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    3ª edição do ciclo Mestres Japoneses Desconhecidos em Novembro 2023

    Em novembro de 2023 vai ter lugar a 3ª edição do ciclo Mestres Japoneses Desconhecidos, começando com exibições em Lisboa e Coimbra, mais tarde passando por Porto, Faro, Almada e Viseu.

    Cronograma de exibições:

    • 3 de Novembro (Cinemas NOS, nos primeiros três fins-de-semana de Novembro)
      • Porto, Faro, Almada, Viseu

    Mestres_Japoneses_III_cartaz

    Em exibição estarão:

    O Som do Nevoeiro / Sound in the Mist (霧の音, 1956) de Hiroshi Shimizu

    Poster O Som do Nevoeiro Sound in the Mist

    Título Original: Kiri no oto, Realização: Hiroshi Shimizu, Baseado no Romance de: Hideji Hôjô, Argumento: Yoshikata Yoda, Direcção de Fotografia: Sôichi Aisaka, Música: Akira Ifukube, Direcção de Arte: Kôichirô Kanda, Produção: Masaichi Nagata, Elenco: Ken Uehara, Michiyo Kogure, Keizô Kawasaki, Keiko Fujita, Chieko Naniwa, Takeshi Sakamoto, Bontarô Miake, Kumeko Urabe, Eijirô Yanagi, Estúdio: Daiei / Kadokawa, Preto e Branco, 84 minutos.

    Sinopse: Numa cabana no coração dos Alpes japoneses, o professor de botânica Kazuhiko Onuma, observa dois recém-casados enquanto passa tempo com Tsuruko, sua amante. À noite, a esposa de Kazuhiko confronta-o acerca da relação extra-conjugal e Tsuruko, espectadora inevitável do embate, abandona o professor na manhã seguinte. Durante as próximas décadas, sempre que visita a cabana nas montanhas, a memória de Tsuruko assombrará para sempre Kazuhiko…

    Obra tardia de Hiroshi Shimizu, cineasta que certa vez Kenji Mizoguchi apelidou de genial, O Som do Nevoeiro encena um melodrama discreto e silencioso, que no corpus shimizuano só encontra igual nas suas obras mais aclamadas e conhecidas dos anos 30 e com já alguma presença no mercado de DVD. Aqui, no entanto, Shimizu encontra uma maturidade irrepreensível (com efeito, ele retirar-se-ia do cinema três anos depois, em 1959) quer seja na estrutura narrativa de O Som do Nevoeiro, mostrando, por exemplo, o momento mais decisivo do filme a meia-hora do seu início, quer pela realização escorreita e maximamente fluída, onde poderíamos considerar a ideia de um plano único, sem intermitências, a despeito dos cortes na sequencialidade e dos hiatos temporais. A comparação com a depuração estilística de Gertrud de Carl Theodor Dreyer não parece despropositada, apesar do filme do dinamarquês ser aclamado mundialmente, e o do japonês ainda estar votado ao esquecimento – mesmo a menção no Top 30 da prestigiada Kinema Junpô é ainda insuficiente tendo em conta os seus méritos. Tanto um como o outro lidam com a perda, o amor, e a tragédia do dia-a-dia de um ponto-de-vista majestosamente estático, como as montanhas imponentes e silenciosas que servem de décor natural a O Som do Nevoeiro.

    A Tragédia do Bushidô / The Tragedy of Bushido (1960) de Eitarô Morikawa

    poster A Tragédia do Bushidô The Tragedy of Bushido

    Título Original: Bushidô Muzan, Realização: Eitarô Morikawa, Argumento: Eitarô Morikawa, Direcção de Fotografia: Takao Kawarazaki, Música: Riichirô Manabe, Direcção de Arte: Junichi Ôsumi, Produção: Gin’ichi Kishimoto, Elenco: Miki Mori, Junichiro Yamashita, Hizuru Takachiho, Fumio Watanabe, Mutsuko Sakura, Sôhei Kurata, Estúdio: Shôchiku, Preto e Branco, 74 minutos.

