No passado fim de semana tive a oportunidade de assistir às apresentações do animador Henry Thurlow no evento de animes/mangas/cultura japonesa Iberanime em Lisboa/Portugal, entre q&a’s e sessões de demonstração pude conhecer o seu trajeto desde a sua adolescência até aonde ele chegou na sua ainda muito promissora carreira, além de um enorme “input” sobre o “real” estado da indústria e como algumas coisas funcionam, por isso, nada melhor do que eu vos contar sobre o seu trajeto, projetos e ambições em forma de um artigo meio biográfico mas também um pouco esclarecedor em relação à industria de animes.
Henry Thurlow é um animador americano no Japão que participou em animes como Naruto Shippūden/The last, Tokyo Ghoul (ambas as temporadas) e também a mais recente Tokyo Ghoul:Re, Gintama, Overlord II e muito mais, anteriormente também trabalhou em animações “americanas” como Superjail, Deep Space 69 e os videoclips das musicas “Your Love Is My Drug” da cantora Ke$ha e “Kids” da banda MGMT.
O inicio
Como a maioria das crianças nos EUA na altura, Henry Thurlow cresceu a ver desenhos animados na televisão. Aos 12 anos, Henry teve a sua primeira experiência de uma animação mais madura com obscuridade e violência, Spawn da HBO. Ele então na altura descobriu a secção de anime de uma loja de vídeo onde começou a ver series e OVA’s como Genocyber, Yoma, Ninja Scroll, Akira, e Demon City Shinjuku. Havia muitas cenas de violência e tortura nesses filmes o que o fez gostar desse género de animes dessa década até aos dias de hoje.
Um começo Promissor
Henry THURLOW após estudar e se graduar em desenho e animação no Pratt Institute e ser um aluno de “A’s”, começou logo a trabalhar na indústria da animação nos EUA a trabalhar em cartoons como Superrjail da “Adult Swim” e nomeadamente da cartoon network em alguns outros projetos de animação como Powerpuff Girls e Star Wars: The Clone Wars,e também videoclips.
Mas…
No entanto vendo os exemplos de 2 de seus colegas que eram animadores renomados da cartoon network e mesmo assim o ápice do seu trabalho era fazer desenhos animados principalmente para crianças e mais alguns projectos aqui e ali, Henry pensou bem na sua carreira e então decidiu o que queria realmente era fazer animação de estilo japonês, o tal chamado de “anime”.
Depois de ter tido a oportunidade de ter contacto com Hideyuki Kikuchi (Vampire Hunter D, Darkside Blues e Wicked City) em uma convenção nos EUA através do seu tradutor pode ter algum input da atual indústria de animes e como podia adaptar o seu estilo americano de desenha ao que se utiliza no Japão, e assim enviou o seu currículo para ele. Hideyuki terá tido que ele tinha talento, mas que o seu estilo não era aceitável para os critérios de desenho no Japão, então Henry sempre que podia enviava os seus desenhos para Hideyuki, maior parte foi-lhe dito que não era o suficiente, mas a cada conjunto de desenhos 1 ou 2 saiam aceitáveis segundo Hideyuki. Até que ao fim de um tempo Henry acabou por ter um conjunto de desenhos “aceitáveis” onde podia assim inclui-los no seu currículo ficando assim mais “apetecível” ao gosto dos estúdios de animação japoneses.
A oportunidade
Entretanto por um de seus amigos, obteve a informação de que poderia ir para o Japão, que é realmente o primeiro passo para quem quer ser animador de anime, através do programa JET que dá a oportunidade a quem tem o domínio do inglês poder ensinar e dar aulas no Japão por um certo período de tempo.
Então sem grande fé ele decidiu candidatar-se para uma vaga nesse programa. Por alguns meses continuou a receber mails em que era notificado que tinha passado para a seguinte fase de qualificação, até que num dia recebeu uma notificação, em que dizia sendo que já estavam nas últimas vagas, se ele realmente quisesse ir para o Japão tinha que decidir até ao próximo mês. Sendo que na altura Henry trabalhava sobretudo como freelancer, sem nada que o prendesse, não pensou 2 vezes e assim começou a sua longa jornada de 9 anos até agora no Japão.
Finalmente no Japão
Os seus primeiros 2 anos no Japão foram passados na prefeitura de Wakayama no interior, que ao contrário de grandes metrópoles Tokyo, Yokohama e Osaka, Wakayama era uma terra no meio do “nada” com nada mais nada menos do que campos de arroz por todo lado. Mas isso pelo que o próprio Henry referia foi uma grande ajuda para a sua aprendizagem do japonês sendo que ao contrário de Tokyo por exemplo onde várias pessoas têm pelo menos o básico conhecimento do inglês, em Wakayama praticamente ninguém falava outra língua senão o japonês.
Então partindo dai, Henry foi aprendendo japonês e emergindo-se na sua cultura. Após esses 2 anos chegou finalmente a altura de finalmente começar a procurar trabalho em estúdios de animação.
O inicio complicado
Como o próprio disse a primeira entrevista foi um verdadeira desastre, pensando ele que com o seu japonês já razoável para ter uma entrevista e as suas habilidades até então adquiridas após trabalhar profissionalmente no cenário da animação nos EUA seria suficiente para então conseguir o seu tão desejado emprego, mas estava completamente enganado, o estilo que então usava nos seus anteriores trabalhos não era nem de perto nem de longe o estilo de animação japonesa minimamente aceitável pelos estúdios.
