Foi em maio de 2012 que o diretor Hideaki Itsuno (conhecido por trabalhar na Capcom na célebre série Devil May Cry) apareceu com Dragon’s Dogma, um RPG de ação ambientado num mundo de fantasia medieval que na época foi elogiado por apresentar uma fórmula envolvente próxima do que víamos nos jogos ocidentais.

Quase 12 anos depois, Itsuno assume mais uma vez o papel de diretor com o lançamento de Dragon’s Dogma 2 para a PlayStation 5, Xbox Series e PC, deixando claro que a “sequela” do seu clássico de culto entrega a sua visão na totalidade sem os limites sentidos no antecessor. Um mundo maior, ainda mais imersivo, onde a ação e a liberdade são os elementos centrais.

O místico dragão que amaldiçoa o nosso protagonista.

Nesta nova aventura, voltamos a assumir o papel de um Arisen, um herói que vê o seu coração roubado por um Dragão durante uma batalha. O objetivo principal que nos é apresentado desde a abertura passa por procurar e caçar o dragão de modo a recuperar o coração do nosso protagonista, contudo para chegar a este destino, como é habitual, somos envolvidos numa teia de enredos que trazem ao de cima várias intrigas, guerras políticas e conspirações entre as duas nações presentes em Dragon ́s Dogma 2. De um lado temos a nação dos humanos, onde a rainha regente para continuar a exercer o seu poder no trono mantém ao seu lado um falso Arisen. Enquanto que do outro, temos a nação bestial, que para além de acreditarem em ideologias divergentes, culpam os seres de outro mundo, os chamados Peões, de serem a causa dos infortúnios daquele mundo.

A nível narrativo, a sensação que tive depois de passar várias horas em Dragon´s Dogma 2 é que demora demasiado tempo a entregar os seus momentos mais emocionantes. É um enredo que não consegue puxar na maioria das vezes a atenção para continuarmos a prosseguir com a história principal, nem a fazer-nos importar com os personagens. No meio de tudo isso, pelo caminho surgem bons acontecimentos secundários que conseguem aguçar a nossa curiosidade com o lore que alimenta o universo de Dragon´s Dogma.

Neste último ponto, os Arisens mais curiosos vão ser compensados, já que o mapa que temos para desbravar não apresenta indicadores como estamos familiarizados nos RPGs em geral. A Capcom com esta visão tenciona que cada jogador viva a sua própria jornada, incentivando-os a explorar profundamente os cenários e que se deixem deslumbrar com a abordagem dos NPCs e os segredos e mitologias ocultos neste mundo, assim como a descoberta com naturalidade das missões secundárias e das variadas formas de resolver os seus objetivos.

Um momento de convívio num local de acampamento.

Ao contrário da história central, encontramos um mundo e combate mais aprimorado e marcante que o anterior. O território a explorar é colossal, dividido por dois reinos e vários ambientes à sua volta; composto principalmente por cidades, vilarejos, florestas, cavernas e até as áreas desertas dos Ferids. Dentro das áreas mais povoadas, há bastante vida e interatividade com os NPCs a viver o seu quotidiano, a contar histórias das suas aventuras, negócios locais de armas e itens, entre outros. Do mesmo modo, este detalhe ressalta fora das cidades, onde por exemplo tanto podemos ser interrompidos por um peão a oferecer os seus serviços, vendedores ambulantes ou por emboscadas.

A fisionomia dos personagens, altura e peso, influencia a quantidade de stamina que gastamos, bem como a capacidade de itens que conseguimos transportar.

Apesar de termos acesso a meios de transporte para pontos específicos do mapa (cidades ou vilarejos), estamos diante de um mundo que convida os jogadores a caminhar pelos locais sem a ajuda de terceiros, para que consigam tirar maior proveito do que a aventura tem para proporcionar, envolvendo descobertas, lutas, recolha de recursos até à evolução e conhecimento das habilidades do nosso personagem. Durante a minha experiência, não houve momentos pausados ou menos gratificantes enquanto explorava, mesmo quando atravessava os mesmos locais. Há sempre algo a acontecer, algum tesouro por encontrar, inúmeras cavernas ou um castelo por investigar e ameaças para enfrentar. O ciclo de dia e de noite traz ainda uma nova camada de imersão, com o dia a trazer um desafio moderado e a noite repleta de novas criaturas sombrias e ainda mais perigosas.

O sistema de combate mostra-se genuinamente divertido, com muitas mudanças e melhorias que evoluíram o que o original já tinha de incrível. Ao início, quando começamos a criar o nosso Arisen e peão, além da aparência e das suas fisionomias, temos de selecionar a classe/vocação que pretendemos iniciar: Fighter, Archer, Thief ou Mage, sendo que mais para frente desbloqueamos a classe Warrior, Sorcerer, Magick Archer, Mystic Spearhead, Trickster e Warfarer.