    Sinopse: Iori, um jovem de 16 anos, é obrigado a cometer seppuku (suicídio ritual) para seguir o seu falecido soberano na morte e preservar assim a honra do seu clã de samurais. A esposa do seu irmão mais velho, Oko, que criou Iori como se fosse o seu próprio filho, pede permissão ao marido para passar uma noite com o jovem e ensinar-lhe, por misericórdia maternal, a arte dos prazeres da carne. No entanto, no dia seguinte, um decreto oficial é emitido, surpreendendo todos os envolvidos…

    A única longa-metragem realizada por Eitarô Morikawa para a Shôchiku, A Tragédia do Bushidô pertence à categoria rara de “um único filme, uma única obra-prima”. Originalmente projectado como um dos sete filmes de uma nova linha de realizadores auto-apelidada pelo próprio estúdio como “Nova Vaga Shôchiku”, e no qual se incluem também Contos Cruéis da Juventude de Nagisa Ôshima ou Good-for-Nothing de Kijû Yoshida, o filme de Morikawa alinha-se estética e programaticamente a esse movimento de ruptura com todo o cinema japonês antecedente. A linguagem cinematográfica entrega-se a certos experimentalismos na forma (o uso do freeze-frame e outras repetições e suspensões temporais) e caracteriza-se por um domínio absoluto da mise-en-scène, seja pela découpage engenhosa, ou pela iluminação no paroxismo da expressividade. Para além disso, a radicalidade diegética esconde um devastador fatalismo (e pessimismo) aplicado aos costumes e ao espírito colectivista japonês, bem como um erotismo obliterante dos vínculos sociais e familiares. Se toda a “Nova Vaga” anunciava o nascimento de um novo individualismo, ancorado já não na influência americana dos anos da Ocupação provenientes da derrota da Segunda Grande Guerra (1945-1952), mas numa espécie de auto-negação de todas as convenções históricas e identitárias, então A Tragédia do Bushidô serve precisamente esse propósito. O de dinamitar o passado para abrir espaço a uma nova realidade num presente que se desejava sem quaisquer concessões.

    O Monge Apostador / The Gambling Monk (1963) de Shôgorô Nishimura

    poster O Monge Apostador The Gambling Monk

    Título Original: Keirin shônin gyôjyôki, Realização: Shôgorô Nishimura, Baseado no Romance de: Daikichi Terauchi, Argumento: Shôhei Imamura, Nobuyuki Onishi, Direcção de Fotografia: Kazue Nagatsuka, Música: Toshirô Mayuzumi, Direcção de Arte: Yasuhiro Otsuru, Produção: Kazu Ôtsuka, Elenco: Shôichi Ozawa, Aiko Ito, Yôko Minamida, Yoshi Katô, Munenori Oyamada, Masaya Takahashi, Noriko Matsumoto, Toshio Takahara, Takeshi Katô, Misaki Watanabe, Daisuke Ômi, Zenpei Saga, Eimei Esumi, Estúdio: Nikkatsu, Preto e Branco, 99 minutos.

    Sinopse: Num dia de Verão, o sacerdote do Templo Hojûin morre. Assim que sabe da notícia, Harumichi regressa à cidade e organiza um grande funeral. Ele nunca esteve disposto a assumir o negócio da família e tinha escolhido uma vida como professor do ensino médio, longe de casa, mas, tendo em conta as circunstâncias, ele muda de opinião. Como novo chefe do Templo Hojûin, Harumichi luta, dia após dia, por doações como forma de subsistência. Ele tenta levar uma existência regrada, sem excessos, até ao dia em que passa por uma pista de corridas de bicicletas. O som esfuziante da plateia leva-o a um novo modo de vida…

    Shôgorô Nishimura é mais conhecido no Japão por ter sido o primeiro realizador, e subsequentemente um dos mais prolíficos, que participou da linha de produção “Roman Porno” da Nikkatsu com Apartment Wife: Affair In the Afternoon em 1971, numa viragem do prestigiado e mais antigo estúdio japonês ao erotismo desenfreado, extremamente popular nos anos 70. No entanto, hoje a crítica japonesa encontrou nos primeiros 14 filmes que Nishimura realizou entre 1963 e 1971 um portentoso cineasta com uma veia iconoclasta e subversiva, erótica mas bastante longe da obscenidade pornográfica. A sua primeira longa-metragem O Monge Apostador tem a chancela do “livre-pensador” (como lhe chamou Paulo Rocha no seu documentário) Shôhei Imamura no argumento e podemos considerar que a marca fundamental do cineasta vencedor de duas Palmas de Ouro não podia deixar de estar presente: uma escalpelização da sociedade japonesa do pós-guerra através das “partes mais baixas” da psique humana. A tentação, o vício, o desejo pecaminoso que se agarra às roupas do professor tornado sacerdote que invariavelmente cai em todas as armadilhas, apesar de ser teoricamente aquele quem as melhor poderia fintar. Na última cena do filme, quando vemos Harumichi pregar aos apostadores como se a pista de corridas de bicicleta fosse o novo templo da sociedade moderna suscita o riso, mas não deixa de provocar desconforto. Nessa queda de um homem, está implicada, em certo sentido, a queda de todo o Japão do aleatório crescimento económico.

    Helder Archer
    Helder Archer
    Fundou o OtakuPT em 2007 e desde então já escreveu mais de 50 mil artigos sobre anime, mangá e videojogos.

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