Deck não consegue acompanhar este desempenho nas lutas de rua sem que se façam alguns ajustes. Recomendo ao invés de 1280×800 que coloquem 1280×720 (720p). A bateria terá uma maior autonomia se os fotogramas estiverem barrados a 30 fotogramas por segundo no menu do aparelho e o jogo manterá uma taxa fixa nos combates. É certo que o jogo pode pelo menos chegar aos 40 fotogramas por segundo com alguns ajustes simples nos gráficos, mas ao fazer isso notei que as personagens ficavam muito nubladas e que o jogo soluçava bastante durante as Critical Arts ou no inicio do combate quando as personagens interagiam uma com as outras.

Street Fighter 6 mais do que um jogo de luta é uma revolução dentro e fora do seu espectro por conseguir unir o publico casual e o competitivo sem comprometer ou fragmentar um e outro. Estamos na presença de quase 3 jogos num só. No entanto, conseguiu o feito de moldar toda a sua experiência num pacote único, robusto e de elevadíssima qualidade. Ryu, Ken, Chun Li e Guile foram nomes que fizeram parte da infância e do imaginário de muitos de nós. Contudo, agora também vão fazer parte de uma nova geração de lutadores que certamente lutarão pelo seu futuro dentro e fora dos maiores circuitos mundiais.

Bruno Reis
Vindo de vários mundos e projetos, juntou-se à redação do Otakupt em 2020, pronto para informar todos os leitores com a sua experiência nas várias áreas da cultura alternativa. Assistiu de perto ao nascimento dos videojogos em Portugal até à sua atualidade, devora tudo o que seja japonês (menos a gastronomia), mas é também adepto de grandes histórias e personagens sejam essas produzidas em qualquer parte do globo terrestre.
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