E então seguiu-se uma sequência de entrevistas falhadas, como o próprio disse candidatou-se a vários estúdios e era sempre rejeitado, entretanto entre todas essas entrevistas foi aprendendo e estudando o estilo de desenho que os estúdios aceitam. Refez e atualizou o seu currículo várias vezes com novas evoluções no seu estilo de desenho.
Até que então finalmente um estúdio acreditou nas suas habilidade e no seu estilo de desenho que já seria suficiente para eles e que, também muito importante para quem quer trabalhar no Japão, o seu visa era valido, mas ainda faltava aperfeiçoar as suas técnicas, e por isso, na sua primeira semana no então estúdio Nakamura Pro, apenas desenhou linhas retas num papel em branco, ele desenhou… desenhou e desenhou até que as suas linhas finalmente cumpriram os critérios no estúdio.
Alguns dos seus trabalhos na Nakamura Pro, onde infelizmente raramente era creditado:
O inicio do sonho
E foi assim o seu inicio como animador de animes no estúdio Nakamura Pro, na função de animador in-betweener (動画 douga).
Finalmente a sua grande entrada na industria de animes tinha sido concluída e finalmente tinha a oportunidade de fazer o que mais gosta, mas como nem tudo é um conto de fadas principalmente falando da industria de animes, havia um grande mas que era as condições em que trabalhava, após de 8 meses as trabalhar 12 horas por dia a fazer 10-12 desenhos a receber apenas 1 dólar por cada um deles e de raramente ser creditado pelo seu trabalho, Henry decidiu dizer um “basta” e tomou a iniciativa de procurar outro estúdio em que poderia ter melhores “condições”.
E vocês agora devem-se estar a perguntar porque alguém que poderia viver confortavelmente no seu pais trabalhando com empresas como a cartoon network e adult swim, além de ter mais tempo para se divertir e aproveitar o tempo livre, havia de continuar numa indústria que muitas vezes te obriga a trabalhar durante longas horas e em condições até sub humanas com um salário que mal paga as contas se não fosse os projectos que ainda tinha do seu pais natal.
A sua resposta foi bem simples, se não estás disposto a te sacrificar e sequer pensas em desistir do teu sonho, então nesse caso devias parar por aí. (Henry até contou uma história que teve de ser internado pelo grande desgaste a que estava sujeito). Mas desistir nunca lhe passou pela cabeça, mas sim continuar a lutar pelo seu sonho que ainda estava só no inicio.
Como Henry referiu a partir do momento em que se entra na indústria, não existe o termo “não há trabalho”, sendo que uma vez dentro da indústria há sempre oferta de trabalho principalmente para animadores in-betweeners como ele na altura.
Foi então que se seguiu o seu percurso pelos estúdios Bang Bang Animation (estúdio criado pelo veterano Shiro Kudaka) onde trabalhou em animes como Gintama e Code Geass: Akito the Exiled (OAV) e estúdio Pierrot onde deu mais um grande passo na sua carreira trabalhando agora como key-animation (原画 genga) onde trabalhou em series como Tokyo ghoul, Naruto Shippūden e muitos outros.
Mas a sua ambição não ficou por ai, em 2016 ele e seu amigo Arthell Isom (artista de backgroud que trabalhou em animes como Blooc-C, Black Butler e muito mais) decidiram juntos criar um estúdio de animação americano localizado no japão chamado de D’ART Shtajio com a missão de fazer animação japonesa, e em simultâneo aceitando projectos de todo mundo.
Depois de in-betweener e key-animator o que restava à já incrível carreira de Henry THURLOW?
O próximo passo da sua carreira seria naturalmente director (監督 kanntoku), o que teve a oportunidade de o fazer em alguns projectos que dirigiu já com o seu cocriado estúdio D’ART Shtajio, projetos como Shojo no Piero uma curta e Indigo Ignited um episódio piloto principalmente direccionado para o publico do ocidente, Henry Thurlow direccionou a curta, enquanto que Arthell Isom ficou encarregue dos backgrounds como director de arte, Yoshiharu Ashino (D.Gray-man Hallow, Azuki-chan) serviu como storyboarder, Asuka Tsubuki (Gugure! Kokkuri-san) é o director de animação, Rejean Dubois é o designer de personagens e David Butler o director musical.
Mas outra vez, a sua ambição não fica por ai, questionado sobre qual seria o seu próximo passo, Henry referiu que ainda lhe faltavem inúmeros passos para atingir o seu sonho e que só estava no inicio dele, e que pretende já com o seu estúdio D’ART Shtajio, é criar uma serie completa de anime que possa ser transmitida nas tv’s e serviços de streaming.
Thank you to the “IberAnime” convention 2018 in Lisbon, Portugal for having me out as a guest. It was a great experience, and I was really impressed with a lot of questions some young animators in the audience had. pic.twitter.com/PgPVglgPEM
— Henry Thurlow (@henry_thurlow) 28 de maio de 2018
Henry Thurlow costuma publicar actualizações sobre os seus mais recentes projectos tais como Tokyo Ghoul:re e Record of Grancrest War no seu tumblr e twitter.