Existe um bom leque de classes que certamente atende às necessidades e gostos dos jogadores. Cada uma conta com as suas características e modos de enfrentar os desafios, a classe Mage por exemplo utiliza habilidades elementares e defensivas que podem ser uma mais valia contra a maior parte das criaturas, além disso, as suas habilidades de cura são bem-vindas para recuperar a vida dos nossos parceiros de modo a poupar os itens de cura. Já a classe Warrior é apropriada para quem pretende elaborar um personagem à base da força, com maior capacidade defensiva e espadas pesadas capazes de causar grandes danos.

Nos acampamentos podemos recuperar a vida, cozinhar para aumentar os nossos atributos ou equipar/trocar as habilidades dos personagens.

Mudar de classe ao longo do jogo é crucial para não só tornar a experiência em combate mais diversificada, mas também para conseguirmos beneficiar dos atributos que vamos adquirindo das vocações anteriormente equipadas. De forma semelhante, devemos conferir o nosso peão, escolher a sua classe e adequar a sua estratégia às situações. Tal como na proposta anterior, este é controlado por uma inteligência artificial muito competente: assim como nós, consegue recolher recursos, combinar itens e ainda guiar-nos durante as missões, encontrar esconderijos e mais.

Uma das criaturas mitológicas de Dragon´s Dogma 2.

Devo admitir que fiquei surpreendido com a inteligência artificial dos peões que mesmo apesar de algumas pequenas falhas, como deixar para trás parte dos recursos ou a falta de capacidade para fugir de um confronto automaticamente, no geral funcionam muitíssimo bem. Foram especialmente desenvolvidos para colaborar em equipa durante as batalhas, usando sabiamente as suas habilidades ao mesmo tempo que analisam rapidamente os pontos fracos dos inimigos e ainda são capazes de usar itens de cura.

Também podemos contratar mais dois peões para fazer parte da nossa equipa, tendo em mente a estratégia que pretendemos levar para o combate. No meu caso, usei sempre peões de classes diferentes da minha e da do meu peão principal para criar combinações interessantes, visto que cada uma das classes possui comportamentos e especializações únicas que podem ser úteis na altura de explorar e combater.

É gratificante observar a sinergia entre o nosso protagonista com os peões. Ataques combinados com feitiços, ataques vindos de cima dos arqueiros, explosões que atordoam os inimigos e os levam ao chão. Claro que a aventura não seria a mesma sem o astuto comportamento dos inimigos. A qualquer altura encontramos desde os mais comuns: ladrões, goblins, harpias, lagartos ou lobos que nos cercam e atacam sorrateiramente, até às gigantescas criaturas mitológicas: ciclopes, grifos, dragões, quimeras e outros inimigos massivos que originam os mais intensos combates e entregam os melhores desafios do jogo.

A contemplar a profundidade e a beleza dos ambientes do jogo.

Estes eventos são promovidos com o aspeto fotorrealista do jogo devido à evolução do RE Engine que foi projetado pela Capcom especialmente para os remakes da série Resident Evil. É difícil não parar para contemplar os ambientes ricos ao nosso redor. É um jogo bonito onde as texturas e iluminação impressionam, conseguindo dar vida à ação e aos ambientes naturais do mundo fictício de Dragon ́s Dogma 2. Todavia, existem pequenos problemas, nomeadamente questões pertinentes com o desempenho do jogo e as expressões dos personagens. Mesmo depois da recente atualização, continuam a surgir quedas de fluidez quando estamos dentro das grandes cidades ou em cenários cercados por muitos inimigos. Já as expressões dos personagens nem sempre são as melhores e as mais credíveis.

Ao mesmo tempo, encontramos uma banda sonora que se enquadra com o tema medieval e fantasioso apresentado. Mas o que mais ressalta são os seus efeitos sonoros que compõem a ambientação deste mundo, os sons das armas, poderes e movimentos durante as lutas, o som da natureza ou até das próprias criaturas do jogo. Por sua vez, apesar de ser um jogo fruto de uma equipa japonesa, as vozes em inglês identificam-se melhor com o contexto vivido no jogo.

Dragon´s Dogma 2 é um passo à frente do que foi concebido no passado. É uma viagem que apesar de não se destacar pela narrativa, brilha nos restantes elementos: o seu combate e a exploração. Um mundo massivo e ao mesmo tempo orgânico que tira proveito da ausência de ícones do mapa para despertar a curiosidade do jogador a explorar o mundo do jogo. Independente dos problemas de desempenho ainda por resolver, é uma experiência recomendada que nos deixa curiosos com o futuro da série.

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